JESSÉ SOUZA

Operação Esculápio, CPI e os ecos sistêmicos que atravessam os anos na saúde pública

Agente da PF durante cumprimento de mandado de busca e apreensão na operação deflagrada nesta terça-feira em Roraima (Foto: Divulgação)

A Operação Esculápio, deflagrada ontem pela Polícia Federal, só corrobora o teor do que foi comentado no artigo anterior, sobre os desmandos que tomaram conta da saúde pública roraimense. O esquema investigado aponta que um grupo fraudou processo licitatório na Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) para a compra de materiais odontológico para o Hospital Geral de Roraima (HGR) e que ainda desviava pacientes da rede pública para uma clínica particular, inclusive os orientando a procurar a Justiça a fim de obrigar o governo a pagar a realização de procedimentos em clínicas particulares.

Não é nenhuma novidade que a corrupção sistêmica se apoderou da saúde pública estadual, fato que foi revelado pelo primeiro secretário de Saúde que se demitiu no governo Denarium, ainda em 2019, cujos desdobramentos resultaram na instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde pela Assembleia Legislativa. O relatório final das CPI foi aprovado no dia 08.12.2021 com a exclusão do nome dos cirurgiões bucomaxilos, por “falta de provas”, os mesmos que foram alvos da operação da PF de ontem.    

Só aí é possível ter a dimensão do poder da política e dos envolvidos nos grandes esquemas. Esta mesma CPI da Saúde também não achou nada demais a citação do nome do irmão do governador que, conforme depoimento de outro ex-secretário de Saúde, marcou um almoço em Brasília para tentar interceder em favor do pagamento de faturas para uma empresa que já estava sendo investigada por irregularidades.  E tudo ficou por isso mesmo.

A CPI da Saúde havia sido instalada no dia 29 de agosto de 2019, exatamente após a bombástica publicação do secretário demissionário que apontou a corrupção sistêmica na Sesau. Apesar de todos os embaraços da CPI, a lista de indiciados no relatório incluiu 13 empresas, um senador e um ex-secretário de Saúde, estes dois últimos que já vinham sendo investigados pela PF, alvos da operação no caso do dinheiro na cueca. Para detalhar melhor, vale citar que a operação de ontem da PD envolve o nome de outro senador.

Relembrar tais fatos servem para contextualizar o tamanho do buraco que havia se tornado a saúde estadual. Tudo está conectado, e os fatos remontam a governos anteriores, quando a saúde pública vinha sendo usada como moeda eleitoral. A operação policial de ontem mostra que há parlamentares e outros políticos envolvidos, os quais ainda seguem com poderes quase absolutos na política local. O então secretário demissionário alertara para tais esquemas.

Não custa lembrar a denúncia feita por ele: “Enquanto forem permitidas empresas de deputados estaduais, federais e senadores vendendo serviços dentro da secretaria; enquanto for permitido uma cooperativa distribuindo plantões a quem não trabalha; enquanto forem permitidas famílias com poder político vendendo serviços dentro da secretaria; enquanto forem permitidos médicos concursados vendendo serviços para a secretaria; enquanto forem permitidos judicializar procedimentos para beneficiar um grupo de pessoas, haverá corrupção no governo”, postou em sua rede social.

Embora o conteúdo acima tenha sido publicado em 2019, o qual alarmou a sociedade e obrigou os deputados a instalarem a CPI da Saúde, o teor da publicação continua bem atual. E o curioso é que até hoje o governo ainda não conseguiu passar a saúde a limpo, cabendo às operações da Polícia Federal fazerem a desratização que a sociedade tanto almeja para que todos tenham uma saúde pública gratuita e de qualidade, conforme determina a Constituição.

*Colunista

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