Opinião

Opiniao 15859

Pressupostos do agronegócio e suas mazelas

Sebastião Pereira do Nascimento*

Como bem traduz os geográficos Bernardo Fernandes e Allan de Campos Silva, a ideia do agronegócio foi criada pelos estadunidenses John Davis e Ray Goldberg, da Universidade Harvard, em meados do século passado. Suas leituras se limitaram a compreender o funcionamento do sistema integrado: agrícola, pecuário, industrial, mercantil e financeiro. Essa opção reducionista em definir o agronegócio como um paradigma do capitalismo agrário evitou incorporar os impactos danosos, porque procurava atender aos interesses das grandes corporações e dizer que o agronegócio é bom para todo mundo. Foi assim que esse conceito de sistema agrário contribuiu para um modelo de “desenvolvimento” hegemônico global.

Um modelo baseado na produção da monocultora convencional ou transgênica com uso intensivo de venenos, produzindo predominantemente alimentos processados e ultraprocessados que produzem poluição e doenças nos âmbitos corpo-terra-água. Esses impactos predatórios acontecem geralmente no fim do sistema; no início do sistema, porém, há a desterritorialização dos pequenos produtores que contraria a verdadeira função social da terra.

Embora hoje a palavra agronegócio seja utilizada de forma indiscriminada, somente há pouco mais de duas décadas passou a ter uso corrente no Brasil. Mas, apesar da sua pouca idade, já assume um caráter carregado de plutocracia, como explícito na própria palavra (agronegócio), que tem como principal objetivo a obtenção de lucro, com uma produção voltada ao mercado, nacional e internacional, em especial de commodities e de agrocombustíveis.

O agronegócio é regulado por relações de produção, distribuição e consumo globalizadas calcadas em corporações transnacionais, assim como mobiliza grandes volumes de créditos estatais e outros interesses de ordens econômicas e políticas, por exemplo, o poder da “bancada ruralista” no congresso brasileiro, que soma um número significativo de parlamentares, entre senadores e deputados.

Diante desse quadro, o professor e biólogo Luiz Padulla, aciona que as mentiras que o agronegócio segue propagando de que sem ele, não há alimento, é pura falácia. No entanto, como explicar que milhões de brasileiros sofrem de insegurança alimentar, enquanto o agronegócio no Brasil bate recorde na produção de grãos? Afinal, quando se trata das quatro cultivares que são a base da alimentação do brasileiro (arroz, feijão, trigo e mandioca), esses produtos perderam espaço no país para a produção do agronegócio. Assim, a resposta à pergunta acima é clara: o agronegócio não alimenta, apenas gera lucros nas bolsas de valores.

Portanto, o agronegócio, mais do que esconder que não produz o verdadeiro alimento para as pessoas, também diz que a área de plantio não aumentou e que não há impactos ambientais, mas o uso de agrotóxicos segue crescendo de modo exponencial, derrubando a teoria de que os organismos geneticamente modificados usam menos agrotóxicos. 

Neste contexto, na medida em que o uso dos agrotóxicos vem aumentando, proporcionalmente também cresce o número de pessoas intoxicadas por essas substâncias químicas usadas nas monoculturas. Segundo Luiz Padulla, dados oficiais do Ministério da Saúde — provavelmente subnotificados — entre 2007 e 2014, somam 1.186 mortes causadas por ações dos agrotóxicos (uma morte a cada 2 dias e meio). Portanto, se antes do governo Bolsonaro as coisas andavam trágicas assim, imaginem nesses últimos quatro anos com a liberação geral de agrotóxicos pelo governo bolsonarista.

