Opinião

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A cachorrada no shopping para desfrutes dos humanos

Sebastião Pereira do Nascimento

No último sábado, dia 11, um evento (à fantasia) chamado de carnaval para os animais caninos, mostrou o quanto as pessoas — investidas de gestos de exibição e de supremacia humana — estão sujeitas ao especismo.  O evento ocorreu num espaço aberto do Roraima Garden Shopping, com apoio de uma ONG, que se diz “protetora” dos animais e da Unidade de Vigilância e Controle de Zoonoses de Boa Vista. Esta última apenas cumprindo um ritual técnico.

O acontecimento foi uma verdadeira cachorrada, literalmente! Onde, ao invés de os cachorros serem tratados como animais sencientes (como são realmente), foram simplesmente subjugados e submetidos à zombarias. Ali, quem se destacou mesmo foi o especismo das pessoas (donas dos cães), que não revelavam menor constrangimento por estar maltratando um animal apenas pelo bel-prazer de se achar capaz de suplantar um outro ser vivo. Ali, os cachorros não eram os mais importantes, mas sim as donas ou os donos dos animais, os quais se utilizam de argumentos controversos para validar o domínio de uma espécie animal sobre outra. Argumentos elaborados a partir do ponto de vista de que uma espécie pode achar que tem todo o direito de explorar, maltratar e exterminar a outra espécie por considerá-la inferior.

O termo especismo — similar ao racismo, sexismo, heterossexismo e outros tipos de preconceito — foi criado pelo psicólogo inglês Richard Ryder, em 1970, com o intuito de exprimir a desapreço que existe com relação aos animais não humanos baseado em diferentes aspectos que vão desde o direito de propriedade ou posse ao maltrato, exploração e abate dos animais.

Mesmo sabendo que é animal humano ligado a todos os outros animais através da evolução, o sujeito especista acredita que a vida de um ser humano, pelo simples fato de pertencer à espécie humana, tem mais importância e mais peso do que a vida de qualquer outro animal.

Para o filósofo Peter Singer, no decorrer de muito tempo da civilização ocidental, era inquestionável a existência de um enorme abismo entre os seres humanos e os outros animais. Sendo, no entanto, a base para esta presunção humana começar a ser destruída a partir das descobertas de Charles Darwin sobre a origem das espécies, e mais recentemente com a progressiva ruptura da história universal sobre a criação divina.

No decorrer desse percurso houve muito quem tivesse dificuldade em aceitar que as diferenças entre os humanos e os restantes dos outros animais fossem diferenças de grau, e não de categoria. Na atualidade, os mais céticos da evolução ainda procuram formas de traçar uma linha divisória entre o Homo sapiens e as outras espécies animais.

Contudo, essa fronteira de pensamento sempre foi de curta duração, até mesmo por permitir argumentações frágeis ou alegações destituídas de sentido. Exemplo disso, é a questionável pretensão de dizer que só os seres humanos têm a inteligência, ou que só os seres humanos se comunicam entre si. Questões que já não nos parecem tão convincentes como eram em outros tempos passados.

No mesmo contexto, outras pessoas também defendem a existência de uma diferença ainda mais profunda, quando questionam que os animais não pensam nem raciocinam, ou que não possuem nenhum conceito de si próprios, visto que vivem momento a momento e não percebem que fazem parte de categorias distintas. Por outro lado, não deixa de ser um absurdo atribuir a uma espécie não humana a capacidade de autorreflexão, sabendo que esses animais não “possuem” tantas disposições lógicas capazes de construir alguma ideia conceitual, capacidade essa restrita à espécie humana — ainda que com muitas limitações.

Diante dessas argumentações, ainda que algumas dessas tentativas de traçar fronteiras entre os seres humanos e os outros animais correspondem a qualquer verdade, os humanos, como diz o filósofo Albert Schweitzer, não teriam, ainda assim, qualquer peso moral para celebrar essas convicções, uma vez que mal conseguem reconhecer até mesmo sua própria insignificância. Portanto, não há como justificar nossa opressão, quase que total, sobre as outras espécies.

Acerca da comunicação entre as espécies, pode-se observar que muitos animais usam de fato uma comunicação, que simplesmente é diferente da comunicação humana. Não há dúvida de que a quase totalidade dos animais não humanos possuem diferentes meios de se comunicarem uns com outros, seja através da sonorização (rugidos, assobios, zumbidos, uivos, latidos, cantos, etc) ou dos movimentos (saltos, voos, danças, etc).

