A odisseia de Montez – Francisco A. Gomes*
Com dezessete anos, Montez Maduro, vulgo Montezinho, desceu a ladeira da vida e seguiu rumo ao pulmão do mundo para respirar novos ares, desbravar terras inóspitas e interagir com culturas alheias, na esperança de dias melhores, pra sempre. Sem olhar para trás, ignorou sua velha infância e tudo aquilo que um dia jurou presença eterna: sua mãe, Dona Francisca, seus irmãos gêmeos mais novos, Hugo e Chávez, seu cachorro, Argos e seus amigos do bairro de Agapito.
Montezinho partiu para uma verdadeira odisseia, sem lenço e sem documento, em um dia ensolarado de agosto. A temperatura estava muito alta, algo anormal para aquele período. Montezinho acordou cedo devido ao calor exagerado. Estava ensopado, transpirando água salgada de produção corporal própria. Morava em uma cabana quadrada, medindo quatro por quatro, de madeira velha, coberta por chapas de alumínio.
Levantou-se meio atordoado, olhou para o nada, pela única janela improvisada que havia no barraco. Depois desviou o olhar para o terreiro e avistou os seus irmãos engatinhando na terra seca e quente. Nesse momento, em um mix de angústia e desespero, não titubeou ao concluir que a fuga era a única alternativa plausível para um futuro, mesmo que incerto, pois permanecer naquele contexto de miserabilidade era sinônimo de fome e, principalmente, de vida curta.
Quando a dona Francisca chegou em casa, Montezinho já havia fugido. Diante de sua ausência, ela não chorou, não gritou, muito menos se desesperou. Na verdade, seu espírito materno desejava há muito tempo a fuga de seu primogênito, haja vista que essa evasão anunciada significaria um grito de esperança e de retorno para as gerações mais novas em um futuro não tão distante. Contudo, ao contar sobre os fatos recentes para a sua vizinha, dona MarisabelColmenares, ouviu como resposta um discurso estarrecedor e cruel.
Dona Colmenares afirmou categoricamente que Montezinho havia feito uma péssima escolha e por isso iria sofrer muito na nova morada, uma vez que o povo de lá era agressivo com gente de fora. Porém, Dona Francisca manteve-se otimista ao contra argumentar sua amiga.
– O corpo de Cristo deve aceitar os estrangeiros com braços abertos e tratá-los como iguais! Como um verdadeiro povo cristão, tenho fé que eles receberão de braços abertos meu filho amado, em nome do Senhor Jesus. Meu filho conseguirá um bom emprego e retornará para ajudar seus irmãos.
Há cem quilômetros de distância do ponto original, Montezinho seguia a pé, em baixo de um sol escaldante, à beira da principal rodovia que ligava um país ao outro. Ele pretendia seguir viagem caminhando a passos curtos, estava trabalhando o seu psicológico para isso, pois a essa altura, conseguiu perceber que, por sua condição de estrangeiro, não conseguiria carona nem com reza braba. Assim sendo, o andarilho logo encontrou companhia ao longo de sua jornada. Foi a partir dessa interação com os seus iguais que Montezinho conseguiu um gole de água e o mínimo de alimento necessário para prosseguir na diáspora.
Após cinquenta e quatro horas de caminhada, Montezinho chegou à capital de São Sebastião, reconhecida por amplas devoções e hipocrisias ínfimas. Ao reunir-se aos demais imigrantes na praça pública Simón Bolívar, sentiu o aroma dos ninguéns espalhados, famintos como os bichos enclausurados, com sonhos perdidos e a dignidade em flagelos. A sua ganância de uma vida farta havia se desmanchado no ar. Ele só queria um prato de comida, mas o marmitex estava sendo distribuído no outro lado da avenida circular de mão dupla.
Montezinho respirou fundo, buscou sua última força para conseguir atravessar poucos metros que mais pareciam quilômetros. Sua alma flutuou, ouve-se um urro de misericórdia, o automóvel parou como a batida de seu coração. Montezinho foi enterrado nu, como indigente em caixão aberto feito de compensado, na última quadra, no fim do outeiro do cemitério dos imigrantes.
*Professor de sociologia do CAp/UFRR. E-mail: [email protected]. Acesse: www.amajouva.blogspot.com.
DE QUEM FOGES? – Vera Sábio*
Não dá para fugir e nem para olhar para trás.
A vida é feita de várias escolhas, no entanto nem tudo podemos experimentar para depois decidir. Fatos acontecem uma única vez.
