A não premiação do jogador brasileiro Vini Jr. na disputa pela Bola de Ouro 2024 deixou bem claro que a questão do racismo estrutural que existe especialmente no futebol precisa ser encarado de frente na Europa, onde o chamado “racismo recreativo” é normalizado nas arquibancadas como “apenas uma brincadeira de torcedores”.
Vini Jr. optou por enfrentar abertamente o racismo que ele sofre constantemente por parte das torcidas adversárias, postura combativa que incomoda membros da imprensa, dirigentes, políticos e o mundo empresarial que não está nem um pouco preocupado com o racismo. Tachado como “problemático”, dar o maior prêmio ao atleta brasileiro seria dar razão a sua postura firme contra os atos racistas.
O que muitos não estão entendendo é que o racismo na Europa não tem o mesmo tratamento que é dado no Brasil, que avançou na legislação quando passou a considerar o racismo recreativo um ato criminoso e que pode resultar na prisão por até 5 anos. Nos países europeus, a exemplo da Espanha, expressões e atos racistas são aceitos e normalizados quando se trata de torcidas de futebol.
Isso vem de longe. O eurocentrismo é histórico. Foi na Europa que se criou o conceito de “raça” como forma de justificar a colonização de outros povos e a escravização dos negros, cujo eurocentrismo criou uma hierarquia que coloca os europeus como “humanos plenos” e desumanizou negros e indígenas, realidade que segue até os dias de hoje dentro das estruturas sociais e econômicas, o que pode ser vista nos estádios de futebol.
Quem quiser entender melhor pode ler o criador da expressão racismo recreativo, Adilson Moreira, autor do livro “Racismo recreativo”, que integra a Coleção Feminismos Plurais, publicado em 2019 e que traz o ponto de vista jurídico sobre o tema. Moreira é doutor em Direito Constitucional e seu trabalho acabou se tornando uma ferramenta na luta antirracista por meio dos casos de humor.
Diante dos fatos, é possível entender que a questão sobre a Bola de Ouro que não foi concedida a Vini Jr. ultrapassa uma polêmica qualquer sobre futebol. Não se trata apenas de futebol, mas de o mundo passar a discutir o combate efetivo do racismo em todos os esportes, para que o racismo recreativo também seja considerado crime em outros países, assim como ocorre no Brasil.
A bola murcha da maior premiação esportiva mundial precisa servir de um marco para que o racismo estrutural – que se disfarça de piada, de brincadeira de mal gosto ou insultos de torcida adversária – seja punido mundo afora, em especial na Europa, que lançou as maiores barbáries contra colonizados na África e na América do Sul sob o carimbo do eurocentrismo.
*Colunista