Deus e o Mal
João Paulo M. Araujo
Professor do curso de filosofia da UERR
Qualquer pessoa seja ela teísta, ateu ou agnóstico, já deve ter refletido em alguma medida sobre o problema do mal no mundo. Afinal, todos dias, basta abrir qualquer página ou canal de noticiário para nos depararmos com incontáveis mazelas e tragédias que se afiguram diante da condição humana e de todos os outros seres sencientes dotados de sistema nervoso central. O mal nesse primeiro sentido parece ser um fato consumado, algo dotado de carne ontológica que se traduz em catástrofes naturais ou ações morais mal-intencionadas. Costumamos dizer de uma pessoa que ela fez um mal para outra pessoa. Da mesma forma é comum utilizarmos a palavra ‘mal’ para afirmações do tipo, ‘o alagamento de certos bairros da cidade fez mal para os moradores’ ou ‘o veneno do escorpião fez mal para aquela criança’, ‘os carrapatos estão fazendo mal ao cachorro’ etc. Mas o que significa dizer que alguma coisa é má? Seria o mal para além de nossas expressões linguísticas algo substancial? Em outras palavras, existe o mal em si mesmo? Essa questão não é fácil de responder, pois numa primeira análise ela se revela como algo de ordenamento relativo, e numa segunda análise, aponta para algo profundamente metafisico. Portanto, dada as dificuldades, assim como o ‘bem’ na meta-ética de George Moore (1903) seria o ‘mal’ indefinível?
Se voltarmos um pouco nos séculos, perceberemos que o mal ganhou muitas definições e usos dentro da filosofia e da teologia. Todavia, independente de como concebemos a palavra ‘mal’, o mal em si, não é um problema filosófico, talvez apenas um problema semântico. Ele se torna um problema filosófico quando outro elemento entra em cena: Deus. Da mesma forma que a palavra ‘mal’, a palavra ‘Deus’ também enfrenta um problema definicional, sendo, portanto, usada com uma ampla variedade de significados diferentes dada a miríade de religiões que existem no mundo. Grosso modo, podemos categorizar o conceito de Deus em ao menos duas grandes instâncias ou grupos, um filosófico/metafísico e outro religioso. No primeiro grupo, isto é, na instância filosófico/metafísico classificaríamos ou interpretaríamos Deus como: primeiro motor, causa primeira, substância supra-sensível, Ser necessário que tem seu fundamento em si mesmo, um ser cuja a essência é idêntica a existência, uma realidade última na qual nenhum conceito se aplica verdadeiramente etc. Por outro lado, na perspectiva religiosa, o termo ‘Deus’ é conectado de forma clara e relativamente direta com algumas atitudes religiosas tais como: culto, desejo de que o bem triunfe, que a justiça (divina) seja feita, Deus proverá, que o mundo não seja aquele que a morte marque o fim da existência do indivíduo etc.
A partir da noção de Deus entendido sob a égide de uma perspectiva religiosa podemos formular a seguinte questão: Que propriedades Deus deve ter para ser um objeto apropriado de adoração fornecendo razão para pensar que há uma chance razoável de que os desejos humanos (ou atitudes religiosas) fundamentais acima mencionadas, sejam satisfeitos? Só há uma maneira de responder positivamente a essa questão, caracterizando Deus como sendo dotado de certos atributos e propriedades. Deus teria que ser onipotente (tudo pode), onisciente (tudo sabe) e onibenevolente (moralmente perfeito e bondoso). Somente quando definimos Deus dentro dessas categorias é que podemos vislumbrar o problema do mal dentro da perspectiva filosófica. Portanto, o problema do mal consiste em compatibilizar a existência de um Deus onipotente, onisciente e onibenevolente com a existência do mal no mundo. Em outras palavras, se este ser dotado com esses três grandes atributos existe, então, parece no mínimo intrigante porque existem vários males, pois, muitos dos estados de coisas indesejáveis que o mundo contém poderiam ser eliminados ou evitados. Por que, então, existem tais estados de coisas indesejáveis se existe um ser que é muito poderoso, que sabe tudo e é moralmente perfeito?
A primeira formulação de um argumento de incompatibilidade foi feita há mais de dois mil anos por Epicuro de Samos. Todavia, seguindo o esquema de Michael Tooley (2015;2019) podemos elaborar uma versão mais contemporânea do argumento da seguinte forma:
[1] Se Deus existe, então Deus é onipotente, onisciente e moralmente perfeito.
[2] Se Deus é onipotente, então Deus tem o poder de eliminar todo o mal.
