Quem visita o Município de Mucajaí, cujo acesso a partir de Boa Vista é pelo trecho sul da BR-174, percebe fatos que dão pistas e sinais esclarecedores sobre a política que sempre foi colocada em prática em Roraima. Um fato que chama a atenção é uma obra de quase R$2 milhões que já deveria ter sido construída há pelo menos dois anos.
Trata-se da obra de construção de um mirante na sede de Mucajaí no alto da pedra onde tradicionalmente era realizado o ato final da Encenação da Paixão de Cristo, na Sexta-feira Santa. Orçada no valor de R$1.906.516,76, a obra tinha prazo previsto para começar 21.01.2020 e terminar em 09.07.2020. Ou seja, em sete meses o mirante deveria ter sido entregue para a população.
No entanto, estamos encerrando o ano de 2023 e a obra do mirante tornou-se um imenso monumento de descaso com o dinheiro público e com o turismo em Mucajaí, que é a principal atividade que aquece a economia daquela cidade durante a Semana Santa. E tudo sob o silêncio de autoridades e dos órgãos de controle, uma vez que se trata de um convênio entre Prefeitura de Mucajaí, Ministério do Turismo e Caixa Econômica Federal.
Com a paralisação da obra, a preocupação é com a deterioração do que já foi erguido, em flagrante desperdício de recursos públicos, além da real possibilidade de que a retomada da construção irá demandar os famosos aditivos de recursos públicos, o que significa mais gastos de dinheiro do contribuinte, encarecendo ainda mais a obra que já deveria estar servindo à população daquele município e ao público de visitantes e turistas que têm na “Pedra da Paixão” um atrativo durante todo o ano.
O abandono da obra em Mucajaí acaba servindo de alerta para outro município, o Amajari, cujo acesso é pelo trecho norte da BR-174. Lá será erguido um complexo turístico que inclui também um mirante na Cachoeira do Paiva, na Serra do Tepequém. Se não houver acompanhamento da construção desta obra, por parte da população e dos órgãos fiscalizadores, orçada em R$2,1 milhões, poderá ocorrer o mesmo que está sendo visto em Mucajaí.
Conforme esta Coluna já alertou em 09.10.23, nos artigo “Anúncio de obras em Tepequém que exige atenção do poder público”, precedentes para se preocupar existem, como é caso do asfaltamento da estrada de Tepequém, a RR-203, cujo serviço de restauração do asfalto foi abandonado e retomado recentemente, provocando prejuízos aos cofres públicos e para a economia daquela localidade, onde o turismo em Tepequém movimenta a economia junto com a pecuária de corte e a piscicultura.
Outra questão observada em Mucajaí é a situação das estradas, fato que inclusive pode ser comparado com a realidade do Amajari. Em Mucajaí, as estradas em estão em boas condições, inclusive onde não há asfalto, pois há constantes serviços de manutenção, enquanto no Amajari existem uma lentidão e um desprezo que só a política partidária pode explicar.
Em Mucajaí, há muitas fazendas bem estruturadas, inclusive de políticos e de um grande empresário que já ocupou cargo importante na estrutura do governo local. Significa que o fato de haver pessoas influentes com grandes propriedades por lá acaba sendo um diferencial, em que a atenção dispensada às estradas não é a mesma para outras regiões do Estado, como o Amajari, onde estão várias famílias de políticos, mas não com o poder dos que estão em Mucajaí.
É a política baseada na força e no compadrio políticos, em que quem tem mais poder financeiro e político acaba tendo mais influência, força e privilégios. E um detalhe importante naquela região é que por lá estão também pessoas influentes que financiam e apoiam o garimpo ilegal na vizinha Terra Indígena Yanomami. Dentro desse contexto, as estradas ganham mais importância do que a construção de um mirante para servir ao turismo.
É necessário que as autoridades deem respostas imediatas ao abandono do mirante em Mucajaí e ao mesmo tempo que estejam atentas às obras do mirante no Tepequém e nos serviços de recuperação da RR-203. Se nada for feito, serão dois mirantes se tornando monumentos do desperdício e do descaso, em flagrante desprezo com o turismo e, quem sabe, atos de malversação do dinheiro público.
*Colunista