O mundo da invisibilidade sacudido por uma bordunada em nossa alma
Jessé Souza*
Foi preciso ocorrer o pior para que o Estado de Roraima descobrisse a importância do artista indígena Jaider Esbell, considerado um dos pilares da Bienal de Arte de São Paulo no momento de sua morte. Foi pela notícia nos principais jornais do país que muitos souberam que um indígena Macuxi precisou sair de sua terra natal para ser reconhecido.
É por isso que a morte de Jaider Esbell precisa ser olhada por esse viés da invisibilidade que os artistas roraimenses são submetidos, especialmente os indígenas, pelos governos locais, os quais desprezam os grande valores da terra, os obrigando a mendigar apoio ou ir embora em busca de seu espaço.
Sempre foi assim, quando os políticos preferiram trazer artistas de fora a preço de ouro, enquanto paga o sobejo governamenal aos locais. O fim deste ano, por exemplo, terá mais do mesmo desprezo, quando o Governo do Estado irá trazer a cantora Joelma para enganar o povo no Reveillon no Parque Anauá, assim como fizeram todos os demais governos anteriores.
O fim da trajetória de Jaider Esbell precisa ser esse olhar mais além, mais do que dentro do nosso peito, destroçado porque se foi um artista que representava a cosmogonia indígena, a nossa história, a nossa cultura, um roraimense reconhecido não apenas nacionalmente, como também fora do país.
Era um artista nosso, que fazia não apenas arte, espondo na sua casa, na Casa do Neuber, em todas as casas, repassando cultura, fixando e espalhando história indígena e ensinando arte por todos os poros. Ele conseguiu furar a bolha de Roraima por méritos próprios, como tentam outros artistas até hoje na invisibilidade que a política governamental impõe.
O alento é que quem respira arte sabe que Jaider continuará vivo dentro de seu legado que ele deixou para a cultura indígena. Porque não se pode apagar uma alma encantada que resistiu aos desafios da invisibilidade que todo artista e produtor cultural é submetido. Está sendo assim com o escritor Cristino Wapichana, reconhecido nacionalmente e internacionalmente, mas invisível em sua própria terra.
Quantos precisarão morrer para terem seu devido reconhecimento? Quantos artistas precisarão se encantar para que a sociedade descubra sua importância na construção de uma sociedade que enxergue os valores indigenas tentando dialogar com a cultura envolvente? Choque de realidade, uma perda irreparável, pois Jaider era essa ponte que foi quebrada abruptamente.
Quantos precisarão se despedir para perceber que estão cantando a nossa terra, a nossa história e a nossa vida conversando com as transformações sociais, como tem feito Neuber Uchoa e os demais roraimeiras? Quantos artigos de jornal precisarão ser publicados para que nossas autoridades acordem de seu mundo fechado que não enxerga os valores querendo emergir da cegueira coletiva?
E assim será o velório, hoje, de Jaider Esbell, como um sopro de zarabatana atravessando a alma dos que creem na arte, na cultura e nos valores indígenas como um diálgo chamando todos à realidade. Uma bordunada em nossas cabeças ocas de sensibilidade com aqueles que precisarm ir embora de sua terra ou se despedir da vida para terem o seu devido valor passando nos principais jornais do país.
Só nos resta o luto, neste momento…
*Colunista