A presença dos agrotóxicos na agricultura é cada vez mais preocupante, afinal, uma vez que no ambiente ou nos alimentos, não há métodos eficientes para sua retirada. Estudos apontam que vários princípios ativos estão relacionados com alterações genéticas, más-formações embrionárias e doenças diversas: diabetes, obesidade, hipertensão, doenças cardiovasculares, acidente vascular cerebral, alguns tipos de câncer, etc. Casos de má formação fetal e suicídios estão diretamente relacionadas com as áreas que usam agrotóxicos. Distúrbios endócrinos, por exemplo, estão causando puberdade precoce em crianças, onde meninas antes da puberdade têm o desenvolvimento das mamas e outras disrupções endócrinas. (Aguiar, A.C. 2017. Más-formações congênitas, puberdade precoce e agrotóxicos: uma herança maldita do agronegócio para a Chapada do Apodi (CE). Mestrado em Saúde Pública, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, UFCE).

Soma-se a essa contaminação, a crescente devastação dos ecossistemas brasileiros que vem promovendo alterações em muitas espécies da fauna regionais, colocando várias espécies em risco de extinção e, ainda mais preocupante, afetando o equilíbrio da cadeia ecológica com a perda da biodiversidade. Por exemplo, a mortalidade de espécies não-alvo, como as abelhas. Afinal, são esses insetos os responsáveis pela polinização de cerca 80% das plantas angiospermas. Sendo os principais causadores desse extermínio das abelhas os venenos: Sulfoxaflor e Fipronil que, mesmo proibidos na Europa, seguem liberados no Brasil. Assim como o Acefato e o Atrazina, também banidos na Europa por causar doenças humanas e problemas ambientais, tem sido usado massivamente no país.

Outros estudos recentes (Vicente, E.C. & Guedes, N.M.R. 2021. Organophosphate poising of Hyacinth macaws in the Southern Pantanal, Brazil. Scientific Reports), apontam que embora longe dos centros mais degradados pelo agronegócio, as araras-azuis do pantanal, por exemplo, também sofrem com os resíduos químicos intoxicadas por Organofosforados. Da mesma forma as antas, importantes animais para o equilíbrio do ecossistema pantaneiro, que têm sido vítimas dos agrotóxicos, pela dispersão aérea desses químicos. 

Além de tudo isso, o agronegócio é danoso também por ser socialmente excludente, economicamente concentrador, ambientalmente devastador e culturalmente supressor. Ele vem cada vez mais ampliando os níveis de pobreza e causando o aumento dos conflitos e da violência no campo. O agronegócio é um modelo de produção onde temos o predomínio do alimento tratado não como um direito de todos, mas como uma mercadoria, ou seja, um bem econômico cujo propósito maior é alcançar o lucro, uma característica central do capitalismo. Portanto, o agronegócio é, indubitavelmente, um dos pilares da fome no Brasil.

Essa é outra verdade que precisa ser cada vez mais disseminada, embora esteja amplamente escancarada, onde, paralelo ao aumento da produção do agronegócio brasileiro, assim como da curva ascendente do lucro das corporações que dominam a agroindústria alimentar, temos o crescimento do número de pessoas sem acesso à alimentação, num profundo estado de insegurança alimentar, diz a nutricionista e socióloga Elaine Azevedo.

A especialista fala ainda que não por acaso, o aumento da produção do agronegócio e o crescimento da fome são faces de uma mesma moeda. Portanto, a cada novo recorde da safra de grãos, lado a lado aumenta o número de pessoas sem saber como farão para se alimentar a cada dia. Essa é uma das maiores perversidades do agronegócio brasileiro. E a pandemia escancarou ainda mais essa verdade, pois as corporações de produção e de distribuição do alimento-mercadoria continuaram lucrando durante este período, enquanto a fome aumentou de forma exponencial.

Outra mazela relativa ao agronegócio, é que a difusão do alimento mercantilista suprime os saberes e fazeres historicamente construídos por populações que têm nas práticas agrícolas e culinárias aspectos de sua identidade sociocultural, preservadas e transmitidas de forma secular. Dessa maneira, são muitas identidades locais e regionais que vêm sendo drasticamente impactadas com a difusão do agronegócio que caminha junto ao capitalismo selvagem, fazendo jus à propriedade privada e seu rastro de sangue e morte.

