A meditação epicurista da morte
João Paulo M. Araujo
Professor de filosofia da UERR
Todo ser humano, ao tomar consciência de sua finitude já elaborou em algum grau, uma reflexão sobre a morte, isto é, considerações sobre o que é morrer e se devemos temer nosso fim. Muitas vezes nossas visões são condicionadas por alguma religião que tenta apaziguar nosso medo da morte com o discurso que na maioria das vezes tem como pretensão garantir nossa identidade pessoal para além do mundo sensível. Até mesmo na filosofia, pensadores como Pitágoras e Platão propuseram uma defesa da imortalidade da alma que sobreviveria à morte do corpo físico. Todavia, ainda na antiguidade clássica, especificamente no período helênico viveu Epicuro de Samos (341-270 a.C.). Para Platão, o propósito da filosofia é a preparação para a morte. Consequentemente, nossa preparação para a morte era também uma preparação para uma espécie de vida após a morte, algo com que Epicuro não concordava. Na contramão das doutrinas religiosas e metafisico-filosóficas, Epicuro propôs que não temos boas razões para temer a morte e que devemos abandonar nosso medo para viver uma vida feliz.
A morte, ou a consciência de nossa finitude, é o que nos motiva a alcançar nossos objetivos, o que nos ajuda a apreciar nossos entes queridos e a valorizar nossa vida. É nossa trajetória para a morte que muitas vezes nos obriga a considerar como devemos viver e como devemos morrer, eis nossa tarefa moral enquanto entes viventes. Por essa razão, é compreensível nosso medo da morte que comparada com nossa vida, a morte seria um dano, uma privação de uma vida “boa”. Thomas Nagel, em seu livro Mortal Questions (1979) em um capítulo intitulado Death, afirma que “Todos nós, acredito, somos afortunados por termos nascido”. A partir dessa convicção sobre o valor da vida, Nagel constrói um argumento sobre por que a morte é algo de ruim. Nesse mesmo texto, Nagel afirma que “se quisermos entender a visão de que morrer é ruim, devemos tomar como base a ideia de que a vida é um bem e a morte é a privação ou perda correspondente desse bem”. A visão de Nagel é coerente e bastante intuitiva de tal modo que ela pode ser aceita por um grande número de pessoas. Por outro lado, como veremos adiante, Epicuro sustentou uma perspectiva sobre a morte bastante curiosa e talvez até contra intuitiva se considerarmos o que a maioria das pessoas pensam sobre o morrer.
Primeiramente devemos esclarecer alguns pontos do pensamento de Epicuro. Influenciado pelos atomistas, ele propôs que o mundo era feito de átomos e que o universo era infinito. Além do mais, em sua visão materialista da realidade, ele rejeitou as alegações de Platão e Pitágoras sobre a vida após a morte, acreditando que a alma morre com o corpo. Em sua escola, conhecida como Jardim (do grego Képos), propôs para seus alunos uma forma de vida na qual deveríamos evitar a dor e buscar o prazer, mas não um prazer meramente hedonista. O mote epicurista segundo a qual deveríamos buscar uma vida prazerosa, foi amplamente rejeitada pelos estóicos, que achavam que seu modo de vida era mais uma forma degenerada de filosofia, algo parecido com o que pensavam dos cínicos. Mas essa interpretação estóica não refletia precisamente a visão de Epicuro. Ele propôs que o prazer, definido como ausência de dor e perturbação mental, era o objetivo da vida feliz. Contudo, para atingir esse objetivo precisávamos nos livrar do medo, especialmente do medo da morte. Dessa forma, Epicuro acreditava que nosso medo da morte é o pior medo que enfrentamos na vida porque permeia nossos pensamentos enquanto estamos vivos. De acordo com Epicuro, nosso medo da morte nos impede de viver. Portanto, para viver corretamente e feliz, devemos nos livrar do medo da morte. Mas como podemos fazer isso?
