Opinião

Opiniao 15200

Sedevacantismo a Pretexto da Sabotagem Constitucional

O enredo dos atos radicais realizados recentemente nas sedes dos Poderes da República vem sendo germinado há muito tempo com sementes do fanatismo ideológico, que se consolidou em aceitar apenas seu “mito” como ente legítimo e divino a representar o país. Foi um ato ultrajante que nos envergonhou perante o mundo.

Evidentemente que essa tragédia foi alimentada pelas lideranças sociais e políticas – ativa e omissivamente -, que subverteram o direito fundamental de manifestação à vandalização do regime democrático. O código-fonte da ala mais extremista foi disponibilizado pelo alarde de fraude eleitoral, arquitetado durante todo o mandato do ex-presidente que, a pretexto de descredibilizar o sistema eleitoral que o elegeu, antecipou sua derrota como resultado inaceitável nas eleições.

A concepção de sedevacantismo é própria da estrutura religiosa de poder, que reside, em resumo, numa posição teológica dentro do catolicismo tradicionalista que defende que a Santa Sé está vaga e que o Papa é, na realidade, um impostor. Para os saqueadores da democracia brasileira, a chefia da República está vaga enquanto Jair Messias Bolsonaro não tomar seu posto.

Atrelado a isso, vieram os bloqueios de rodovias e a incitação em frente aos quartéis para que as Forças Armadas promovessem algum tipo de sabotagem constitucional, chegando-se à absurda falácia de acionamento do art. 142 da Lei Fundamental de 1988.  

Os sabotadores do regime democrático permaneceram como cepas virais, circulando amplamente e causando infecções, passando a se alimentarem do sentimento de vandalismo típico daqueles que desprezam a democracia. Seus exemplos internacionais são evidentes e compartilham do mesmo ideal, como elementarmente proclamou Donald Trump ao dizer que uma fraude – sem provas – “permite o cancelamento de todas as regras, regulamentos e artigos, mesmo aqueles encontrados na Constituição.” (BUMP, Philip. Trump’s call to set aside the Constitution raises a question: Why now?. The Washington Post, 2022).

É preciso entender que o fanatismo se alimenta da insanidade, sendo este tipo de dominação capaz de abonar ou legitimar qualquer situação, por mais absurda que seja. É nesse ponto que os cupins da Democracia não podem ser considerados sócios ou beneficiários da omissão, descaso e da inércia daqueles que deveriam zelar pela integridade do patrimônio coletivo.

A Lei Fundamental, sedimentada no ideal dos pais fundadores, preconizou que Supremo é o povo e, nos seus exatos termos, impôs que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos […]”. Foi prestando continência aos Constituintes que no dia 30 de outubro de 2022 a maioria do povo externou sua supremacia.

É sob essa premissa que se corporifica aquilo que Abrahan Lincoln já alertava em 1838, em seu discurso diante do Liceu dos Rapazes de Springfield, Illinois, no sentido de educar sobre os assuntos do dia e compreender a importância de preservar nossas instituições políticas. Bernstein rememora que Lincoln enaltece “o estado de direito, das ameaças a este e da necessidade de preservá-lo” (2020, p. 23).

Apesar de aparentemente ultrapassado o terror vivenciado na capital federal, não podemos esquecer que a conclusão do bolsonarismo, ainda alimentado por seus financiadores intelectuais e econômicos, é de que não há resposta satisfatória à República se não jogar fora o sistema brasileiro e instalar o mito-supremo como líder mais uma vez.

Referências

BERNSTEIN. R. B. Abraham Lincoln. Escritos e Reflexões. 2020, p. 23.

https://www.washingtonpost.com/politics/2022/12/05/trump-constitution-2020-election-hunter-biden/

Herick Feijó Mendes é advogado, mestrando em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos (UERR), especialista em Direito Público, ex-membro da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais (CFOAB).

O ataque dos cães raivosos sob ordens veladas

Sebastião Pereira do Nascimento

Trinta e quatro anos após o fim da ditadura militar, o Brasil, em plena democracia, é atingido mais uma vez por uma violação democrática de alta intensidade. Por trás de tudo isso, há um tumultuado e orquestrado “movimento” sendo construído há pelo menos quatro (2019 – 2022), período do desgoverno de Jair Bolsonaro, sendo o ex-presidente o principal mentor dessa organização criminosa que culminou com os atos terroristas sem precedentes às sedes dos três poderes (Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal) no último dia 08 em Brasília exatamente um ano após a tentativa de golpe de Estado em Washington (EUA) com o ataque ao capitólio em 06 de janeiro de 2021.

Esse ataque em Brasília, sugere uma narrativa de que Bolsonaro, não conseguindo colocar em prática seu intento de levar o Brasil de volta a uma ditadura, ainda que tenha tentado por diversas vezes durante os quatro anos como presidente do país. Assim, após a derrota nos dois turnos das eleições para Luís Inácio Lula da Silva, Bolsonaro, não achando medidas legais para contrapor as eleições, decidiu fugir do Brasil, no intuito de continuar dando vazão extremista aos seus cães raivosos, na tentativa de colocar em prática sua agenda golpista. Portanto, com a anuência de Bolsonaro, e a conduta omissiva ou o apoio direto de agentes públicos (adeptos do bolsonarismo), os cães raivosos intentaram consolidar o que Bolsonaro sempre desejou, o caos ditatorial.

