Opinião

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Existência

João Paulo M. de Araujo

A existência é algo que nos fascina. Não só a existência do humano em si, mas, a existência de qualquer coisa. O que significa dizer que algo existe? Em nosso mundo natural, não há dúvidas sobre a existência de pessoas, carros, árvores, gatos, portas, montanhas, calor, insetos etc. Em nosso cotidiano, essas coisas não causam em nós nenhum espanto, pois, estamos habituados a vê-las o tempo todo. Entretanto, lidar filosoficamente com a questão da existência não é uma tarefa das mais fáceis. Aquilo que antes parecia comum, pode assumir uma nova aparência quando tornamos nossos olhares atentos. Filosofia, é reaprender a ver o mundo, dizia o filósofo francês Merleau-Ponty.

O ramo da filosofia que se ocupa da existência das coisas em geral chama-se ontologia. Por ontologia, entendemos “o estudo do ser enquanto ser”; eis o nosso legado aristotélico. A princípio, isso não parece nos dizer muita coisa.  Afirmar que uma coisa existe, é dizer (de seu ser) que ela é em alguma medida. Foi o eleata Parmênides, há mais de vinte séculos atrás, que afirmou: pois pensar e ser é o mesmo. Ora, do ponto de vista lógico, só podemos pensar o que é. Jamais podemos pensar o que não é. Com isso podemos dizer que quando algo se manifesta em nosso pensamento, logo, é, em alguma medida. Em outras palavras, possui um modo de ser.

Possuir um modo de ser, implica no pressuposto de que há muitas categorias de existência. Como afirmou Aristóteles: O ser se diz de várias maneiras. Portanto, em ontologia, dizer que algo existe não é apenas no sentido concreto da existência de objetos físicos no mundo.  Uma ideia ou sentimento possui existência e muitas vezes incitam em nós um comportamento, um propósito. Dizemos dessa ideia ou sentimento que ela está instanciada em nossa mente. O metafísico austríaco Alexius Meinong foi além; ele afirmou que é possível até concebermos a existência de objetos contraditórios como, por exemplo, um triângulo quadrado, que por seu turno, teria uma realidade ontológica, isto é, que existiria em alguma medida.

Além do mais, filósofos como David Lewis falam de mundos possíveis cuja objetividade e realidade independe de nós seres humanos. Essa doutrina ganhou o nome de realismo modal ou, como coloca o próprio Lewis, pluralidade dos mundos. Para Lewis, seria perfeitamente possível um mundo onde existissem máquinas conscientes, elfos, porcos voadores, dinossauros inteligentes entre tantas outras coisas extraordinárias para o ponto de vista de nossa atual configuração de universo. Mundos possíveis existem da mesma forma que o nosso mundo existe, não havendo nada de ontologicamente especial em suas configurações. Portanto, de acordo com Lewis, assim como o nosso mundo é real para nós, cada mundo possível também o seria para os seus habitantes. Todavia, esses mundos não compartilham do nosso universo, por mais vasto que este possa ser. Eles são isolados, sem nenhum tipo de relações espaço-temporais e causais com o nosso mundo.

Por outro lado, filósofos como Saul Kripke vão propor uma teoria modal de mundos possíveis mais pé no chão. Para Kripke, mundos possíveis só poderiam existir como ramificações em referência ao nosso próprio mundo. Poderia ser o caso, por exemplo, de uma configuração de mundo onde o Brasil tivesse sido colonizado pelos espanhóis. Poderíamos também, ao estilo de Philip K. Dick, imaginarmos um mundo possível em que a Alemanha e seus aliados tivessem ganhado a segunda guerra e que, ao invés de uma guerra fria entre EUA e URSS, existisse um mundo atual em que a verdadeira guerra fria tivesse ocorrido entre Alemanha e Japão. Portanto, em Kripke, a semântica dos mundos possíveis não é algo que se diferencia essencialmente da nossa atual configuração de mundo. Muito pelo contrário, ela apenas abre a possibilidade de reordenar seus eventos levando em conta aquilo que é contingente (i.e., das coisas que poderiam ser diferentes) e aquilo que é necessário (i.e., das coisas que não poderiam ser diferentes) nos objetos que formam as diversas combinações que compõem o nosso universo.

E quando falamos de objetos perceptíveis no mundo natural cuja a existência depende de outra existência? A dependência ontológica nesse caso não é do tipo lógico-causal que encerra propriedades físicas autônomas. A isso os filósofos chamaram de ontologia parasitária. Exemplos de ontologia parasitária são “sombras”, “reflexos de espelho” e “buracos”. No que concerne ao fato bruto de existir, isto é, de ser alguma coisa no mundo, nós seres humanos e outras espécies, possuímos um modo de existência que em algum momento inicial dependeu exclusivamente de nossos genitores. Apesar disso, podemos afirmar acerca da nossa existência que ela passar a ser autônoma, não precisaríamos, a princípio, de outrem para ser no mundo. Em outras palavras, nossa constituição possui suas próprias propriedades ontológicas de tal modo que não precisamos mais de nossos genitores para existir. Mas no caso de sombras, reflexos em espelho e buracos, não é assim que funciona.