Além disso, observa-se ainda que vários grupos animais apresentam formas de vida semelhantes aos seres humanos, por exemplo, a união de grupos, cuidar dos familiares, dividir os alimentos, defendê-los e adverti-los de perigos, além da prática do altruísmo que incita a preocupação de um indivíduo com o outro.

Considerando esses atributos como se fossem uma questão moral, é fácil perceber o quanto os animais, que não sejam os humanos, exercem fielmente os seus princípios morais. Pois, eles, em equilíbrio social, vivem e respeitam seus limites, sabem como se comportar e sabem onde podem ir. Apesar de não formarem convergências conceituais, eles obedecem a lei da natureza. Por isso, devemos rejeitar a ideia de colocar a vida da nossa espécie acima da vida de outros animais.

Peter Singer, quando fala das considerações morais relativas ao princípio da igualdade, define que qualquer animal sendo tratado fora do domínio de sua natureza, sofre quando colocado em situações hostis ao bem-estar apenas das pessoas (como aconteceu no evento Shopping). Sendo que essa subordinação de interesse e domínio do outro, significa a expressão pura de especismo, que resumidamente é quando o ser humano atribui, direta ou indiretamente, uma conduta de exploração social, econômica ou moral em relação aos outros animais, o que suprime a condição básica que assegura a igualdade de todos os seres dotados de senciências.

O mesmo filósofo alega ainda que a sociedade humana naturalizou de tal modo o costume de usar os outros animais em vários meios de vida, que a ruptura desse costume implica numa quebra de paradigma ou mesmo num
a revolução por parte do ser humano, sobretudo, por conta dos seus aspectos econômicos e morais ou ainda pelo fato dos humanos se declararem francamente favoráveis a muitas práticas de violências, que anulam os interesses mais elevados dos outros animais em detrimento dos interesses menos relevantes dos humanos. Isso faz com que o animal não humano fique fora da nossa esfera de consideração moral e impede que seja estendido a ele o direito básico de não ser tratado como “coisa”, onde o animal fica sujeito a uma série de situações de violência física e mental ao ser confinado, explorado ou até mesmo abatido apenas para satisfação dos humanos.

*Filósofo, Zoólogo e Consultor Ambiental.

A língua 

Jacilene Cruz*

Para quem gosta, falar sobre línguas é algo sempre muito interessante, quando a nossa é o foco, passa a ser interessantíssimo. Primeiro, vou desfazer a ambiguidade: a língua que estou a me referir é a portuguesa, a falada aqui no Brasil mesmo, esse país que, sob o ponto de vista linguístico, é o menos português dentre os que carregam esse nome no idioma. Vou sair desse mérito, até porque mérito é algo injusto. Olha aí, já estou me enrolando na língua de novo.

Deixando os trocadilhos de lado, vou ao que interessa. Em se tratando cá, desse lugar tão imenso, posso afirmar que algumas vezes, chego a não me encontrar em alguns lugares dele.

Comecei com esses desencontros quando, ainda jovem, pensava em sair de minha terra em busca de um futuro melhor. Sempre disse pra mim mesma que no sudeste ou sul, não moraria. Mas mordi a minha língua, não a portuguesa, a física, aquela que em um simples beijo transmite cerca de 80 milhões de bactérias… doeu. Porém deixando a dor de lado, como eu dizia, sendo uma boa baiana, orgulhosa em ter nascido na terra da guerra de espadas, me sentia incomodada em ver minha Bahia servir como adjetivo pejorativo nessas duas regiões especialmente: ele fez uma baianada, coisas desse tipo.

Alguns anos depois, o incômodo com o adjetivo passou a ser café pequeno, quando começaram a surgir pessoas que, tomadas por um egoísmo odioso e doente, iniciaram uma caçada aos nordestinos, incitando a violência contra os meus.

Foi exatamente nesse período, no ano de 2011, que eu, por força das obrigações matrimoniais, tive que ir morar no Paraná, precisamente em Campo Mourão, norte do estado. Na medida do possível, acabei me adaptando, fiz amigos e tudo parecia ir bem, até que percebi que era uma estrangeira naquelas terras…

Certo dia do mês de setembro, quando o inverno já tinha se despedido, fui abastecer o carro e eu, alegre por estar sentindo aquele calorzinho que me lembrava o norte-nordeste, com os vidros abaixados, puxei conversa com o frentista:

__ Boa tarde, tudo bem?

__ Boa tarde, senhora, quer que eu lave o para-brisa?

Eu pouco me importava com a sujeira que possivelmente estava no vidro do para-brisa, queria era falar sobre o frio que tinha dado adeus, sobre o sol que chegava e a promessa de calor que surgia.