Diante desse cenário perturbador, concordo com os argumentos de Malheiros, et al. quando apontam que “a escolha pelas commodities, atrelada à ilusão de que a tecnologia é capaz de produzir uma economia sem limites, não apenas degradou ecossistemas, tirando-lhes a fertilidade, mas também ceifou a fertilidade do pensamento crítico que influenciou distintos projetos políticos para o Brasil, demonstrando que a chamada modernização da agricultura não apenas gera pilhagem, dominação do território, violência e devastação, mas também […] uma amnésia biocultural, ou seja, o sepultamento dos saberes comprometidos com a vida para se pensar a vida” (Malheiros, et al. 2021. Horizontes amazônicos – para repensar o Brasil e o mundo. São Paulo, 288p).

*Consultor ambiental, filósofo e escritor.

Sustentabilidade, a sexta onda que já se forma no horizonte

Marcellus Campêlo

Os movimentos no mercado indicam que estamos vivendo o que já está sendo denominado de a sexta onda, a da sustentabilidade. Essa onda começou a se formar por volta de 2005, mas só a partir de 2020 ganhou fôlego e características que a colocam na condição de um novo ciclo a dominar o mundo, pelo menos até 2045, dizem os especialistas.

O novo ciclo foi forjado, basicamente, a partir da pressão da sociedade, da inquietação que tomou conta dos consumidores, exigindo do mercado respostas rápidas para questões que afligem a população mundial e que estão diretamente ligadas com a existência do planeta. Dentre elas, e principalmente, as que estão relacionadas ao meio ambiente e ao ser humano.

Não que o mercado seja o único vilão dessa história, mas os meios de produção têm grande participação na construção do futuro. A formação de uma consciência voltada a esses propósitos, no meio empresarial, ajuda demais na transformação que é preciso ser feita no mundo, tanto nas relações comerciais como nas ações individuais.

Nessa nova era que se apresenta os modelos de negócios devem ser mais conscientes e responsáveis. O desafio a ser enfrentado é o de transformar os avanços que vêm sendo alcançados em tecnologias verdes, por exemplo, e em outras áreas, para a construção de um mundo ecologicamente correto, socialmente justo e economicamente sustentável. É o que todos querem hoje.

Nas empresas, isso se traduz na adoção de ferramentas de ESG (sigla em inglês para práticas que reúnem ações nas áreas Ambiental, Social e de Governança). Ou seja, hoje, não basta apenas ter lucro, retorno econômico e nem mesmo fazer pequenos arremedos de práticas de ESG, sob pena de ter vida curta no mercado. Trabalhar dentro dos padrões de sustentabilidade é essencial para o sucesso de qualquer negócio.

Para entender o novo ciclo sobre o qual estamos envolvidos, diria já no olho do furacão, é preciso voltar um pouco no tempo, mais precisamente a 1942, data de criação, pelo economista Joseph Schumpeter, da teoria das ondas de inovação ou da Destruição Criativa. Com base no entendimento de que o capitalismo vive em constante evolução, Schumpeter dizia que o modelo precisava se reinventar, toda vez que novas tendências e tecnologias eram introduzidas na sociedade, com impacto capaz de reestruturar a economia para uma próxima era.

Com base nesse entendimento, foram estabelecidas as cinco ondas vividas até então, todas elas relacionadas a inovações tecnológicas que predominaram em cada período. Os pensadores destacam os seguintes ciclos da humanidade: Revolução Industrial (1785-1845); Idade do Vapor (1845-1900); Era da Eletricidade (1900-1950); Produção em Massa (1950-1990); e Redes e Tecnologias da Informação e Comunicação (1990 e que segue até hoje, quase em interseção com a nova onda).

A onda da sustentabilidade chega com o esgotamento do atual modelo e a necessidade de reconfigurar os meios de produção, com as novas tendências que surgem. O novo ciclo está prendendo a atenção do mundo corporativo, dos governos e executivos de todo o mundo. O tema ganhou destaque, inclusive, no Fórum Econômico Mundial de Davos, realizado em janeiro deste ano, apontando que a sustentabilidade deve guiar as decisões daqui para frente.