Quanto ao ataque, a responsabilização recai também sobre alguns congressistas extremistas, além de alguns setores das Forças Armadas lenientes ou omissos à atitudes golpistas. Até mesmo sobre os ombros do procurador-geral da república, Augusto Aras que, ao longo do governo Bolsonaro, foi conivente com os desmandos do ex-presidente — em novembro passado Aras dissolveu todos os grupos especiais das procuradorias da república que atuavam no combate aos atos antidemocráticos, inclusive no Distrito Federal. E até recentemente Aras, de modo consentâneo, afirmava que os manifestantes que se concentravam nas portas dos quartéis e foram às ruas pedir intervenção militar estavam exercendo o direito à livre manifestação.

Na verdade, esses dizeres mascaravam a existência — nos acampamentos sitiados em frente aos quartéis do Exército — de golpistas patrocinados por diversos empresários e financiadores fascistas, além da complacência de autoridades civis e militares em total subversão ao necessário respeito à Constituição Federal, como disse acertadamente o ministro do STE, Alexandre de Morais: “absolutamente nada justifica a omissão e conivência do Secretário de Segurança Pública e do Governador do Distrito Federal com criminosos que, previamente, anunciaram que praticariam atos violentos contra os Poderes constituídos”, concluiu.

A responsabilização dos ataques em Brasília recai ainda sobre alguns elementos do novo governo como, por exemplo, o ministro da Defesa José Múcio, que fez uma avaliação absolutamente equivocada em relação aos manifestantes que passaram meses em frente aos quartéis. Podemos dizer também da falha grotesca do Gabinete Segurança Institucional (responsável pela proteção da área de segurança interna do Planalto), chefiado pelo general da reserva Gonçalves Dias, que apesar de ter sido comunicado pela Abin, do risco de atentado terrorista, não tomou as providências inescusáveis. Tudo isso leva à conjectura de que houve falhas no sistema de monitoramento de inteligência ou algo proposital em estreita congruência com os golpistas incumbidos dos atos terroristas em Brasília.

Como amplamente divulgado pela imprensa, boa parte dos golpistas que estavam acampados nas áreas dos quartéis do Exército, ou mesmo aqueles que passavam os dias lá, era composta de militares reformados e parentes de militares da ativa, assim como familiares de muitos agentes públicos. Esse fato explica o porquê do Exército agir de modo corporativo, não querendo tomar qualquer atitude contra as pessoas que, de algum modo, lhe são próximas. Isso vem confirmar também que os usurpadores da democracia só levaram a efeito suas barbáries pelo fato de ter o conluio de elementos ligados a setores estratégicos (públicos e privados) e orientações silenciosas de apoiadores do ex-presidente estadunidense, Donald Trump. Pois é notório que essa pequena massa de zés manés, desprovida de intelecto e capacidade mental, não tem discernimento para orquestrar ações a despeito dos ataques às maiores instituições democráticas do país. É preciso gente mais “preparada” para dar cabo intelectual de uma ação terrorista de tão magnitude.

Em meio ao atentado democrático, a partir do momento em que as instituições de segurança do governo federal tomaram pé da situação, a partir da forte determinação do presidente da república, Luís Inácio Lula da Silva, em conjunto com os líderes dos poderes judiciário e legislativo, num esforço coletivo no sentido de proteger a democracia das garras da ditadura, foi possível conter a tentativa de golpe. Isso evidencia que a nossa democracia – ainda que vilipendiada por um bando de vândalos de interesses golpistas – está assentada sobre alicerce sólido, com poderes institucionais independentes, mas associados às melhores intenções para o Brasil, sendo essa conciliação, mostrar-se incisiva nas tomadas de decisão em defesa da democracia. Devendo ainda ser de caráter imperecível, uma vez que esse movimento golpista tende a haver desdobramento.

Por outro lado, esse evento terrorista, talvez possa agora convencer aqueles que não estavam convencidos da real intenção dos golpistas, assim como aqueles que deram amparo velado ao movimento. Agora todos devem ser convencidos de que tolerar esses golpistas na frente dos quartéis ou diante de quaisquer tentativas de bloqueios de vias públicas é inaceitável. É urgente que seja garantida a não permanência desses vândalos em qualquer espaço que possam indicar alguma coadunação golpista, respeitando, é claro, o direito de fazerem manifestações democráticas, ainda que sejam pouco capazes. Pois, os cães raivosos dessa associação criminosa são capazes de tudo, menos de levarem as discussões políticas para o campo das ideias.

