O DIREITO À APRENDIZAGEM EM MEIO À PANDEMIA NO MUNICÍPIO DE BOA VISTA
“Compreender que há outros pontos de vista é o início da sabedoria” (Joseph John Campbell)
Arthur Philipe Cândido de Magalhães*
A pandemia tem criado muitos e novos desafios. Um deles é continuar garantindo a aprendizagem dos estudantes à distância. Nesse sentido, é imprescindível a parceria entre poder público, professores, alunos e pais ou responsáveis. A pergunta que muitos têm feito nesse momento é: as crianças estão realmente aprendendo em casa?
No entanto, esta talvez não seja a pergunta adequada, mas sim: será que as crianças estão conseguindo aprender com as atividades propostas pelo “Aprendendo em Casa”, elaboradas pela equipe técnica da Secretaria Municipal de Educação de Boa Vista e alguns professores municipais? Não me refiro à qualidade das atividades que, por sinal, se mostram adequadas para o contexto em que estamos.
Quando a proposta do “Aprender em Casa” foi lançada, ficou claro que as atividades não seriam obrigatórias. Deveriam ser cumpridas apenas por aqueles que pudessem ou tivessem os recursos tecnológicos para impressão ou acesso à internet. Mesmo assim, os professores deveriam realizar os encaminhamentos e as orientações necessárias. De uma hora para outra, professores tiveram que se reinventar para se comunicarem por meio de plataformas digitais, elaborar vídeo-aulas e orientar atividades à distância, ou seja, ensinar de forma online, mesmo sem uma formação adequada para tanto.
Um dos fatores que mais contribuem para a dificuldade das intervenções via tecnologias, diz respeito às poucas ações de inclusão digital realizadas nos últimos anos nas escolas. Para uma gestão que sempre falou em inclusão digital é de se estranhar que tenha desativado os laboratórios de informática das escolas, e que não possua nenhuma plataforma online ou site institucional de fácil acesso a professores, alunos e responsáveis. E, para completar, não sabemos a real situação do trabalho que está sendo realizado na rede, pois falta diálogo com os professores.
Outro questionamento, diz respeito à porcentagem de estudantes que realmente estão conseguindo realizar essas atividades. Acredito que, pelo tamanho da rede, tenhamos mais de 30.000 alunos matriculados no Ensino Fundamental. E, se apenas 10% da rede estiver acompanhando as atividades, como se estima, isso corresponde a 3.000 estudantes. E o direito de aprender dos demais, onde fica?
Quando levanto essas questões não me refiro somente à proposta da rede de ensino, mas também à importância que os pais e responsáveis devem dar à educação dos seus filhos. Aliás, a educação não é só dever do Estado, mas também da família. Nesse sentido, deve haver esforço de ambos os lados. Então, proponho uma reflexão a respeito de perguntas como: os pais estão conseguindo dar atenção às necessidades de aprendizagem em meio à pandemia? Qual a porcentagem de estudantes que realmente realiza essas atividades? As propostas pedagógicas têm efeito positivo e bons resultados? Se não têm, foi pensado outra estratégia pela equipe técnica da Secretaria Municipal de Educação? As escolas e professores tiveram autonomia e recursos para atender às suas demandas? O que os professores pensam a respeito disso? Ou será que os docentes estão somente repassando atividades para cumprir uma função, sem reflexão crítica se, de fato, está ocorrendo aprendizagem.
Aprender em meio à pandemia é um direito que se transformou em desafio. Penso que o sistema de ensino deve planejar estratégias, avaliá-las, revê-las e, quando necessário, mudar os rumos. Na minha perspectiva, a gestão municipal deveria ter uma ação mais clara e efetiva, deveria pensar em um outro tipo de intervenção.
Uma sugestão: oferecer material didático de revisão aos estudantes, por meio de apostilas. Isso daria condições aos alunos de reverem conteúdos, de forma que pudessem consolidar aprendizados de anos anteriores. “Mas não tem como fazer isso para todos”, pode-se questionar. Certo. Então, porque não fazer com os estudantes do 5° ano, que devem progredir para a rede estadual em breve? Se atendêssemos dessa forma os alunos do 5º ano, estes teriam condições de aproveitar parte do tempo de aula remota conforme parecer do Conselho Nacional de Educação.
A respeito disso questiono: como os estudantes estarão em termos de aprendizagem e irão para o sexto ano na rede estadual? O que já foi analisado ou refletido sobre isso? O que o Estado e o Município pensam a respeito dessa situação? O que têm se prontificado a fazer por esses estudantes? É mais do que sabido que a transição de uma rede para outra já é impactante, imagine em um período como este, em que o calendário de aulas pode ser diferente de uma rede para outra? Qual a proposta de adequação de currículo para ambos, já que a defasagem de aprendizagem é clara e evidente em virtude do tempo de distanciamento social?