O tema não é novo, é preciso que se diga, mas até agora vinha se resumindo a ações pontuais, sem grandes impactos. Com o aprofundamento das desigualdades, os efeitos da pandemia de Covid-19 e os alertas das mudanças climáticas, o processo se acelerou e agora há um sentimento mais uniforme, no sentido de buscar caminhos efetivos que predominem como requisito no mercado, para produtos e serviços.

O grande desafio que está posto é o de desenvolver a atividade econômica conectada a um ambiente mais saudável, fazendo uso racional dos recursos naturais e promovendo a qualidade de vida das pessoas em volta, um ativo que, hoje, tem enorme valia como diferencial no mercado.

O que percebemos é que consumidores e produtores estão mais conscientes nesse sentido. Na parte das empresas, começam a entender que para obter lucros, vão precisar também investir nos cuidados ambientais e no social.  O cidadão, por sua vez, precisa compreender que a cada gesto de colaboração, alimenta-se a esperança de que manteremos o planeta vivo para muitas gerações.

Marcellus Campêlo é engenheiro civil, especialista em saneamento básico; exerce, atualmente, o cargo de secretário de Estado de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano do Amazonas

Saia da cadeira e dê no pé

Afonso Rodrigues de Oliveira

“Todo indivíduo que trabalha preso à escrivaninha deveria se levantar de sua cadeira pelo menos uma vez cada duas horas e dar uma volta pelo escritório”. (Og Mandino)

Já imaginou quanta tolice a gente faz durante o dia? O cara fica o dia todo sentado de frente para o computador, trabalhando é claro. Mas não imagina o quanto isso pode estar prejudicando sua saúde. E ele poderia facilitar a vida se se atentasse para isso. Quando ele se levanta para ir ao banheiro sente que está ficando tonto. Mas, pra ele, isso é natural. E volta, senta-se e fica ali até a hora do almoço. E não é só pra ele, todos nós pensamos da mesma maneira. E é por isso que dizem que somos todos iguais. A diferença está em fazermos coisas diferentes, mas de modos diferentes.

Você já prestou atenção a comportamentos esquisitos que por serem esquisito fazem você sorrir pra você mesmo, ou mesma? Preste mais atenção às coisinhas simples que lhe parecem tolas, mas estão mostrando que você é um tolo ou tola, em não prestar atenção à simplicidade. Porque ela, a simplicidade, faz muito bem à nossa saúde. Na verdade, quando não prestamos atenção ao simples podemos estar procurando doenças que nem são doenças. E todos nós temos defeito, de não nos valorizarmos no que somos. E continuamos procurando o nós que não somos.

Há coisinhas com aparência de absurdas, mas que poderiam nos divertir, se prestássemos mais atenção. Ainda há pouco levantei-me e saí da frente do computador. Fui até à janela e olha só o que vi e me divertiu; o Mandela e a Caboca estavam deitados, tomando um solzinho junto ao portão. Os dois estavam deitados com as barrigas para cima e rolando de um lado para o outro. O Mandela rolava para a esquerda e a Caboca para a direita. Repetiram isso várias vezes enquanto eu não parava o sorriso, me divertindo com a brincadeira de dois cachorros.

Nada de desprezo, mas apenas exercícios para o bem da saúde. Faça isso todos os dias, com personalidade e respeito. Levante-se um pouco da cadeira e dê uma caminhadazinha pelo escritório, mas com personalidade. O corpo precisa de movimentos acompanhados com o movimento da mente na observação. Observar as coisas e acontecimentos à sua volta é um aprendizado. E o mundo é uma escola que não nos nega momentos de grande aprendizado. Mantenha-se sempre ativo ou ativa. O descanso tem limites. Quando exageramos no descanso caímos no ostracismo. E este é prejudicial. Divirta-se sempre, mas com personalidade. Nada de vulgaridade.

Mais um dia nas nossas vidas está à nossa disposição. Então vamos vivê-lo com personalidade e racionalidade. Pense nisso.

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