Com suas ações terroristas, provaram ao mundo que são, na verdade, falsos patriotas, que se apossaram das cores do Brasil, para atentarem contra o que temos de mais significado na vida política e social do país, o inestimável patrimônio de todos os brasi
leiros, as sedes institucionais dos três poderes e uma das mais robustas democracia do mundo
. Quando amanhã esses vândalos olharem para esses significados, será que terão a decência de assumir seus erros e dizer que um dia tentaram destruir o patrimônio nacional e ferir de morte a democracia? Ou será que continuarão indecentes e vazios: pedindo ajuda a extraterrestres, idolatrando ditador/torturadores, tentando fraudar eleições, desacatando à constituição e os poderes constituídos, pedindo intervenção militar na forma de golpe, ameaçando o estado democrático de direito, incitando à prática de crimes, dando mal exemplo à família, etcétera. Sendo tudo isso, claro, em nome de deus?

Esses meliantes patéticos esbravejam ainda que têm medo do comunismo, mas na verdade, eles têm medo mesmo é do progresso social do governo Lula. Eles não aceitam que o negro e o indígena ocupem o mesmo espaço político-econômica que eles; não querem que os pobres usufruem do mesmo espaço ou frequente o mesmo restaurante ou que viagem no mesmo avião; não aceitam que as pessoas tenham seu entendimento de gênero a partir de como elas se reconhecem enquanto pessoa humana; não aceitam que o meio ambiente seja protegido, não consentem voltar à civilização nem a troca do ódio pelo afeto; não admitem trocar suas armas por algo que possa fazer bem à sociedade e, finalmente, eles não querem que a cultura e a educação sejam algo de troca e igualdade social, um instrumento de mudança e propagação do conhecimento que proporciona um estado de consciência própria sobre os mais variados domínios da nossa realidade.

Assim será o governo de Luís Inácio Lula da Silva, diverso e democrático! Portanto, é preciso celebrarmos a democracia, acreditando que esse novo governo de Lula possa trazer de volta todos os valores sociais que o desgoverno fascista usurpou da população brasileira. É preciso celebrarmos os salutares ressignificados como a entrega da faixa presidencial para Lula por representantes do povo. É preciso celebrarmos a volta de Lula. É preciso celebrarmos porque somos feitos de liberdade e de esperança, somos algo maior e mais profundo, no esforço coletivo para proteger o Brasil e a democracia. Somos mais soberanos pela recusa em repetir ciclos históricos nefastos. E foi essa memória ainda fresca da ditadura militar que nos ajudou a negar a reeleição de Bolsonaro e a repelir com veemência a recente tentativa de golpe.

 

* Filósofo

Sei que você sabe

Afonso Rodrigues de Oliveira

“Pena que todas as pessoas que sabem como governar o país estejam ocupadas a dirigir táxis ou cortar cabelos”. (George Burns)

Sei que você sabe como dirigir o país, mas fique na sua. E por favor, não se candidate porque há possibilidade de você ser eleito. Que é o que vem acontecendo com nossa política, há décadas e décadas. Resolvi falar sobre isso porque, pela manhã, meu filho ligou o televisor. O que assistimos no programa nos enjoou. Os comentários mais insignificantes sobre quantas vezes a manicure visitou a primeira-dama; quantas vezes a cabeleireira visitou a primeira dama, e tolices desse porte. Aí imaginei o quanto temos de problemas sérios a resolver no Brasil, e os brasileiros ficam preocupados e gastando tempo e dinheiro, divulgando particularidades que não deveriam ser divulgadas, por não serem os problemas.

Mas, tudo bem. O importante é que acordemos para o problema maior que é a falta de educação. Ainda não prestamos atenção à advertência do Miguel Couto: “No brasil só há um problema nacional: é a educação do povo”. Está repetitivo, sei, mas é a verdade que ignoramos por ignorância. Vamos nos educar para sermos cidadãos de fato. Que somos uma democracia, eu sei. Mas sei que ainda vivemos uma democracia perneta que ainda nos sustenta como um país subdesenvolvido. “Reconhece-se um país subdesenvolvido pelo fato de nele ser a política a maior fonte de riqueza”. (Gaston Bouthoul)

Vamos cuidar de nós para podermos cuidar do nosso País, para que ele cuide de nós, como cidadãos. Porque ainda somos cidadãos de araque, mesmo merecendo o respeito que a cidadania nos garante. Sabemos que o mundo todo nos dá exemplos de como ainda somos atrasados no desenvolvimento cultural. Mas não devemos continuar seguindo exemplos dos que não sabem exemplificar. Não temos por que continuar respeitando os que consideramos civilizados, quando eles é que deveria nos respeitar. E temos tudo para sermos um país desenvolvido. Só nos falta a educação. Vamos nos educar para eliminarmos os balcões de vendas e substituí-los por partidos políticos.

Enquanto os “políticos” continuam ocupando os noticiários com assuntos corriqueiros, a educação continua camuflada, e ninguém fala sobre ela. E os dirigentes continuarão falando do “pãozinho na mesa, o prato no almoço e no jantar e a ajudinha de seiscentos reais”. Coisa de pobre para iludir o pobre. E ninguém diz de onde vem o dinheiro para garantir o pãozinho. Antes das eleições converse com seu candidato e veja se ele está interessado na nossa educação. Porque se você não fizer isso será porque ainda não se educou. Pense nisso.

[email protected]

99121-1460