Sombras, reflexos em espelho e buracos tomam sua existência emprestada de outras formas de existência. Isso significa dizer que seus modos de existência estão intrinsecamente ligados a outros modos de existência e isso de tal forma que sem a existência de um não é possível conceber a existência do outro. Uma sombra, por exemplo, é um fenômeno que pode ser definido como uma extensão sob a qual a luz não incide diretamente. Sua existência está ligada ao objeto que interceptou a passagem direta da luz. Uma pedra que bloqueia a passagem de um raio de sol projeta uma sombra no mundo natural. Poderíamos nos perguntar: quais as propriedades físicas de uma sombra? Uma sombra não é dotada de substância da mesma forma que a pedra que acidentalmente a projeta, no entanto, percebemos sombras o tempo todo. É a partir disso que os filósofos afirmam que sua ontologia, ou seja, seu modo de ser, é parasitário de outro modo de ser.  

Algo muito semelhante acontece com os objetos refletidos no espelho. As imagens ali refletidas não possuem substância alguma, mas devem sua existência a outros elementos que possibilitam a existência de imagens através do espelhamento. No que diz respeito aos buracos, temos outro caso que desafia nossas concepções metafísicas de existência. Como definimos um buraco? Pela extensão de vazio que ele comporta? Pelas cercanias e pelo tipo de material que o delimita? Prima facie, um buraco parece ser algo imaterial que depende de um hospedeiro material. Os buracos que encontramos no queijo suíço não possuem existência isoladamente, sendo, portanto, sua existência exclusivamente dependente do queijo em si. Da mesma forma que sombras e imagens refletidas em espelhos, nós percebemos buracos de todo tipo, alguns até evitamos quando estamos dirigindo. Ninguém tem dúvidas quanto à sua existência, as dúvidas surgem quando refletimos sobre sua constituição ontológica, ou seja, sobre suas propriedades e modos de ser no mundo natural.   

A questão metafísica em torno da existência suscita muitos problemas, por isso, está longe de ser resolvida. Ela continuará nos fascinando assim como outras inúmeras questões filosóficas. A pergunta “Por que existe algo ao invés de não existir nada?” mantém sua relevância até os dias atuais. Nesse sentido, sempre haverá espaço para o debate filosófico acerca da existência.

João Paulo M. de Araujo

Professor do curso de filosofia da UERR

Um abração com a coincidência

Afonso Rodrigues de Oliveira

“Quem caminha em passos rápidos

Nunca consegue medir

O tempo do espaço”.

(Roberta Cruz)

O domingo amanheceu gostosinho e o vento mexia muito com as árvores. Adorei, e fui até à estante e peguei o livro, “Um tom para a poesia”, da Roberta Cruz. Sentei-me e iniciei a leitura gostosa nos versos gostosos. Na felicidade comecei a escolha de um, para meu tema de hoje. Marquei a página e continuei a leitura. Mas a cada página eu encontrava o ideal para o assunto de hoje. Até que já no final do livro deparei-me com dois temos que caíram exatamente no meu pensamento. O primeiro foi o que está aí encima. O segundo encantou-me, por estar dentro dos meus pensamentos em relação à convivência: “Não se pode discutir o tempo

                       No máximo ver as horas

                       E pensar em alguma boa proposta”.

Mas antes de iniciar meu trabalho, abro a página de “Opinião”, para ver quais matérias estão expostas. E você não imagina a rizada que dei quando a primeira matéria do dia era exatamente da queridíssima Roberta Cruz. A coincidência bateu forte. Emocionei-me. Um abração do tamanho do mundo, pra você. Você nem imagina o bem que me fez, no início de um dia gosto de se viver. Então vamos viver este dia como ele deve ser vivido. Com muita alegria e felicidade por termos um mundo onde ainda podemos viver racionalmente. E seus versos nos traz o caminho aberto para a felicidade.

Vamos cultivar o máximo de amizades que pudermos fazer. São elas que nos faz o que somos. São as boas amizades que nos enriquecem o pensamento. E somos o que pensamos. Não importa o que acontece pelo mundo, se não nos interessam os acontecimentos. Somos donos e responsáveis por nós mesmos. A alegria pode surgir num momento inesperado, por mais simples que ele seja. Tudo depende da semente que plantamos para colhermos no futuro. O Rui Barbosa já disse: “Há os que plantam a alface para o prato de hoje; e os que plantam o carvalho para a sombra de amanhã”.

Cada vez que me encontro com um dos amigos que fiz em Boa Vista, sinto-me como se estivesse sendo beneficiado pelo destino. A Roberta Cruz, na sua matéria no Jornal de ontem me fez muito feliz. Ela me trouxe uma quantidade enorme de coincidências. Uma delas é uma lista de nomes que tenho anotados aqui, de pessoas com as quais desejo me encontrar: Alex Pizano; Tiago Briglia; Elena Fiorett; Samara Diniz, e tantos outros amigos que estão anotados aqui e os encontrarei, para matar saudades de não tão velhos tempos. Com certeza nos encontraremos tão logo nos libertem das máscaras do fantasma pandemia-mascarada. Pense nisso.

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