[3] Se Deus é onisciente, então Deus sabe quando o mal existe.
[4] Se Deus é moralmente perfeito, então Deus tem o desejo de eliminar todo o mal.
[5] O mal existe.
[6] Se o mal existe e Deus existe, então ou Deus não tem o poder de eliminar todo o mal, ou não sabe quando o mal existe, ou não tem o desejo de eliminar todo o mal.
[7] Portanto, Deus não existe.
Esse tipo de argumento se configura como um argumento ateológico que objetiva mostrar a incompatibilidade da existência simultânea de Deus e do mal simplesmente constatando que se o mal existe, um Deus dotado de tais atributos não poderia existir. Na tradição filosófica, sobretudo, a partir da idade média houve um esforço por parte dos filósofos de oferecer uma resposta mais adequada para o problema do mal como fora apresentado acima. Essas tentativas de conciliar a existência de Deus com as mazelas da humanidade ficaram conhecidas como teodiceias. De acordo com John Milton poeta inglês do século XVII e autor do clássico Paraíso Perdido (1667), uma teodiceia pode ser entendida como “a tentativa de justificar os caminhos de Deus para os homens”. Na história da filosofia, duas respostas paradigmáticas são as de Santo Agostinho e Leibniz.
Santo Agostinho de Hipona em sua obra O livre-arbítrio (395) argumentou que o mal metafísico (ou o mal em si mesmo) não existe verdadeiramente porque seria incompatível com a existência de Deus que é bom e perfeito. Aqui temos um tipo de argumento da incompatibilidade às avessas, pois, ao invés de negar a existência de Deus, nega-se a existência do mal. Mas como isso é possível? A ideia é que Deus é essencialmente bom e sendo bom criou o mundo que, por seu turno, não é completamente bom uma vez que o bem completo e perfeito só existem em Deus. O mundo e tudo o que contém nele é imperfeito e corruptível. A resposta de Agostinho para o mal se desenrola através da ideia de que o livre-arbítrio seria a causa do que comumente chamamos de mal, nesse caso em particular, de um mal moral. Mas esse mal moral não é o mal em si mesmo. Reafirmando o que fora dito acima, o mal não possui existência real, para Agostinho, ele é apenas ausência de bem, assim como a escuridão é ausência de luz.
Leibniz em sua obra Teodiceia (1710) também ofereceu uma resposta para o problema do mal. Para Leibniz, Deus sendo bom e moralmente perfeito, criou o melhor dos mundos possíveis através de uma harmonia pré-estabelecida. Segundo Leibniz, quando nós humanos observamos as mazelas do mundo na verdade o que vemos é algo ínfimo diante do todo grandioso da criação divina. Nossa mente e percepção são limitadas se considerarmos a mente e percepção de Deus; nós vemos apenas aspectos particionados da realidade enquanto que Deus contempla a realidade em sua totalidade. Portanto, quando observamos ações morais que consideramos más ou até mesmo catástrofes naturais estamos nos apegando
a uma ínfima parte do todo. Em sua teodiceia há uma famosa passagem em que Leibniz afirma que “imperfeição da parte (o ínfimo mal que nossa mente limitada contempla) não altera a perfeição do todo (Deus em sua perfeita bondade).”
Voltando para os argumentos de incompatibilidade e tomando como exemplo o argumento de Tooley (2015;2019) a pouco citado, vale ressaltar que via de regra, argumentos de incompatibilidade são argumento dedutivos, onde concluímos apenas o que já está dado nas premissas. Um exemplo de argumento dedutivo bastante famoso na filosofia medieval é o argumento ontológico de Santo Anselmo na qual ele ‘prova’ a existência de Deus. Entretanto, existe uma outra forma de argumento que questiona a compatibilidade da existência de Deus com a existência do mal apenas usando a indução. Nesses argumentos indutivos temos uma afirmação mais modesta de que existem males no mundo que tornam impossível (ou improvável) que Deus exista. Um clássico proponente desse tipo de argumento foi David Hume, todavia, seu argumento é caracterizado como uma indução indireta. Ele sustentou que não é possível chegar a uma conclusão de que o mundo tinha uma causa perfeitamente boa ou perfeitamente má partindo simplesmente de um mundo que consiste numa mistura de estados de coisas boas e ruins. Em seu Dialogues Concerning Natural Religion (1779) Hume afirmou:
Podem ser formuladas quatro hipóteses sobre as primeiras causas do universo:(1) Que são dotadas de perfeita bondade, (2) que são dotadas de perfeita malícia, (3) que são opostas e têm bondade e malícia, (4) que não têm nem bondade nem malícia. Os fenômenos mistos nunca podem provar os dois primeiros princípios não misturados. E a uniformidade e a firmeza das leis gerais parecem se opor à terceira. A quarta, portanto, parece de longe a mais provável. (1779, XI, 212).
