As luzes continuam acesas
Walber Aguiar*
“Há tanto amor pra tão pouca vida” (Camões)
Eram dias frios de inverno. Dias de copa do mundo e de festejar mais um ano da ainda jovem Boa Vista, a cidade que nos emprenhou, que nos pariu, que nos sustenta e que por muitos é saqueada. Também eram dias de Maria Augusta, a nossa querida Guga, carinhosamente chamada pelos mais íntimos.
Ora, Guga era multimidiática. Cantava, escrevia, tocava piano, declamava, era Juíza de paz, professora de datilografia e detentora de outros títulos e encargos. Fazia parte da Academia Roraimense de Letras, uma confraria de escritores do quilate de Adair Santos e Dorval de Magalhães, pra quem a mesma dedicou um texto intitulado “as luzes estão acesas”, por ocasião da exposição feita na casa do presidente “ad eternum” da academia.
Maria Augusta foi, por muito tempo, minha vizinha de fundo de quintal. Eu, menino, balando passarinhos e ela, já ciosa no cuidado com a natureza. Mas nos entendíamos bem, pois, com o tempo aprendi que passarinho serve pra cantar e alegrar nossas manhãs, quando a vida ameaça nos tragar diante da angústia das tardes de terça ou das noites de domingo. Paulo e Janira também estavam lá, na silenciosa casa da Capitão Júlio Bezerra, fazendo companhia para o anjo que cantava, poetizava e casava gente, no tempo que casamento era coisa séria e duradoura, no tempo que o amor era muito mais fácil e consistente.
Não cheguei a frequentar suas aulas de datilografia, pois aprendi tal arte com seu Genésio, a quem devo até hoje a ligeireza nos dedos e a arte de escrever com graça e leveza. Mas, Guga, amiga de Alcides Lima e de uma penca de gente, estava sempre disposta a animar a qualquer um que com ela tivesse contato. Escrevia belos poemas e cantava músicas antigas e atuais, mas sempre com um repertório de bom gosto, não dessa agonia que invadiu quase todos os veículos de comunicação, principalmente as rádios.
Guga também fez parte do Conselho de Cultura, colegiado responsável por filtrar a cultura em Roraima, como órgão consultivo, deliberativo e de execução de planos e projetos. Mas nunca se ateve à burocracia das instituições por onde passou. Isso porque, era pássaro sem gaiola, Flor Bela que a ninguém espancava, Pessoa que roçava a língua na língua portuguesa, descortinando as mais belas letras que se podia ler e ouvir.
Descanse em paz, Guga. Um dia tomaremos um chá com biscoitos sob as frondosas mangueiras do infinito, e lembraremos da tarde em que tomamos um chá com biscoitos em sua sala, no Pricumã.
*Poeta, professor de filosofia, historiador, membro do Conselho de Cultura, advogado e membro da Academia Roraimense de Letras.
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Tudo está no respeito
Afonso Rodrigues de Oliveira*
“O elemento mais importante da vida em sociedade é o respeito que se tem pelo indivíduo.” (Rich De Vos)
Nunca haverá equilíbrio onde não houver respeito. Já sabemos que somos todos iguais nas diferenças. Mas só seremos iguais quando respeitarmos as diferenças. E ainda vivemos num mundo onde até a cor da pele é rejeitada como diferença. E olha que estamos no século XXI da era cristã. Imagina como terá sido antes de Cristo.
O que significa que nada, ou quase nada, mudou nas nossas sociedades. Tenho uns amigos aí, em Roraima, que adoram essa frase do Emerson: “Você é tão pobre ou tão rico quanto o seu vizinho, senão não seria vizinho dele.” Há um zilhão de outras frases, ditas por sábios verdadeiros, que nos levam ao mesmo pensamento. Nunca seremos iguais enquanto não considerarmos e respeitarmos as diferenças entre nós e as outras pessoas.
O importante é que respeitemos as diferenças. O que às vezes fica difícil entender.
Não podemos e nem devemos esperar e querermos que as outras pessoas sejam como nós. Cada um tem seus pensamentos de acordo com a sua evolução racional. O importante é que amadureçamos para entender que uma coisa é você respeitar o próximo, outra é familiarizar-se a ele, na decisão de igualar-se. Já lhe falei dos anos que vivi ali na Rua Conde de Sarzedas, no bairro da Sé, em São Paulo. Um ambiente que enriquece nossas observações quando sabemos observar.
Quando você entra na Rua e vai até à Rua João Carvalho, passa por uma porção de calçadas evangélicas. É como se você estivesse caminhando pelo Paraíso. Mas, depois da João Carvalho é como se você estivesse entrando num inferno, mas sem arrufos. Tudo calmo e coberto pela fumaça das drogas. Aí você entra no Bairro do Glicério. As igrejas ficaram para tras.
Sempre que eu passava por ali, garotas e garotos, sentados nas calçadas cobriam-se de fumacê. Mas nunca deixei de cumprimentá-los e eles me respondiam com respeito. E foi esse respeito que nos manteve, cada um na sua, respeitando as diferenças entre uns e outro. Faça isso sempre. Nunca deixe de cumprimentar alguém que lhe pareça inferior. O importante é que você não deve ir além do cumprimento.
orque a aproximação causa a familiaridade, e esta, a igualdade. Respeite sempre as diferenças, mas as mantenha afastadas de você. Seu valor está no que você é, e nem sempre no que você pensa que é. Então seja o melhor que você puder ser, respeitando sempre o seu próximo.
Hoje, aqui na Ilha está um dia maravilhoso. O que sempre me traz uma vontade enorme de estar aí com você. Batendo um papo alegre, saudável e construtivo. Abração, e pense nisso.
*Articulista
99121-1460