Árabes e judeus lutando pelo Bem – João Baptista Herkenhoff*
Árabes e judeus disputam no Brasil uma competição a serviço do bem.
Em São Paulo, essa sadia rivalidade efetiva-se através da edificação de duas instituições primorosas: o Hospital Sírio-Libanês e o Hospital Albert Einstein. Em outros Estados repete-se este nobre confronto.
Quisera que, em plano mundial, árabes e judeus travassem uma competição para o bem, em vez de ficar jogando bombas uns nos outros.
Tenho simpatia pelo Estado de Israel e tenho simpatia pelo Estado da Palestina.
Não consigo compreender porque não possam conviver, lado a lado, o Estado judeu e o Estado palestino.
Quando eu era adolescente supunha, como outros colegas também supunham, que Cachoeiro de Itapemirim, uma cidade do Espírito Santo, fosse a capital do mundo. Não a capital secreta, como se diz, mas a capital real do mundo.
Em Cachoeiro havia a Casa do Estudante. No nosso imaginário, o plenário da Casa do Estudante, onde debatíamos todos os problemas (locais, nacionais, internacionais), era uma espécie de assembleia geral da ONU.
Pois bem. Nesse plenário glorioso, e que me desperta muita saudade, tive a oportunidade de saudar, num discurso inflamado, a criação do Estado de Israel.
Argumentei então, com irrestrita aprovação dos companheiros, que todas as nações têm o direito de constituir-se em Estado. Ora, os judeus eram uma nação, uma nação milenar dispersa pelo globo terráqueo. Logo, os judeus tinham direito a um Estado nacional.
Meu voto de regozijo pela criação do Estado de Israel foi aprovado por unanimidade. Comunicamos nossa decisão ao Ministro das Relações Exteriores do Brasil, pedindo a ele que fizesse repercutir nossa manifestação junto aos líderes do Estado de Israel e onde mais fosse adequado. Não sei se nosso pedido foi atendido. Mais provável que não. Entretanto, em nossa mente juvenil aquela decisão tinha encontrado eco.
No mesmo pronunciamento, defendi que, da mesma forma que os judeus tinham direito a um território, o mesmo direito assistia a palestinos e a todas as nações. Nenhum povo da Terra podia ser privado de chão.
Agora, na idade adulta, reafirmo. Não é de forma alguma impossível que se efetive esse direito. Através dos canais diplomáticos, através da ONU, através da ação dos que lutam pela Justiça, pela Dignidade Humana, pela Paz, judeus e palestinos podem conviver, no respeito recíproco, trocando o fuzil pelo abraço, trocando a exclusão pela partilha, trocando a incompreensão pela tolerância.
É nesse sentido que deve atuar a diplomacia brasileira.
Em nosso país, judeus e árabes convivem muito bem.
Se dependesse da colônia árabe brasileira e da colônia judaica brasileira não haveria guerra no Oriente Médio.
Descendentes de árabes e descendentes de judeus no Brasil desdobram-se na prestação de serviços à comunidade para demonstrar, cada um do seu lado, a capacidade que têm de construir obras beneméritas. Nesse esforço extraordinário demonstram também a gratidão que alimentam, no fundo da alma, pela acolhida que eles, seus pais, avós e ancestrais tiveram neste país maravilhoso que se chama Brasil.
*Magistrado aposentado (ES) e escritor. Tem proferido palestras e ministrado seminários em faculdades, seccionais da OAB, igrejas etc. E-mail: [email protected]: www.palestrantededireito.com.br
Reforma trabalhista, promoção do emprego e a arapuca do contrato de trabalho intermitente – Pedro Mahin Araujo Trindade*
O Projeto de Lei 6.787/2016, que dispunha sobre a reforma trabalhista, foi apresentado pelo Ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira de Oliveira, com o propósito declarado de promover a empregabilidade no país. Segundo Ives Gandra Martins Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho e um dos articuladores da reforma, “nunca vou conseguir combater desemprego só aumentando direito. Vou ter que admitir que, para garantia de emprego, tenho que reduzir um pouquinho, flexibilizar um pouquinho os direitos sociais”. E é exatamente este o mote das alterações legislativas promovidas pelo Governo de Michel Temer: reduzir “um pouquinho” os direitos dos trabalhadores, flexibilizar “um pouquinho” os direitos sociais, com o suposto propósito de promover a empregabilidade no país.
No entanto, essa fórmula (menos direitos = mais empregos) não encontra qualquer amparo em análises empíricas. Ao contrário, a Organização Internacional do Trabalho lançou, em 2015, estudo denominado “Emprego mundial e perspectivas sociais 2015: a natureza cambiante do trabalho”, no qual foram examinados dados e estatísticas de 63 países desenvolvidos e em desenvolvimento nos últimos 20 anos, concluindo-se que a diminuição da proteção conferida pelo Direito aos trabalhadores não estimula a geração de empregos, não promove a empregabilidade. A fórmula “menos direitos = mais empregos” não é verdadeira; não há qualquer relação entre o rebaixamento da proteção social e a geração de empregos.
A própria experiência brasileira revela que é o fomento da atividade econômica, mediante o recurso a políticas econômicas anticíclicas, a via mais eficaz para a redução das taxas de desemprego. Entre 2003 e 2014, o Brasil criou 20 milhões de novos empregos formais, sendo que entre 2010 e 2014 foram criados 5,5 milhões de novos postos de trabalho. Em agosto de 2014, o índice de desemprego brasileiro, calculado pelo IBGE, era de cerca de 5%, caracterizando-se como pleno emprego. Esse período coincide com a forte expansão da economia brasileira, que, entre 2004 e 2013, cresceu a uma taxa média de 4,0% ao ano, com melhoria na distribuição de renda e consequente redução da pobreza. Em outros termos, o crescimento da economia brasileira não decorreu da redução da proteção social no país. Ao revés, nesse período se observou um forte avanço da participação do rendimento do trabalho no Produto Interno Bruto, ante o aumento real dos salários da massa trabalhadora.