A ideia de Hume é apontar para alguma proposição que seja logicamente incompatível com o teísmo e então argumentar que, dado os estados de coisas indesejáveis que podem ser encontrados no mundo, essa hipótese é mais provável que o teísmo e, portanto, é mais provável que o teísmo seja falso do que verdadeiro. Mais de dois séculos mais tarde, Paul Draper (1996) inspirado por Hume, também defendeu esse tipo de argumento indutivo indireto. Seu argumento ficou conhecido como a hipótese da indiferença na qual afirmava que nem a natureza nem a condição dos seres sencientes na terra é o resultado de ações benevolentes ou malévolas realizadas por pessoas não humanas. No geral, as versões dos argumentos muitas vezes diferem de forma bastante significativa em relação ao que é um fato relevante acerca do mal no mundo. As vezes como na premissa ‘(5) O mal existe’ o apelo é para a mera existência de qualquer mal. Por outro lado, às vezes, o apelo é para a existência de uma certa quantidade de mal ou mal específico. Com isso podemos perceber que o problema do mal também enfrenta uma questão demarcatória onde proposições mais gerais e, portanto, abstratas, concorrem com proposições mais concretas e particulares sobre o mal no mundo. Por fim, vale ressaltar que o problema do mal não é algo resolvido na filosofia e contemporaneamente vários autores concorrem em seus argumentos, discutindo tanto a compatibilidade quando a incompatibilidade da existência de Deus e do mal simultaneamente.
Vamos preservar
Afonso Rodrigues de Oliveira
“Se as cidades forem destruídas e os campos forem conservados, as cidades ressurgirão, mas se se queimarem os campos e conservarem as cidades estas não sobreviverão”. (Benjamin Franklin)
Mesmo depois de dois séculos do alerta do Franklin, continuamos destruindo campos, construindo e reconstruindo cidades. E nem percebemos por que elas se destroem. Basta chover o suficiente para reativar o campo, para as cidades mergulharem nas águas das chuvas. E se esse papo lhe parecer fútil ou infantil, corta erra. A verdade é que ficamos o tempo todo nos aterrorizando com notícias sobre alagamentos ou coisas assim. Não paramos para pensar no que realmente somos. E continuamos permitindo que os outros digam o que somos e para onde irmos.
Recentemente ouvimos, pela televisão, um famoso cientista falando sobre o equívoco sobre as mudanças climáticas. Só que ele foi criterioso no falar. Por exemplo: quando ele tocou no assunto dilúvio, disse apenas: “…só se for no segundo dilúvio”. Ele foi tão legal que abriu um sorrisinho maroto, sobre o dilúvio. Minhas conversas são comuns, e não têm nada de ciência. Só digo o que penso. Mas vamos dizer. Já que não tenho que falar como um cientista.
A Astrologia Espacial nos diz que não sabemos quantos dilúvios já tivemos sobre a Terra. No que eu assino embaixo. E para haver um dilúvio tem que haver mudanças sobre o planeta. E se formos mais criteriosos no pensar, não ficaremos presos ao que dizem, há milênios e milênios, sobre os acontecimentos globais. Porque eles são naturais e fazem parte do desenvolvimento da Terra. E ela vive num constante e eterno desenvolvimento. O que nós, seres humanos, parceiros desse desenvolvimento, não somos capazes para acompanhar a evolução. E por isso ficamos séculos e séculos sofrendo os “horrores” das enchentes. Simples pra dedéu.
Na verdade, somos educados para conviver com o ser humano, mas não para com a Natureza. Adoramos uma praia gostosa, mas ficamos o tempo todo sujando o mar, com garrafas de plástico, sacolinhas e tudo mais. Enquanto lá na floresta estão derrubando árvores que nos protegem, para comercialização irregular. E o pior é que não temos a menor ideia de se um dia acordaremos para isso. Quando será que iremos ser dignos da Natureza que temos e não sabemos vivê-la. Vamos acordar e perceber que cada um de nós, seres humanos, é responsável pela nossa evolução. Deus já nos deu o poder que necessitamos, e não sabemos, para salvar o mundo. Não adianta ficar pedindo a Ele. Pense nisso.
99121-1460