Pode-se questionar ainda se a prefeitura dispõe de recursos para entregar material a tempo. Sinceramente, não sei. Mas já estamos há quase cinco meses em casa e não se percebe qualquer mudança ou iniciativa nesse sentido. Da mesma forma que foram entregues alimentos às famílias dos alunos, poderiam ser entregues materiais e apostilas. Sugiro ainda que o poder público realize uma consulta aos docentes e responsáveis.
Por fim, quero salientar que sei do compromisso dos professores com a aprendizagem de seus alunos e de sua preocupação em favorecê-la. Todavia, é preciso construir uma ação a muitas mãos e a Secretaria de Educação é quem tem o papel de definir essas iniciativas, a partir de um diálogo permanente com a comunidade escolar. Nada melhor que ouvir os professores, pois somos nós os PROFISSIONAIS DO ENSINO.
Somos professores! Nossa voz precisa ser ouvida!
*Professor da Rede Municipal de Ensino de Boa Vista
AS TRAGÉDIAS EM TEMPO DE PANDEMIA
Sebastião Pereira do Nascimento* A história da humanidade remonta diversos episódios pandêmicos acontecidos ao longo dos tempos. Só para recordar: a peste bubônica (séc. 14), a varíola (maior surto no séc. 18), a cólera (séc. 19), a gripe espanhola (início do séc. 20), a gripe suína ou H1N1 (já neste século) e agora mais recente a covid-9. Além disso, outras tragédias como as duas grandes guerras mundiais também assolaram mundo. Contudo, esses eventos deletérios que causarem grande mortalidade de pessoas, obrigaram também a humanidade repensar novas formas de encarar o mundo.
Hoje, no tempo da covid-19, quando a humanidade poderia estar mais preparada (estrutural e tecnologicamente) para enfrentar esses tipos de convulsões, no entanto, o que observamos, mormente no Brasil, é um contrassenso partindo inclusive do governo central. É sabido que a covid-19 na China e Europa, que antecedeu o surto no Brasil, poderia servir de espelho para que o país tomasse as medidas cabíveis no intuito de atenuar a epidemia. Porém, o governo brasileiro não tomou as medidas necessárias – embora as autoridades médica-sanitárias (uma das mais bem conceituadas do mundo), à revelia do planalto, vêm fazendo o possível para conter a doença, a qual vem sendo escrita na história recente do país como um genocídio. Ainda que o Brasil não mereça viver isso infortúnio.
Portanto, a incúria do governo federal com a epidemia, foi o fator principal para esse genocídio, posto que na gestão do ministro da saúde Henrique Mandetta, houvesse uma tentativa de adotar as orientações técnico-cie
ntíficas. Há quem diga também que mesmo com alguns embutes praticados pelo segundo ministro da saúde (Nelson Teich) a tragédia pudesse ser menos invasiva.
Contudo, o descompromisso social, a sabotagem às normas sanitárias e as insinuações sarcásticas sem nenhum julgamento do presidente da república – como de seus ministros e de algumas autoridades estaduais e municipais que partilham das mesmas afetações – levaram a desobediência excessiva de parte da população brasileira de não usar a máscara ou o distanciamento social, atributos primordiais para diminuir a disseminação do novo coronavírus. Portanto, esse incitamento por parte de quem tem o maior dever constitucional de cuidar do país, é um aditivo para o aumento dos casos da covid-9 – que já passa das 100 mil mortes de brasileiros. Assim, seja por incompetência ou por maldade deste governo, a agrura tende ser ainda pior, visto que em plena crise sanitária a pasta ministerial da saúde não tem um titular definitivo, isso sinaliza um desprezo mórbido deste governo pelas causas públicas.
Assim, devemos tomar a consciência de que as coisas só não tão piores devido os múltiplos esforços dos profissionais de saúde (sem nenhuma exceção), da comunidade técnico-científica, de algumas decisões do STF e de grande parte da população brasileira que desqualifica as atitudes imorais deste governo e de forma responsável faz a sua parte.
Por outro lado, há de se falar também da pandemia no contexto mundial que, malgrado as mortes e a humanidade em turbulência, o dinheiro que tanto é protagonizado no mundo, onde muitos dizem ser o principal impulso da vida humana, observamos que passam inúteis diante da pandemia. Também é possível perceber muitas pessoas antes convencidas de que eram indeléveis, imbatíveis e irresistíveis, mas que diante da enfermidade deixaram cair suas máscaras: as antefaces que ocultavam suas afetações, posto que alguns imbecis, ainda julgam-se ser mais importantes que os outros.
