A violência e a impotência do Estado – Sebastião Pereira do Nascimento*Atualmente, é inegável que vivemos uma crise de violência em toda sua plenitude, a qual tem envolvido grande parte da sociedade no mundo. No Brasil, a violência desponta na mesma intensidade, gerando desconforto à sociedade brasileira que vivencia de forma irresoluta uma situação assustadora, que em muitas cidades chega próximo a um cenário de guerra.
Entendemos como violência tudo aquilo que a partir de ameaças ou fatos reais possa levar prejuízo físico ou moral à pessoa.Contudo, embora pareça maior nos dias atuais, a violência não é um fenômeno novo aqui no Brasil. Ela sempre esteve presente ao nosso cotidiano, principalmente em função da oferta insuficiente ou mesmo a negação total das garantias dos direitos igualitáriosque geram tantas desigualdades sociais.
Para muitos, a violência de agora é um legado do passado que veio se multiplicando numa escalada desordenada, onde os mais “novos” revolvem as vísceras podres da origem e passam a reproduzir em casa,e depois na rua, os códigos de conduta nefasta que se acumulam no decorrer da vida pregressa.
Assim, os sujeitos cada vez mais familiarizados com as práticas da violência se manifestam ensandecidos, cuja lógica não é nada demais agredir ou mesmo dar tiros e facadas em alguém, ou causar atropelamento com a nítida intenção de matar.
No caso do Brasil, embora a violência exista em todos os meios, ela apresenta-se mais acentuada nos centros urbanos (incluindo aqui a violência moral),tanto por pessoas ditas como pertencentes às classes média e alta, como à classe baixa, que infelizmente é considerada a mais marginalizada. Com isso, temos a convicção de que todas as categorias sociais abrigam seus meliantes,dissolvidos na sociedade em geral.
Dessa forma, como nenhum grupo social está isento de praticar a violência, também ninguém está isento de saber o enorme mal que a violência desempenha na atividade humana. E para frear isso é difícil. De um lado está uma sociedade corrupta e violenta e de outro um Estado omisso e impotente, o qual revela a sensação de ser o responsável por tudo isso, ao mesmo tempo em que nos traz a percepção de impunidade.
Sobre a impunidade, não diz respeito apenas às classes dominantes, mas também aos “pequenos” que encontram nos braços da lei diversas circunstâncias como: “não tiveram oportunidades na vida”; “são pobres e miseráveis”; “o Estado é culpado por isso”, etc. E, além disso, há as atenuantes de aplicação obrigatória como: “confissão do delito”, “réu primário”, “menor de idade”, “fora de flagrante delito”, entre outras circunstâncias em que a justiça aplica uma espécie de “anistia” aos diversos praticantes de atos ilícitos. Isso quando o indivíduo não passa despercebido da lei, o que é muito suscetível na atualidade.
A primeira vista, é surpreendente quando se percebe o quanto parece ser difícil acabar com a violência.Aqui, observamos que a força da violência parece até ser uma estratégia bem-sucedida de controle social e persuasão, de ampla adesão popular, onde a sociedade e a violência, embora sejam fenômenos distintos, geralmente apresentam-se juntos, o que causa a esterilidade de todas as fontes de reação do Estado.
Isso leva o cidadão de bem a se esvair de forte indignação. E o pior é que essa indignação se traduz numa espécie de bola de neve, a qual se renova a cada dia. Sobretudo quando nos sentimos impotentes. De outro modo, a mera indignação não é produtiva. Não gera ações e acaba resultando no desânimo e sofridão.
Em Roraima, não diferente de outras regiões do país, o descaso é total.O que assistimos éa derrocada das instituições públicas de segurança e a reconhecida incapacidade do Estado de atuar diante do fortalecimento da violência. É o Estado desorganizado tentando derruir o crime organizado. Em contrapartida, a sociedade local tem o dever moral de fazer sua parte, uma vez que ela também é responsável pelos males praticados por seus congêneres.
Finalizando, ratifico aqui uma afirmação feita pelo escritor uruguaio Eduardo Galeano quando diz: “Estado de sítio. Não se distraia, não baixe a guarda, desconfie: você está estatisticamente marcado, mais cedo ou mais tarde terá que sofrer algum assalto, sequestro, violação ou crime”.*Filó[email protected]
Gestos desiguais – Afonso Rodrigues de Oliveira*“Os homens pensam que possuem uma mente, mas é a mente que os possui.” (Bob Marley)Há uns casozinhos que já falei deles por aqui. Mas eles são importantes na sua simplicidade. Representam o comportamento humano, tanto no dizer quanto no ouvir. São casos corriqueiros, do dia a dia, que nem sempre lhes damos tanta atenção. Mas eles ensinam, sim. Eles fazem parte da grade de ensino da famosa e menosprezada Universidade do Asfalto. Mas na verdade, damos mais importância aos acontecimentos desagradáveis, por eles serem mais chamativos. O que é um defeito prejudicial ao desenvolvimento, na imunização racional.
Faz muito tempo. Eu estava no Rio de Janeiro e precisei ir à Rua dos Andradas. Mas necessitava de orientação. Lá na frente havia um grupo de motoristas de táxi, sentados em banquinhos, e discutindo. Aproximei-me para me informar. De repente um dos motoristas falou para os colegas:
― Eu não indico mais. Não indico. Um dia, uma mulher chegou e me perguntou onde ficava a Rua dos Andradas. Eu falei: a senhora vai em frente e entre na segunda rua. A primeira à esquerda é a dos Andradas. Aí ela falou: mas me disseram que era pra lá. Então eu falei: então a senhora vai pra cá. Que diabo!
Sorri, segui em frente, entrei pela direita e saí na Rua dos Andradas. Aquele motorista, na sua explosão de ira não sabe o bem que me fez sem eu recorrer. Por que se afobar? É tolice. Certo dia, em São Paulo, eu estava na Praça do Patriarca, quando uma senhora chegou e me perguntou:
― Onde fica a Rua Barão de Itapetininga?
Apontei e falei:
― É só atravessar o viaduto e pronto.
Ela falou sem me olhar:
― Mas ali me disseram que era pra lá…
― Se eu fosse a senhora atravessaria o viaduto.
Ela franziu a testa e seguiu rumo ao viaduto do Chá. Foi no rumo certo. Não sei por que as pessoas gostam de complicar. Meu pagamento, recebo-o pela Caixa. Juro que é muito dinheiro. Fico assustado ao sair com ele na sacola. Recentemente eu estava, depois de recebê-lo, em pé na calçada da Caixa, ali na Praça da Sé. De repente um cidadão aproximou-se e perguntou:
―Onde fica a Rua Sete de Abril?
Novamente estiquei o braço, apontei e falei:
― É só atravessar a Praça.
O cidadão olhou-me simpático e falou sorrindo:
― E olha que eu sou paulistano.
Bem diferente de todos os citados. E é muito bom a gente aprender a conviver com os gestos diversos. O que faz parte do desenvolvimento cultural. Comece a observar coisas e pessoas, como elas são e não como você gostaria que fossem. Quando observamos isso aprendemos a respeitar as igualdades nas diferenças. Aí a vida se torna mais agradável. Pense nisso.*[email protected]