Opinião

Opiniao 05 05 2016 2383

O vício liberta – Vera Sábio*Normalmente, lemos um texto através do que seu título sugere e, ao ler que “o vício liberta”, muitos podem, sem completar a leitura, me criticar, não sendo capazes de lerem até o final.

Porém, na atualidade, a própria palavra liberdade tem uma conotação antes imaginada. Ser livre deveria ser tarefa de pessoas compromissadas, capazes de sonhar e concretizar, tendo opções de escolhas profissionais, religiosas e sexuais; respeitando a aptidão dos outros sem burlar a moral, a ética e a legalidade.

Todavia, é comum ouvir um viciado dizer que sua decisão em usar drogas é uma vontade pessoal, não interferindo na vida de ninguém, conseguindo parar quando quiser. Contanto que a droga não lhes falte, que não tenha que roubar e matar para adquiri-la e que muito menos passe por alguma crise de abstinência.

É assim que lhes digo que a droga liberta. A droga liberta o indivíduo das suas responsabilidades como cidadão digno, do respeito ao próximo, do amor a si mesmo, da convivência sadia e confiável, de toda moral, ética e legalidade.

A droga liberta da vontade de ser humano, ser criativo, ser produtivo, ser inteligente e ser centrado na realidade. Pois a droga o leva para um mundo fantasioso, que não existe fora do cérebro corrompido por ela.

Enfim, todo vício é uma droga, seja ela química, emocional, virtual e sensorial; no entanto, sempre paralisadora e com a única direção de levar o viciado ao inferno existencial, destruindo famílias, estruturas físicas e mentais etc..

Para aquele que não sabe aonde quer chegar, qualquer caminho está bom. Mas você é autossuficiente para escolher um bom caminho e, desta maneira, decida seu futuro com uma verdadeira liberdade que lhes permite crescer sem quaisquer amarras imposta pelos vícios, e sejas feliz.

*Psicóloga, palestrante, servidora pública, esposa, mãe e cega

 CRP: 20/[email protected].: (95) 991687731—————————————

‘Estatuto da Família’ e (des) Igualdade – Daniel Ustárroz*Um dos pilares dos direitos humanos é a igualdade. Em nossa concepção ocidental de mundo, cada pessoa ostenta a sua dignidade, a qual irradia direitos frente ao Poder Público e aos demais semelhantes. As pessoas nascem e permanecem livres e iguais à luz do direito, já anunciavam os revolucionários franceses na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789.

Por considerar “que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”, a Assembleia Geral da ONU proclamou, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, cujo art. 2 assim prescreve: “todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição “

No plano nacional, a ideia de isonomia foi intensamente acolhida pela chamada “Constituição Cidadã”, de 1988, cujo art. 5 dispõe: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Oportuno lembrar que um dos objetivos de nossa República é “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

O fato do princípio da isonomia estar contemplado em nosso direito não elimina a possibilidade de pessoas merecerem tratamento legal distinto, desde que sejam apresentadas razões objetivas e razoáveis. Muitos exemplos poderiam ser oferecidos. Por ilustração, nosso sistema previdenciário, reconhecendo a desigualdade entre os sexos na sociedade brasileira do século XX, estabeleceu tratamento diferenciado para compensar (e proteger) as mulheres. Hoje, a maioria das pessoas considera razoável que as trabalhadoras se aposentem mais cedo (53 e 58 anos de idade, como média respectiva atual, das senhoras e dos senhores).

Dentro desse contexto, soa no mínimo estranha a tramitação, no Congresso Nacional, em pleno século XXI, do chamado “Estatuto da Família”. Este “projeto de lei”, segundo os seus defensores, preconiza a definição de família como o “núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

De forma deliberada, os seus mentores se valeram de “homem” e “mulher”, ao invés de optarem por uma fórmula juridicamente mais adequada: “pessoas”. Por decorrência, almejam que o Poder Público e a sociedade ofereçam tratamento diferenciado para casais homoafetivos, os quais não se encaixam na proposta legislativa. O direito legislado não lhes autorizaria formar uma família…

À luz dessas breves rememorações, indago: em 2016, há algum sentido em se ignorar a herança ocidental dos direitos humanos e da igualdade? Ainda: a aprovação legal de um modelo único de união familiar está em acordo com a ideia de se construir uma sociedade livre, justa e solidária? Caso qualquer das respostas seja negativa, o caminho democrático aponta para a desaprovação deste “Estatuto”.

*Advogado, doutor em Direito Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)—————————————-Um dia de contrastes – Afonso Rodrigues de Oliveira*“A defesa dos direitos humanos está mais clara e defendida pelos governos das nações mais influentes em geral”. (Waldo Vieira)Os contrastes do dia começaram quando acordei, pela manhã. Como de costume olhei pela janela o movimento nas ruas lá embaixo. A Rua Oliveira continuava a mesma coisa. Nada de contrastes. O Sol começava a alegrar o pessoal na rua. Aí ouvi uma ordem vinda da cozinha, que também não era contrastante:

– Não vai comprar o pão, não?

Entrei no elevador esfregando as mãos, o que deve ter divertido o porteiro, na tela do televisor. Desci a rua, e atravessando a Rua João Carvalho, nada de contraste. Tudo na mesma. Entrei pela Rua Helena, e tudo numa boa. E a monotonia começou a me incomodar. Estava dando tudo certo. Adoro os contratempos. Eles me alertam. Na padaria a moça me olhou e sorriu. Ela sabe que nunca falo, só levando a mão com os quatro dedos esticados indicando quantos pãezinhos quero. Voltei pra casa meneando a cabeça em cumprimento a os costumeiros sentados nas calçadas. Depois do café dei um pulo da cadeira e exclamei de olhos arregalados:

– Ei, Tinha… Esqueci-me de pagar a conta do celular, que venceu no dia primeiro e hoje já é três!

É que a conta vai aí pra Boa Vista, e eu tenho que pegar sempre uma segunda via por aqui. Mas como isso não justificaria o atraso, saí correndo. E, eu correndo pelas ruas de São Paulo, é uma loucura. Atravessei o viaduto do Chá como se estivesse numa olimpíada. Paguei a conta e voltei na mesma correria. Quando entrei, Ela resmungou:

– Demorou muito. Agora vamos ao supermercado.

Saímos e foi aí que as coisas começaram a contrastar. Atravessávamos a Praça João Mendes quando vi, lá na frente, uma placa, dessas deixadas pelos dos movimentos contra e a favor. Na placa estava escrito: “O Estado não investe em educação porque a educação derruba o Estado”. Mostrei a placa pra dona Salete e saímos balançando as cabeças. Seguimos pela Avenida Liberdade, parando aqui e acolá nas vitrines. É a praia dela. Finalmente entramos no supermercado. E a rodada por ali é longa. De prateleira em prateleira, olha, pega, solta. Pouca coisa é jogada no carrinho. Sempre nos dispersamos. Eu pra lá ela pra cá. E foi aí que o contraste veio. De repente ela fez sinal para eu me aproximar. Ela estava com um pacote de peixes congelados, na mão. Riu e me mostrou onde eu li: “Anel de lula – congelado”. Sem maldade nem menosprezo ri, não resisti e segurei o pacotinho de anéis congelados. E, novamente, sem maldade e apenas instintivamente, contei os anéis. Eram só nove. Sorri discretamente e saí. Pense nisso.  

*[email protected]    99121-1460