Cada segundo é único, cada dia é único e as ações podem ser semelhantes, parecidas, no entanto são únicas. Nada ocupa o mesmo lugar no espaço e esta consciência nos possibilita acertar mais e conseguir evoluir.
Então do que foges?
Foges dos outros, se só você tem condições de ir ao encontro de quaisquer pessoas.
Foges da luta, se a cada dia os desafios batem a porta e entram, queira você sim ou não.
Foges do amadurecimento, se todos os segundos não voltam e te permite estar mais velho sempre.
Foges dos compromissos, se o futuro é o maior compromisso que tens, pois o passado é história, o presente é agora e o futuro depende do seu compromisso com a vida. Foges de suas ações, se vives em movimento e tudo depende do que e como fazes estes movimentos. Então na verdade, não foges, simplesmente adias.Adiar é o verbo dos descompromissados, dos atrasados e preguiçosos. Afinal, quanto antes cumprires o seu papel, desenvolveres os seus talentos, mais lhes será dado e novas possibilidades se abriram a sua frente.
Assim, tem sorte, tem sucesso, é feliz e realizado quem não reclama e levanta cedo; não tem medo da batalha que lhe aguarda e faz seu possível, na confiança de que o impossível Deus sempre faz.
Não jogue seu destino nas mãos dos outros. Não fujas de tudo que és; pois diversas vezes o seu comodismo nem te deixa verificar, do que realmente é capaz.
Filho de peixe, peixinho é. Filho de Deus “deusinho” é. Temos um enorme valor e não podemos fugir dele.
*Psicóloga, palestrante, servidora pública, escritora, esposa, mãe e cega com grande visão interna. Compre meu livro “Enxergando o Sucesso com as Mãos”, entrando em contato comigo pelo 99168-7731.www.enxergandocomosdedos.blogspot.com.br
Como você se relaciona? – Afonso Rodrigues de Oliveira*
“Todo relacionamento é um reflexo do relacionamento que você tem consigo mesmo”. (Deepak Chopra)
Sempre tive a mania de observar as pessoas. Até que se acostumasse com isso, a dona Salete ficava encucada. O diabo é que ela só via quando eu estava observando alguma mulher. Era um verdadeiro inferno. Os homens, eu podia observar à vontade. Ela não estava nem aí. Uma mania que me enriqueceu muito em experiência. E por isso aprendi, cedo, a não me aborrecer quando sou enganado. Aprendi que se sou enganado sou enganado pela minha inexperiência. E se é assim, por que me aborrecer? Já levei muita rasteira sabendo que ia levá-la. Por isso mesmo nunca caí com elas. Ao contrário, aprendi muito com todas. Até mesmo quando algo desagradável acontecia com alguém, e que eu poderia ter evitado se o tivesse advertido ou feito alguma coisa com antecedência. Mas vem cá, vem cá… você acreditaria se eu lhe dissesse que você vai ganhar na loteria amanhã? Não.
Manuel Jacinto Coelho criou a Cultura Racional em 1935. À época ele era um funcionário simples do Itamarati, no Rio de Janeiro. Mas Getúlio Vargas nunca ia ao Itamarati sem bater um papo com ele à sua mesa. Vez por outra, Getúlio o chamava ao Catete para conversarem. Um dia o Getúlio entrou no Itamarati e cumprimentou o Manuel. Mas apenas cumprimentou e passou. Manuel Jacinto foi até o Presidente e perguntou se ele iria viajar no dia seguinte. Getúlio disse que iria a Petrópolis. Manuel sugeriu que ele deixasse para ir noutro dia porque ele, Manuel, estava com um pressentimento inquietante. Getúlio sorriu, bateu no ombro do Manuel e deu o assunto por encerrado. No dia seguinte o Presidente viajou a Petrópolis e foi naquele dia que ele quase foi esmagado por uma pedra que rolou, serra a baixo, caindo sobre o carro do Presidente.
Daquele dia em diante, nunca mais o Getúlio Vargas viajou sem antes conversar com o Manual Jacinto Coelho. Tenho algumas fotografias de alguns Presidentes da República, conversando com o Senhor Manuel, no Catete e no Alvorada. Inclusive o Sarney.
Puxa vida, eu ia falar de um garotão que trabalhou comigo. Um cara legal. Mas eu sabia que alguma coisa iria lhe acontecer. Mas nunca lhe falei do meu pressentimento. Senti-me mal no dia em que a mãe dele foi acordá-lo para o trabalho, e ele estava enforcado, dentro do quarto. Mas não tinha como eu lhe falar do meu pressentimento. Teria evitado? Que relacionamento você tem com você mesmo para poder se relacionar com as outras pessoas? Pense isso. *[email protected]