Opinião

Opiniao 15711

Pampsiquismo: uma alternativa ao problema da consciência?

João Paulo M. Araujo

Professor no curso de filosofia da UERR

Em termos conceituais, podemos começar caracterizando o pampsiquismo como uma postura ou resposta em filosofia da mente para o problema mente-cérebro e consequentemente, para o difícil problema da consciência. O pampsiquismo não sustenta que o mental é uma substância à parte do mundo físico (dualismo) ou que a mente seria apenas um epifenômeno do cérebro cuja a real dimensão ontológica reside na matéria (fisicalismo). A mente/consciência também não pode ser uma propriedade emergente do cérebro (algo consciente que surge da matéria desprovida de consciência) como nas teorias emergentistas. Além do mais, o pampsiquismo afirma que a consciência não é uma propriedade exclusiva dos seres humanos, mas sim, uma propriedade fundamental existente em nosso universo que é coextensiva a outras formas de vida. A consciência é um difícil problema (hard problem) como colocou David Chalmers (1995) e talvez o pampsiquismo possa oferecer uma visão razoável desse fenômeno.

Não importa qual sua crença acerca da condição do universo, se ele foi criado (Big Bang, criacionismo, etc.) ou se sempre existiu; para o pampsiquismo a consciência sempre esteve presente como um dos elementos mais básicos do nosso universo. Em outras palavras, não há algo separado como consciência e matéria, mas sim uma espécie de sínolo ou composto unificado de matéria-consciência. Essa visão é defendida por filósofos de postura mais agnóstica como, por exemplo, Philip Goff (2001; 2012; 2019) e filósofos com posturas mais teístas como é o caso da filósofa Johanna Leidenhag (2020; 2021; 2022). Além do mais, o pampsiquismo também é compatível com a teoria da evolução ao menos no que concerne aos primeiros adeptos do evolucionismo ainda no séc. XIX. O argumento por analogia seria o seguinte: se nós nos consideremos seres conscientes, e sabemos que nossas diferenças em relação a outras espécies são apenas de grau e não de gênero, logo, podemos considerar, com seus distintos graus, outras espécies como sendo também dotadas de consciência. Obviamente que isso pode se tornar complicado quando avançamos mais na escala evolutiva e pensamos em plantas, fungos, bactérias, amebas e outros organismos que escapam nossa conclusão imediata. O filósofo norte americano William James seria um dos grandes nomes que estariam de acordo com esta relação entre evolução e pampsiquismo.

Se comparada com as visões standard em filosofia mente, a literatura em torno do pampsiquismo revela-se ligeiramente discreta. Segundo um dado da PhillPapers, filósofos que endossam o pampsiquismo ainda são minoria, seguido de dualistas e seus matizes e, por fim, materialistas, que arrematam 56,5% das posturas em filosofia da mente. Visões antimaterialistas estão ganhando cada vez mais terreno no campo das discussões e o pampsiquismo é uma dessas visões que figuram entre elas. Como em filosofia nem tudo são flores, o pampsiquismo também enfrenta sérias objeções, todavia não é meu intuito explaná-las aqui. Minha finalidade destina-se apenas em prover uma breve descrição acerca de como ele é visto por alguns filósofos que o endossam.

De acordo com Goff (2001), o pampsiquismo tem uma longa história nas tradições filosóficas orientais e ocidentais e que só recentemente desfrutou de um renascimento na filosofia analítica constituindo, portanto, um meio termo entre o dualismo e o fisicalismo. Goff (2001) considera que o pampsiquismo, por mais estranho que pareça numa primeira análise, e sobretudo, no imaginário que essa visão desencadeia nas pessoas, o pampsiquismo promete um relato satisfatório da mente humana dentro de uma concepção unificada da natureza.

Além dos autodeclarados pampsiquistas existem aqueles que de uma certa maneira estariam sustentando algo parecido. Embora não possamos extrair declarações literais de uma postura pampsiquista em filósofos como Russell (1927) e Whitehead (1929), é possível notar seus esforços em busca de uma descrição do mundo natural que supere esse dualismo conceitual que permeia o campo de discussões em filosofia da mente. Russell em sua obra The Analysis of Matter (1927) não estava pensando em filosofia da mente, mas buscava superar essas visões, no caso de Russell, seus adversários eram o materialismo e o idealismo. Para Russell (1927, p. 353), “tanto o materialismo quanto o idealismo foram culpados, (…), de uma confusão em suas imagens da matéria”. Portanto, Russell, através daquilo que ficou conhecido por monismo neutro, tentou superar essas visões, sustentando que “uma percepção ou evento físico podem ser com-presentes” (RUSSELL, 1927, p. 355). Já em Process and Reality (1929), Alfred Whitehead fornece um sistema filosófico especulativo que pode servir como um bom fundamento para uma discussão pampsiquista. Apesar do trabalho de Whitehead ser um texto sobre filosofia da natureza, e de Whitehead ser muito modesto sobre o sucesso de seu projeto filosófico, temos na história da filosofia analítica um bom ponto de partida para uma visão fundamental e unificada da natureza.

