O dia, hoje, está totalmente apagado. Até parece que esqueceram de nós. Mas fui até o portão e percebi que um punhado de gente caminhava procurando peixe para o almoço. Fiquei um tempão, em pé, com um sorriso maroto, lembrando-me dos tempos do jejum de páscoa. Se você tiver minha a idade, que é difícil pra dedéu, não deixa de ser tentado para um sorriso. Só lembrando-se dos maus momentos em que, crianças como eu sofriam, intimamente, com as regras na alimentação. A coisa era terrível. E não só no dia da Paixão, mas em todo decorrer. Já repeti, e vou repetir, os vexames que vivi e passei, com meu comportamento aparentemente rebelde. Mas, na verdade, eu nunca fui rebelde, sempre fui meio solto nos meus pensamentos. E eu achava que aquelas regras que me proibiam de comer carne, e passar o dia todo em jejum, nada disso tinha como justificar. Só que eu era uma criança e não podia cair na esparrela de falar isso pra minha mãe. Para meu pai, eu até poderia arriscar, mas nunca tive cabeça pra isso.
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Minha mãe já havia notado meu comportamento e, mesmo sem falar nada pra alguém, tentava me corrigir, mas de maneira erronia. Ela sempre falava pro meu pai, que ele deveria ter cautela comigo, porque parecia que eu queria ser comunista. Ainda bem que meu pai nunca levou isso em consideração.
As coisas mudaram, mas nós seres humanos, não conseguimos mudar. Embora percebamos que as diferenças nos comportamentos de hoje, em relação aos dos tempos passados, está bem aberto. Já comemos carnes no dia da Paixão, vamos ao cinema, e tantas outras coisas que não eram permitidas naqueles tempos. Todos os meus irmãos fizeram a primeira comunhão. Eu não fiz, porque o padre descobriu que eu tinha tomado água de coco, e por isso não podia receber a hóstia. Mas não fique encucado com esse papo parecido com sei lá o quê. Eu nunca tive nada nem fui contra religiões, sejam elas quais forem. Respeito-as com carinho e muita sinceridade. Estou muito feliz em estar assistindo a movimentos religiosos, sabendo que eles fazem parte da evolução racional. E a evolução não deve, nem pode, ser confundida com revolução. Nossa evolução só será racional quando formos todos, capazes de entender o dever de nos racionalizarmos. E as religiões têm o poder de fazer isso, guiando o ser humano para a caminhada ao mundo racional, onde não há guerras nem lutas. Os caminhos estão abertos, e cada um de nós é dono do seu destino. O importante é que saibamos o que queremos, e consigamos. Pense nisso.
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