Longe das ruidosas discussões sobre a saúde indígena, as Organizações Não-Governamentais (ONGs) já estão arrumando as malas para se retirarem das terras indígenas, enquanto representantes da Agência Brasileira de Apoio à Gestão do Sistema Único de Saúde (AgSUS) sempre disseram que não iriam assumir a gestão da saúde indígena sem debate com os povos indígenas e os trabalhadores terceirizados.
Não se trata de uma questão simples, pois historicamente os políticos mandam e desmandam na saúde indígena, seja por ingerência direta nos distritos sanitários especiais indígenas (Dseis) ou mesmo dando ordens nas contratações feitas pelas ONGs, privilegiando apadrinhados e aliados, ou mesmo em contratos milionários com empresas aéreas pertencentes a políticos.
Embora sempre tenha existido essa promessa de discussão com todos os envolvidos sobre o fim do contrato com as ONGs, desde o início do ano, não se ouviu mais falar nada sobre o assunto nos últimos meses, enquanto restam muitas dúvidas por partes dos movimentos indígenas sobre a atuação e o papel da AgSUS, que foi criada sem debate com os movimentos sociais e indígenas.
É preciso lembrar que a AgSUS foi instituída para substituir a Agência de Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps), criada pelo governo Bolsonaro, em 2019, para gerir o programa Médicos pelo Brasil, que por sua vez substituiu o Mais Médicos, que foi marcada por inoperância e denúncias de corrupção no governo passado.
Mesmo que tenha havido um grupo de trabalho com a tarefa de esclarecer dúvidas, debater métodos de atuação e manter diálogo permanente com os povos indígenas, os quais são atendidos em suas terras tradicionais, ainda não se sabe se os coronéis da política irão entregar essa ingerência sem resistir e sem barganhar, depois de muitos anos dando as cartas.
Já se sabe que o novo órgão irá ficar responsável pela contratação dos profissionais de saúde que vão atender as populações indígenas nos polos dos Dseis e comunidades, sob regime de CLT, absorvendo os que atuam nas ONGS atualmente. A primeira pergunta é: irá acabar a mamata dos políticos que sempre tiveram poderes de indicar os seus?
O fato é que ainda existem muitas perguntas a serem feitas diante dos históricos problemas que envolvem a saúde indígena, a qual sempre foi instrumento de políticos que se locupletaram não só por meio de indicações, mas dos contratos milionários sempre disputados em meio a escândalos e investigações da Polícia Federal.
Com o assassinato de um técnico enfermagem na Terra Yanomami, flechado por um Yanomami colega de trabalho, na semana passada, a insegurança e a falta de condições de trabalho representam outra questão não menos preocupante que requer soluções rápidas para resguardar a vida desses profissionais que já terão suas vidas impactadas pela mudança em curso, a qual vem sendo feita sem qualquer divulgação.
*Colunista