Para Thomas Nagel (1979, p. 181), o pampsiquismo seria a visão de que “os constituintes físicos básicos do universo têm propriedades mentais, sejam ou não partes de organismos vivos”. Segundo Nagel, o pampsiquismo parece seguir quatro premissas, a saber: 1. Composição material – o ser humano juntamente com qualquer organismo vivo é um sistema material complexamente combinado de maneira especial, possuímos os mesmos elementos químicos e partículas físicas que compõem o universo. 2. Não-reducionismo – nossos estados mentais mais básicos como pensamento, sentimento, sensação, desejo etc., não são propriedades físicas do organismo. 3. Realismo – no entanto, são propriedades do organismo, visto que não há alma, e não são propriedades de coisa alguma. 4. Não-emergente – não há propriedades emergentes de sistemas complexos, pois, a emergência é uma condição epistemológica da qual não pode ser observada com demarcação satisfatória.

Aqui podemos perceber a partir dessas quatro premissas que a descrição que Nagel apresenta do pampsiquismo tem como pano de fundo o naturalismo filosófico onde a mente ou a consciência não deve ser identificada com a alma no sentido clássico da palavra. Isso, por sua vez, já revela um compromisso com o pampsiquismo que difere radicalmente de outras representações associadas a perspectivas religiosas, visões new age e coisas do gênero.

Uma visão bastante curiosa de uma forma de pampsiquismo advém de Galen Strawson (2006). Em seu ensaio Realistic Monism: Why Physicalism Entails Panpsychism, Strawson argumenta que sua visão fisicalista da realidade não exclui o pampsiquismo, muito pelo contrário, endossa-o. Em suas palavras “Eu persisto em pensar que ‘fisicalismo’, ‘fisicalismo real’, é um bom nome para minha posição no atual contexto de debate, mas é hora de admitir que, no meu entendimento, o fisicalismo real nem mesmo exclui o pampsiquismo – o que eu considero ser a visão de que a existência de cada coisa real e concreta envolve o ser experiencial, mesmo que também envolva o ser não experiencial” (STRAWSON, 2006, p. 57). Mais à frente, ele assevera que “Não creio, entretanto, que precise dessas suposições para mostrar que algo semelhante ao pampsiquismo não é meramente uma forma possível de fisicalismo realista, fisicalismo real, mas a única forma possível e, portanto, a única forma possível de fisicalismo, tout court” (STRAWSON, 2006, p. 58).  Na perspectiva de Strawson, o pampsiquismo seria o resultado de uma forma de fisicalismo mais abrangente que não fosse reducionista, que não lidasse com nossa vida mental e subjetiva apenas como algo menor em comparação com a realidade física do cérebro.

Diante dessa breve descrição pudemos observar que o pampsiquismo não é um modelo explicativo monolítico acerca da consciência. Sua postura pode variar em distintos graus onde cada filósofo defende uma perspectiva em particular. Philip Goff, que considero o maior expoente do pampsiquismo no meio filosófico hoje, consegue em sua obra Galileo’s Error: Foundations for a New Science of Consciousness (2019), apresentar de maneira abrangente e acurada grande parte das descrições que vimos ao longo do texto. Com uma linguagem clara e acessível ele torna a posição pampsiquista algo defensável diante de tantas teorias fisicalistas e dualistas que figuram no cenário filosófico contemporâneo. Mas o que você acha de tudo isso? Consegue vislumbrar no pampsiquismo uma descrição fundamental e unificada da consciência e dos fenômenos mentais em sua relação com o mundo físico? Talvez precisaremos de mais leituras e reflexões para alcançar esse objetivo.

Falta de líderes: a causa dos nossos problemas

Por Henrique Medeiros*

Em um cenário dominado pela desigualdade, individualidade, conflitos generalizados ao redor do mundo, pobreza e outras mazelas, apresento-lhes agora o que, na minha visão, trouxe-nos até esse modelo falido de organização mundial. E não tenho dúvidas: o principal fator de degradação da humanidade está intimamente relacionado com a maneira com a qual governos, empresas e a sociedade vêm atuando quando, soberbamente, optaram por transformar os seres humanos em mero meio de produção e não um fim em si mesmo.

O dinheiro virou um bem, produto, algo a ser produzido independente de gerar benefícios para a sociedade. Vou até um pouquinho mais longe. Independente de gerarmos dinheiro pelo dinheiro, o próprio acréscimo do PIB também já não reflete, há tempos, aumento na qualidade de vida. O que nos sugere buscar urgentemente novos mecanismos mais eficazes para medir o desenvolvimento humano.