Apesar disso, há um único aspecto em todo o texto da Lei 13.467/2017 (Lei da Reforma Trabalhista) que efetivamente é capaz de ampliar o número de contratações de trabalhadores no Brasil: o contrato de trabalho intermitente. Este, porém, é um contrato de trabalho vazio, em que não há qualquer compromisso do empregador em garantir uma rotina de trabalho pré-estabelecida e, consequentemente, o pagamento de um salário fixo periódico ao trabalhador. O patrão poderá convocar o trabalhador para o serviço a qualquer momento e somente nas ocasiões em que houver efetiva prestação de labor será devida a remuneração ao empregado. Dessa forma, se o empregado trabalhar apenas 8 horas ao longo de todo um mês, somente será remunerado por essas 8 horas. Igualmente, se não trabalhar nenhuma hora por 3 meses a fio, não receberá qualquer espécie de renda por todo esse tempo. Não há sequer a possibilidade de construção de uma mínima estabilidade financeira, afetiva, social e familiar nessas circunstâncias.
Por outro lado, sob a perspectiva de quem emprega, a ampliação do número de contratos de trabalho intermitentes não significa, propriamente, um maior investimento na atividade econômica nem a projeção de uma trajetória de crescimento, de prosperidade do negócio. Trata-se, na verdade, do aumento do número de trabalhadores disponíveis, sem a necessidade de se incorrer nos custos inerentes a tal operação (o contrato de trabalho intermitente tem custo zero para o empregador enquanto não utilizada a força de trabalho que lhe é disponibilizada por essa fórmula contratual). Isso torna a rotatividade menos perniciosa para o negócio – mas não para o trabalhador – e evita a criação de laços de sociabilidade entre os empregados, cortando pela raiz qualquer possibilidade de resistência coletiva por parte dos trabalhadores e permitindo, em consequência, a intensificação de sua exploração.
Dessa forma, a rigor, o contrato de trabalho intermitente constitui uma verdadeira arapuca para o trabalhador, que, empregado, não terá a garantia de recebimento de um salário suficiente para assegurar a sua subsistência digna, ou mesmo de acesso ao sistema de previdência social. Ou seja, o contrato de trabalho intermitente, porque absolutamente vazio, constitui uma fórmula capaz de reduzir os índices de desemprego no Brasil, inflacionando os números do Governo Federal, sem que haja uma efetiva mudança nas condições de vida dos mais de 14 milhões de trabalhadores que estão em busca de um emprego. O resultado inerente à disseminação do contrato de trabalho intermitente será a precarização das relações de trabalho no país e o empobrecimento agudo de sua população.
*Advogado especialista em Direito Material e Processual do Trabalho e sócio do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados
O povo ou do povo? – Afonso Rodrigues de Oliveira*
“O Estado é o mais frio de todos os monstros frios: mente friamente, e eis a mentira que rasteja de sua boca: “Eu, o Estado, sou o povo.” (Friedrich Nietsche)
E olha que o Nietsche disse isso ainda no século dezenove. Imagina se ele estivesse entre nós, atualmente. Mas não vamos partir pra conversas comadrescas. Temos muito mais coisas importantes pra fazer, pra não decepcionar o Nietsche. Mas nossa responsabilidade vem sendo pisoteada e maltratada desde muito antes do Nietsche. Então vamos cuidar de nós. E vamos começar pela política que é o timão do nosso barco sempre à deriva. Então sejamos nosso próprio timoneiro. E podemos fazer isso desde que nos responsabilizemos por nós. Não é fácil, mas é muito simples.
E não iremos mudar nossa política com arrufos, gritarias nem desprezo. Nada de gritaria nem protestos exibicionistas. Lutemos no silêncio do saber. E comecemos tirando todos os maus políticos, da nossa política. Mas isso requer sabedoria, educação, cidadania e muito amor à pátria. E comecemos por uma escolha racional. Sabemos que ainda temos bons políticos no poder. Mas não lhes damos a atenção que eles merecem para poderem trabalhar. Estamos mais inclinados a acreditar nos alardes politiqueiros dos que dizem ser o povo, quando na verdade são do povo.
Sinto-me envergonhado quando ouço um Senador da República falando sobre direitos dos cidadãos, quando ele mesmo fora cassado anteriormente. Sinto medo que os fichas sujas de hoje sejam eleitos nas próximas eleições. É um risco que corremos, e não deveríamos correr. Então vamos nos preparar para o nosso dever de mudar, tirando da política os que não merecem nosso respeito. E podemos e devemos fazer isso sem brigas, gritarias nem arrufos. E não basta o voto. É necessário que saibamos e conheçamos o valor que o nosso voto tem, tanto para a limpeza quanto para a sujeira. O que nos chama a atenção para a nossa responsabilidade.
É verdade que não podemos nem vamos consertar tudo de um dia para outro. Vai demandar muito. E demorará muito mais, se não começarmos a tarefa já nas próximas eleições. Temos tudo para mostrar nosso valor como cidadãos que seremos no dia em que nos conscientizarmos do quanto podemos ser. Você está com o poder na consciência. Sinta-se como um cidadão para poder reclamar educadamente pela sua cidadania. Porque até agora o que temos sido é marionetes dos irresponsáveis. Reflita sobre seu dever e sua obrigação nas próximas eleições. Vamos limpar nossa política. Ou nunca seremos cidadãos. Nunca seremos respeitados pelos que não se respeitam, desrespeitando-nos. Pense nisso.