Opinião

Opiniao 16 12 2019 9474

Suando bicas  Rodrigo Alves de Carvalho*

Alcebíades desde muito novo suava bicas. O parrudinho garoto branquinho suava mesmo sem fazer esforço, sentado assistindo TV ou na sala de aula, o suor escorria de sua testa. O garoto toda hora limpava com a palma da mão e enxugava na camisa. Em pouco tempo, Alcebíades e a camisa estavam encharcados.

Pior era quando brincava com os amiguinhos, o menino avermelhava o rosto, eriçava os cabelos e suava um rio.

O tempo passou, Alcebíades cresceu, se tornou homem e continuou suando bicas.

Ele sofria, durante o dia precisava trocar de roupa pelo menos quatro vezes e toda manhã era preciso mudar a roupa de cama que amanhecia ensopada com o grandalhão transpirando sem parar jogado na cama.

Arrumar namorada era praticamente impossível. Já era complicado ficar perto de mulheres enquanto o suor brotava de seu rosto, imagina só abraçar e ficar juntinho com uma garota? Se isso acontecesse, ela teria que amá-lo muito para ficar encharcada e pegajosa com o suor alheio.

No trabalho, num escritório de contabilidade, Alcebíades recebia rajadas de vento de um ventilador o dia todo, podia estar ardendo o dia de calor ou no auge do mais frio inverno, mesmo assim terminava o expediente totalmente grudento e fedido.

Alcebíades procurou médicos para tratar do problema, porém suas glândulas sudoríparas sofriam uma rara doença e era impossível reverter o processo. Ele iria suar a vida toda.

Na verdade, seu problema só agravou com o passar do tempo. O rapaz suava tanto que por onde andava ficava um rastro dos pingos que caiam de seu corpo. Se alguém quisesse encontrar Alcebíades, bastava seguir a trilha molhada no chão.

Nos finais de semana o gordinho suador se refrescava no grande jardim de sua casa, nas sombras das plantas, deitado na terra úmida e fria. Ali se sentia bem, mesmo com o corpo molhado e pegajoso em contato com a terra e as folhas secas do chão, à sombra das Damas da Noite e das Roseiras, Alcebíades relaxava e deixava o tempo passar lentamente.

Foi assim que o gordinho branquelo aos poucos se entregou àquela vida em câmera lenta, rastejando pelado no jardim, com o corpo molhado, deixando seu rastro por onde passava.

Alcebíades se transformou numa grande lesma!

Todos se conformaram com a sina de Alcebíades, o coitado estava predestinado a ser uma lesma desde que nasceu…

Morreu esturricado no meio do jardim depois que malvados garotos jogaram sal em seu corpo só pelo prazer de ver Alcebíades derreter lentamente.   *Nascido em Jacutinga (MG). Jornalista, escritor e poeta possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores.

Corra, Cidadão, Corra Linoberg Almeida*

A cada segundo de todos os dias, você faz uma escolha que pode mudar sua vida. Então, é ater-se às metas ou pagar o preço. Como sou dos que não pagaram para entrar e estamos todos cercados pelos que rezam para não sair, insisto que certo é sempre o certo, mesmo que poucos o façam. E cidadão que não ocupa as entrelinhas do poder local vira Alice no País das Maravilhas.

Na quarta passada, dia de votar o orçamento da cidade de Boa Vista, infelizmente a Câmara estava vazia. Seus olhos não viram, mas seus corações e bolsos irão sentir. Ali, cadeira vazia é oficina do diabo. Logo onde o nome de Deus é dito a torto e a direito na tentativa de justificar ações que no plano terreno tenho lá minhas dúvidas se você defenderia, quem dirá no divino, o 1,3 bilhão de reais saiu com a cara de quem o propôs, ipsis litteris.

E olha que quem verbaliza “Deus no comando”, na verdade comandava, guiado pelo celular nervoso fazendo e recebendo chamadas de duas quadras atrás da Câmara na missão de apequenar o poder legislativo. Um grupo de vereadores, sem essa de base, ou oposição, tentou articular a possibilidade ímpar de, com diálogo responsável, definir prioridades que caberiam nesse jogo político. A voz de cima disse não. 

Vi presidente ouvir atentamente, anotar demandas. Vi defesas de pautas coletivas; ouvi coisas que caberiam mais como indicação que como emenda; percebi que, se mudadas as peças nesse jogo de xadrez, uma relação executivo x legislativo x sociedade mais saudável poderia brotar, num solo capaz de produzir lideranças de alta performance. Porém, o mesmo solo de bons frutos deixa a erva daninha destruir mais uma possibilidade de se fazer o papel de vereador.