Mas, de volta ao nosso tema central, pergunte-lhes: por que, se dinheiro não tem vontade própria, chegamos a essa situação, fora de qualquer propósito, surreal, de degradação humana e ambiental? A resposta é simples. Em decorrência do maior problema que temos atravessado nas últimas décadas: a falta de líderes. Pela falência no processo de preparação de novas lideranças, capazes de juntar pessoas em torno de objetivos comuns, de colocar os seres humanos em primeiro lugar.

Líderes que valorizem o ser humano, não o poder, e tenham a destreza de propor e negociar novas formas viáveis de existência humana, catalisando os diferentes anseios das pessoas e endereçando-os com suas devidas especificidades. E que, ao respeitarem a diversidade humana, tenham a capacidade de extrair o melhor de cada um.

Um verdadeiro governante, um verdadeiro líder acorda, todos os dias, perguntando-se: estou fazendo tudo o que eu posso para melhorar a vida das pessoas? Minhas ações estão preservando o planeta? Estou tornando a população dependente de esmolas ou agindo para torná-la autossustentável? O que eu preciso aprimorar, em mim, para que possa melhorar a vida do meu semelhante?

No mínimo, necessitamos de lideranças que mantenham a integridade, o discurso e a prática coerentes, capazes de ouvir, de serem humildes, de reconhecerem seus próprios erros e corrigirem os caminhos, quando necessário.

A verdade, nesse caso, é uma só: se deixarmos tudo como está, se seguirmos com esse modelo existencial, centrado no dinheiro, precisaremos dedicar um esforço infinitamente maior, do que hoje precisamos, para formar líderes que ajudem a transicionar o atual modelo de sobrevivência para um modelo digno de existência. Líderes: sem eles, continuaremos sem esperança. Com eles, criaremos um novo mundo.

Henrique Medeiros é especialista em gestão e psicanalista, autor do livro “Células Sociais Caórdicas – O Caminho Para Um Novo Mundo”

Sempre a verdade

Afonso Rodrigues de Oliveira

“Fale a verdade, seja ela qual for, clara e objetivamente, usando um toque de voz tranquilo e agradável, liberto de qualquer preconceito ou hostilidade”. (Dalae Lama)

Na verdade, não precisamos ser faladores. Podemos dizer tudo com poucas palavras. O importante é que saibamos o que dizemos. A simplicidade é o caminho para o respeito. E é exatamente por isso que devemos ser simples e falar sempre a verdade. E pouca gente presta atenção à importância de falar a verdade para consigo mesmo. E para que possamos conversar conosco mesmo é preciso compreendermos o funcionamento da nossa mente. O que é muito difícil para os que ainda não se desenvolveram racionalmente. Só quando compreendemos o que somos é que seremos de verdade. Porque quando descobrimos que ainda não estamos no nível desejado damos um paço para o desenvolvimento.

O Waldo Vieira nos diz: “Nossos conhecimentos aumentam sempre, através dos nossos atos, em qualquer hora e lugar em que nos manifestamos”. O que nos orienta para que sejamos comedidos em nossas ações. Então vamos escolher a vereda que devemos seguir e ir em frente. Seus pensamentos tanto podem levar você para o bem quanto para o mal. Então vamos ser mais cautelosos em nossos comportamentos. E a fala é muito importante para nossa apresentação. É no que falamos que dizemos quem realmente somos.

A sinceridade é um ponto forte na caminhada para o sucesso. Nem sempre imaginamos que os entendidos leem em nossos olhos, quando lhes dizemos alguma coisa. É uma leitura preciosa para a qual nem sempre estamos preparados. Então vamos nos preparar para sermos o que realmente desejamos e queremos ser. E a escolha do caminho é de cada um. Mesmo quando seguimos orientações, a decisão em seguir foi nossa. A responsabilidade, tanto pelos acertos quanto pelos erros é de quem aceitou a orientação. E o erro mais absurdo é ficar creditando a responsabilidade a quem o orientou.

O maior orientador que temos é o nosso espelho interior. Mas, para usá-lo com racionalidade precisamos estar preparados para conversarmos conosco mesmo. Que é quando descobrimos o poder que temos e não sabemos que temos. Tudo é muito simples, desde que nos conheçamos no que somos e como somos. Vamos falar sempre a verdade. Nunca nos deixemos iludir pela simplicidade da mentira, ainda que ela esteja apenas nos pensamentos. A caminhada é longa, duradora e eterna. Três características que levam à racionalidade. É só sabermos que caminho devemos seguir dentro do racional. E ser racional é saber e se conhecer como o ser que deve seguir o caminho racional, na vereda da verdade. Pense nisso.

afonso_rr@hotmail.com

99121-1460      

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