E há também aqueles que ainda vociferam em meio a tanta estupidez, destilando os seus mais enfermos mugidos e os mais contraditórios sentimentos humanos, não sabendo que mais tarde terão de prestar contas de suas incoerências. Aos insultuosos, restará pedir desculpas a todos os mortos, além de terem as suas consciências presas ao desespero. E mais tarde, quando se acharem ilesos da covid-19, logo virá alguém para fazer faxina no hospício das trevas, espargiando cepas de outros “vírus”, para recebê-los.
E aqueles que hoje negam a vida em favor do dinheiro, amanhã pedirão clemência ao seu demônio, pois de nada adiantará possuir tanta riqueza e poder, uma vez que mesmo tentando subornar o diabo não terão sossego. E aqueles frívolos que dizem ser belos, divinos e abonados, hoje percebem que somos todos iguais diante dessa pandêmica. Por outro lado, o mundo todo também vem percebendo, por via dessa irrupção, o quanto dos humanos, existem de desumanos.
E, ainda que a humanidade não merecesse tudo isso, do alto do isolamento e das diversas conexões virtuais, todos nós percebemos – a duras penas – o quanto somos carentes e inseparáveis uns dos outros. Logo, é oportuno, mesmo com os olhos em lágrimas, que a humanidade pensasse noutra forma de viver o mundo e, diante de todos os mortos, agendasse um recomeço de vida, como princípio: a renúncia da indiferença humana.
*Filósofo e Escritor
A MASSA HUMANA IMPENSANTE
Afonso Rodrigues de Oliveira*
“Milhões de pessoas ainda compõem a massa humana impensante: escravas das opiniões dos outros, não pensam por si mesmas.” (Waldo Vieira)
Eu iria um pouco além. Eu diria que bilhões e não milhões ainda não vivem a própria vida. Ontem assisti a uma entrevista enriquecedora, com o Deputado Rodrigo Maia, pela televisão. Foi legal, mas tirou-me a atenção, do caminho ainda percorrido pelos que deveriam estar mudando os caminhos dos desacertos. Quando será que iremos aprender a viver como seres humanos civilizados? E nesses momentos viajo por pensamentos dos que pensaram. Rui Barbosa já nos disse: “Quanto mais corrompida a República, mais leis.” E no momento em que deveriam nos trazer mais calma, as arengas e discussões acirradas brotam de onde não deveriam sair: do universo das leis sem justiça.
Enquanto o Deputado falava em cidadania, eu me perguntava quando será que vão nos dizer o que realmente é cidadania. Ou continuarem esperando que nos eduquemos enquanto eles, os responsáveis pelo ensino, deveriam cuidar mais da educação? Porque enquanto não entendermos isso, não seremos cidadãos. Continuaremos títeres, de titeriteiros que não estão nem aí para a cidadania. Vamos trocar a moeda. Ninguém, na política brasileira, orienta o eleitor brasileiro para que ele, o eleitor, saiba que o cidadão, numa política de democracia, vota por dever e não por obrigação. Qual o político, ou membro da Corte da Justiça, está interessado nisso? Até quando continuaremos sendo obrigados a fazer o que deveríamos fazer por dever, e não por obrigação?
Mas a tarefa não é fácil nem simples. Ela exige muitas mudanças, dedicação, honestidade e tantos outros valores que estão escondidos na prateleira da ignorância. Porque para que sejamos realmente cidadãos devemos ser educados. E quem está interessado em educar? Para eles a educação lhes tiraria os votos.
Vamos maneirar. Mas não negligenciar. O futuro do Brasil depende de cada um de nós. E não iremos melhorar o País enquanto não melhorarmos, nós mesmos. Então vamos fazer nossa parte, nos educando politicamente. Ainda temos bons políticos no Brasil. Mas não temos mais estadistas. Então vamos construí-los, para que eles nos apresentem ao mundo, com a imagem que realmente merecemos. Vamos nos respeitar para podermos ser respeitados. E nunca o seremos enquanto continuarmos a eleger os que não têm competência para trabalhar por nós, tornando-nos cidadãos de fato. Vamos nos preparar para merecermos o voto facultativo, e votar por dever, e não por obrigação. E só os esclarecidos e educados, fazem isso. Pense nisso.
*Articulista Email: [email protected] (95) 99121-1460