Política não é apenas a arte do possível. Tente ver o drama de associação que atende 10 mil famílias com pessoas com deficiência e não fazer nada. Você diria não a possibilidade de ter ginecologistas e pediatras perto de sua casa? Você diria não a duplicação da ponte na Av. Bandeirantes no bairro Buritis? Você diria não a mais estrutura na educação de crianças autistas, com TDAH e outras necessidades especiais? Não há mais psicólogos, dentistas, profissionais de Libras e línguas indígenas? 

Você diria não a agentes de trânsito nas ruas e guardas valorizados como pessoas, não só prédios e viaturas? Diria não a um Centro de Acolhimento a pessoas em vulnerabilidade social, situação de rua? Imagine-se a percorrer a cidade, saber do potencial orçamentário capaz de atingir escalas de pequeno, médio e grande portes e, por vaidade ou compromissos dos quais nem eu nem você fazemos parte, não fazer nada ou articular pelo não?

Chego ao terceiro debate de lei orçamentária desse mandato experimental. Agora são 107 nãos. Onde antes perdia sozinho, hoje já somos meia dúzia fazendo meia centena de emendas, mapeando, estudando, propondo soluções que em breve estarão por aí, ipsis verbis. A gente vê por aqui gente que prefere brilhar sozinha sem dar louros a quem idealiza. Não tem patente, né. Aos vereadores e vereadoras que tentaram furar o bloqueio, nosso muito obrigado.

Sabe de uma coisa: Tem gente que acorda com as contas questionadas pelo TCE; aparece ladeada e abraçada à corrupção em rede nacional e à noite acende árvore de natal com uma tranquilidade estranha. Quem me escolheu sabia que não sou de tapinhas nas costas, sorrisinhos amarelos. Não sou de acotovelar para descerrar placas em inaugurações, ou discursos macios em palanques. Sou dos que não engolem 20 centavos de aumento em passagem de ônibus ruins, mesmo que fantasiados de trenó.

Já você, cidadão, desanima não. Corre que ainda dá tempo, e se perder o sapato, calce, pois o príncipe por aí é maquiavélico, nada de conto de fadas. Precisamos mostrar que Drummond estava errado ao dizer democracia é a forma de governo em que o povo imagina estar no poder. Pode não ser, é só querer.

*Professor e Vereador de Boa Vista

Começar pelo começo

Afonso Rodrigues de Oliveira*

“No Brasil só há um problema nacional: a educação do povo.” (Miguel Couto)

Muito antes
do Miguel Couto, muitos pensadores falaram a mesma coisa, referindo-se à educação pelo mundo. E o resultado estamos vendo atualmente numa caminhada para o descontrole social. Ainda não nos preparamos para educar nossos filhos para o mundo em que eles irão viver. Não aprendemos dentro de nossos lares, quando éramos crianças e jovens, o que deveríamos ser no futuro. Não nos preparamos para educar. Ainda há um número assustador, de pais que tentam educar com gritos e palavrões. O que só destrói o que devemos construir. Nunca educaremos nosso filho, sem respeitar a personalidade dele. E só a respeitaremos quando nos atentarmos para essa joia: “A educação é como a plaina: aperfeiçoa a obra, mas não melhora a madeira.” E só seremos realmente construtores quando conhecermos a madeira com a qual estamos construindo. 

Napoleão Bonaparte também disse que: “Devemos construir mais escolas para não termos que construir mais presídios.” Mas construir escolas não significa apenas construir prédios para escolas. Porque não é nas escolas que educamos nossos filhos, mas nos nossos lares. A criança bem educada no lar vai para a escola como uma criança civilizada. O professor vai ensiná-la a viver a vida com os conhecimentos passados por ele. E é nesses conhecimentos que o adolescente descobre que é na “Universidade do Asfalto” que ele vai aprender a viver os conhecimentos adquiridos na escola. E a “Universidade do Asfalto” está no dia a dia, nas caminhadas orientadas no que aprendemos. 

Recentemente assisti a um exemplo notável do mau exemplo dado por uma mãe a uma criança, na rua. Eu vinha pela Avenida Beira Mar e uma criança brincava no escorregador da Praça. De repente começou a chuviscar. A mãe da criança começou a gritar:

– Vamos filho! Aí vem a chuva!

A criança não dava a mínima bola para a mãe. Ela continuou gritando. De repente ela viu um carro de polícia que passava pela Avenida. Aí ela gritou:

– Vamos, filho. A polícia vem aí!

A criança pulou do escorregador e saiu gritando. Agarrou-se às pernas da mãe e começou a chorar. Pode lhe parecer incrível, mas é verdade. Fiquei estarrecido com o comportamento da mãe e do filhinho. Segui pelo calçadão imaginando que imagem aquela criança terá da polícia, quando adulto. Aquela senhora nos deu um dos maiores maus exemplos na educação familiar. O que continua me entristecendo com a declaração daquela especialista em educação, num programa televisivo, recentemente. Ela disse que é um equívoco dizer que a educação começa no lar. Pense nisso.

*Articulista [email protected] 99121-1460