A passagem mais icônica da reflexão de Epicuro sobre a morte se encontra na famosa Carta a Meneceu. Nela podemos ler a seguinte passagem: “Acostuma-te à ideia de que a morte para nós não é nada, visto que todo o bem e todo o mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações”. Para Epicuro, a consciência de que a morte nada é para nós pode nos proporcionar uma melhor relação com a nossa finitude, nossa transitoriedade, eliminando em nós o ingênuo desejo de imortalidade. É nesse sentido que, para Epicuro, o nosso medo da morte é algo de ordem irracional, nossas emoções típicas sobre a morte estão na contramão de uma vida feliz. Epicuro considera tolo quem afirma ter medo da morte, dado que ela não pode nos trazer sofrimento; se há sofrimento, este reside na angústia ou aflição em esperar pela própria morte. Se algo não está dado em nossas sensações não deveria nos afligir enquanto está sendo esperado, contudo, sofremos por antecipação acreditando numa falsa substancialidade de que algo que não é enquanto somos. Ainda na carta a Meneceu, Epicuro considera o seguinte: “Então, o mais terrível de todos os males, a morte, não significa nada para nós, justamente porque, quando estamos vivos, é a morte que não está presente; ao contrário, quando a morte está presente, nós é que não estamos”. Seguindo a linha de raciocínio de Epicuro, para aqueles que ficam e para aqueles que vão, a morte não é nada, não possui existência real. Talvez o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein tivesse pensado nisso quando em seu Tractatus (6.4311) afirmou que “A morte não é um evento da vida. A morte não se vive”. No sentido epicurista, a morte não é um evento da vida, nem para os vivos nem para os mortos, tampouco, pode ser considerado algo do além vida, visto que carecemos de critérios de verificação para tal.
No entanto, Epicuro notou que “a maioria das pessoas ora foge da morte como se fosse o maior dos males, ora a deseja como descanso dos males da vida”. Aqueles fogem da morte como se fosse o maior dos males toma a vida como um grande bem e a morte uma privação desse bem, como descrito acima pela posição de Thomas Nagel. Por outro lado, aqueles que desejam a morte como um descanso dos males da vida entende que, em parte, a vida é sofrimento e que a morte seria ausência desse sofrimento. Entretanto, quando refletimos sobre a morte e nos apegamos a concepções metafísicas de uma existência post mortem, ou até mesmo de um nada absoluto, parece que em ambos os casos nossa principal aflição é com a possibilidade de erradicação total de nossa identidade pessoal. Mas uma coisa é certa, o nosso medo da morte está intimamente relacionado à nossa consciência da morte. Claro que se trata de um truísmo, se não há consciência não há medo. Todavia, um elemento adicional deve ser acrescentado nessa caracterização: o tempo. Só podemos nos angustiar com a morte se estamos conscientes da passagem do tempo, isto é, de um momento em que (1) não existíamos, porque não tínhamos nascido, (2) um momento onde passamos a existir e que, portanto, passamos a ser conscientes de nossa existência juntamente com a implicação de temporalidade e (3) de um momento em que não mais existiremos enquanto seres sencientes.
Dessa forma, podemos aqui lançar mão da seguinte pergunta: por que nos angustiamos com o que pode acontecer conosco ao morrermos, mas não nos angustiamos com o não ser de antes de existirmos? Nós existimos num ponto que fica entre o não ser de antes do nosso nascimento e o não ser depois da nossa morte. Uma evidente resposta para a razão dessa angústia é que a flecha do tempo segue sempre numa única direção. Mas e se não fosse e
sse o caso? Vamos supor uma experiência de pensamento na qual ao chegarmos num ponto que marcaria metade de nossa existência a flecha do tempo (para nosso caso particular) começasse a regredir, isto é, ao invés de envelhecermos começássemos a rejuvenescer de tal modo que o destino final e natural seria o não ser de antes do nascimento. Aqui cabe pergunta: nos angustiaríamos da mesma forma que nos angustiamos com a aproximação ou iminência de nossa morte? No caso desse experimento de pensamento, experimentaríamos uma erradicação da nossa existência, mas de uma forma que não podemos identificar com aquilo que chamamos de morte? Ou seria também um tipo de morte? Se o critério for a consciência da passagem do tempo, de que agora somos, mas que em breve deixaremos de ser, então, o mesmo se aplica para esse experimento de pensamento. Da mesma forma que o pensamento de Epicuro sobre a morte, o não ser do antes de existirmos também nada é para nós e seria tolo nos afligirmos com tal eventualidade.