__ Não, não precisa. Parece que o calor veio pra ficar né?! Acho que agora já posso guardar o casaco.

__ É… como a senhora vai pagar?

__ Com cartão. O céu está limpo… né?!

__ Vou pegar a máquina.

A frieza me incomodou um pouco. Esse povo do sul é estranho mesmo… a minha mente já tinha criado o estereótipo para se defender. Ele voltou com a máquina, entreguei o cartão, tentei trocar mais umas duas palavras, o funcionário permanecia entre a indiferença e o desconcerto. O pagamento transcorreu normalmente, então eu, dando-me por vencida, comecei a levantar o vidro, fazendo apenas um aceno de que estava satisfeita com a cabeça. De repente, para minha surpresa, antes do vidro se fechar por completo, o frentista, sem graça, gaguejando, veio até a mim e perguntou:

__ Desculpe a curiosidade, mas a senhora é brasileira?

Tentando não morrer, agora de rir, e também não evidenciar o desconhecimento dele sobre os sotaques do Brasil, lhe expliquei que embora não parecesse, falávamos a mesma língua, afinal…

__ Esse país é grande demais, né?!

A língua me pregou mais uma.

*Mestra em Educação pela Universidade Estadual de Roraima – UERR/IFRR. Especialista em Língua Portuguesa e Literatura pelo IBPEX. Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS e Professora Efetiva da SEED/RR. E-mail: [email protected] 

Somos os artistas

Afonso Rodrigues de Oliveira

“A arte da vida consiste em fazer da vida uma obra de arte”. (Gandhi)

Somos todos artistas da vida. O problema é que nem sempre sabemos o que somos. Ficamos a vida toda construindo. E cá pra nós, temos artistas que nem conseguem se ver em si mesmos para se copiar aperfeiçoando a obra. E continuam procurando o que não lhes diz respeito, indo na onda dos que querem que ele seja. Será que você não está nesse grupo? Cuidado, porque as mulheres são mais influenciáveis. Não fosse isso e não teríamos tantos salões de beleza p
elo mundo. Mas não se magoe, querida, porque há uma quantidade imensa de “homens” embarcando nessa piroga furada. Mas isso é a arte da vida. Não fosse assim e não teríamos tantos palcos pelo mundo.

Relaxe e seja o que é, no que você é. Esteja sempre construindo e fazendo da tela da vida, a mais importante para você. O valor e a beleza de sua obra, depende de como você se sente com o resultado do que pintou ou esculpiu em você. Quando uma criança faz uma arte, todo adulto fica aborrecido. Talvez por isso a criancinha torce o nariz com a arte do paizão. Talvez na travessura na arte a criança esteja se polindo para o artista do futuro. Sorria sempre com a travessura do seu filhinho, e não grite com ele. Porque se você gritar estará borrando sua pintura. Simples pra dedéu.

“A vida é uma peça de teatro que não permite ensaio. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos”. (Charlie Chaplin). Chaplin foi um verdadeiro mestre na arte da vida. Soube como construir uma vida exemplar para a felicidade da humanidade. Porque não há como não se sentir feliz, assistindo ao grande mestre em todos os seus papeis, dentro ou fora dos palcos. Não vamos imitá-lo, mas seguir seus passos, como um exemplo de como fazemos a felicidade dos outros.

Não perca seu tempo contando os dias. Aproveite cada minuto do seu dia para construir a sua vida como uma obra de arte. Porque é sua obra que vai ficar na lembrança de todos, sempre presente na lembrança. Vamos encerrar o papo com uma lembrança do Bob Marley: “Não viva para que sua presença seja notada, mas para que sua falta seja sentida”. E tudo vai depender do seu desempenho no palco da vida. Procure você em você. Não tente ser igual a quem quer que seja. Valorize-se no que você é, sendo o melhor que puder ser a cada momento da vida. Tenha sempre em mente que você está construindo. E o resultado na construção depende do seu desenvolvimento mental. É na sua mente que está todo o poder de que você necessita para construir sempre o melhor. Pense nisso.

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