Parece que o ponto principal não é o que chamamos de morte, mas sim as relações entre o ser e o não ser da unidade de nossa identidade pessoal. Porque para além da própria morte, outras coisas podem nos acontecer de tal modo que podemos perder nossa consciência de quem somos e das coisas ao nosso redor, basta pensarmos nos casos de pessoas que estão em coma profundo. Ninguém é obrigado a cultivar uma postura de ataraxia (tranquilidade) diante da morte, na verdade, em termos práticos isso não é uma tarefa das mais fáceis. Dessa forma, poderia haver uma maneira de não gostar da morte e ainda não temê-la? Poderíamos aceitar a morte de uma forma que nos permita viver uma vida feliz e plena? Isso cabe apenas a nós determinar, afinal cada um de nós é responsável por construir um sentido para a nossa existência e, consequentemente, refletir sobre nossa própria finitude. Entretanto, se levarmos Epicuro minimamente à sério, veremos que a sabedoria de vida consiste não em um desdém da vida (não se trata de uma total indiferença) nem tampouco temer a morte, em outras palavras, viver não pode ser um fardo e morrer não é de todo um mal.
A grande máquina
Afonso Rodrigues de Oliveira
“Há uma só máquina gigantesca operada por pigmeus: é a burocracia”. (Arthur Schopenhauer)
Você já viveu algum momento de ansiedade, angústia ou coisa assim, por conta da burocracia? Todos nós já tivemos esse desprazer. Já tivemos até uma época em que o governo tentou criar um ministério da burocracia. (Assim mesmo, com letras minúsculas, porque foi o que aconteceu). A coisa mais difícil para o ser humano, é lidar com a ineficiência administrativa. E isso porque a única saída para o engodo, é a educação.
Mas vamos ser comedidos. Vamos fazer nossa parte, como ela deve ser feita. O que torna o problema maior. Estamos chegando ao momento mais precioso para a luta, que são as eleições. E você está preparado para ela? Ou ainda está se apoquentando com assuntos fúteis sobre os desmandos da política? Porque ainda não entendemos que política não tem desmandos. Os desmandos vêm do despreparo dos “políticos” e não da política.
Vamos deixar as críticas no fundo do baú, e vamos refletir sobre nossa responsabilidade sobre a política. Sabemos que ainda temos bons políticas no Brasil, e em todos Estados. Mas ainda não sabemos distingui-los dos maus políticos. E enquanto não aprendermos, não sairemos do círculo de elefantes de circo. Porque se você prestar bem atenção verá que somos como os elefantes. Os elefantes criam-se presos a cordas simples, para continuarem presos, no circo, sem saberem que poderiam romper a corda, se soubessem que poderiam. O brasileiro vive preso à corda da ignorância política, sem saber que se livraria, se soubesse que pode.
Vamos refletir um pouco sobre essa simplicidade. Precisamos entender mais de política para poder vivê-la civilizadamente, como cidadãos. E é simples pra dedéu. Que educador já falou para você que não existe cidadania com obrigatoriedade? A maioria deles não sabe. E se não sabe como ensinar? E se não nos ensinam não aprendemos. E continuamos sem saber que não seremos cidadãos enquanto formos obrigados a votar. Mas também não sabemos que não há faculdade no voto, sem educação. Que teremos que nos educarmos para que possamos viver a cidadania do voto facultativo.
Sei que não há mais tempo para discutirmos isso, no âmbito político. Mas sei que se nos prepararmos para as próximas eleições, já estaremos dando um passo positivo para melhorar nossa política, para que não continuemos marionetes de espertalhões que ainda veem a política como a maior fonte de riqueza. E ainda são a maioria, os que estão apertando sua mão, para conquistar seu voto. Vamos amadurecer e iniciar nossa luta pacífica pela nossa educação. Pense nisso.
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