BRUTAS HISTÓRIAS DE UMA PERIFERIA ESQUECIDA / (Cena 5) – Hudson Romério*
A periferia é uma casa bem grande, com muita gente dentro, muita gente fora…muita gente esquecida – esquecidasde si mesmas…a periferia não dorme: não quer sonhar com nada.
A periferia é num só lugar, todos os lugares…
Todas as cidades, todos os bairros, todos os territórios
Aleppo, Suçukulé, Pintolândia, Pacheco, Rosinha, Vale do Amanhecer, João de Barro…
Ninguém está a salvo da fé! A caminhada segue…
Copacabana, Lago Sul, Higienópolis, Leblon, Paraviana…
Tantas casas, tantos prédios, tantas portas
Brasília Teimosa, Ruben Berta, Pedra Pintada, Altamira…
Quantas almas, quantos sonhos…
Quanta solidão.
Ela tem uma singularidade própria, uma razão que a diferencia dos outros lugares da cidade – deser sua própria escolha! De transformar-se num lugar onde todos são acolhidos e aceitos como iguais!
A periferia é a máquina dos sonhos perdidos
De prédios que pesaderam-se com aviões e implosões
Onírica utopia que degustamos no dia-a-dia…
Dos enganos de nossas verdades, das brutas ilusões
Das risíveis paixões
Das paixões…
Nela, há uma alteridade de saber que o outro é seu igual – um olhar que transmuta tudo a seu redor. Sua identidade foi forjada nas lutas, na incompreensão alheia: no não, não, não…sua pluralidade é todos os gêneros num só sexo, num só homem, numa só mulher, num só pecado. Vai do cidadão de bem até o malandro, todos fazem parte desta mesma seara.
O subúrbio é feito da argamassa das frustrações e tristezas daqueles que acreditaram (e acreditam), que esse é o único espaço que lhes cabe. Mesmo sabendo que ela é o grande engenho que produz dor, mágoas e a cachaça que os empurra de goela abaixo todos os dias. Mesmo com todas essas agruras, permanecem lá, porque tudo isso é uma verdade, e só a verdade liberta.
A periferia sonha, cospe, desliga-se de tudo
Não para! É a máquina perpétua dessa loucura
É uma coisa perfeitamente insensível na infinita busca pelo nada
Das digressões que há tempo deixou outro nada
Das aflições que deterioram a ferragem
Os ossos, a fé, o possível nada…
E quem sabe até o amor que se traduz em nada.
Seu espaço vai do limite impercebível do nada, até o limite com a cidade… do imaginário dos jovens e adolescentes que sonham um dia tornarem-se reis dela toda. É tudo um só lugar onde tudo se incorpora a tudo, a todos, a cada ideia medíocre de possui um pedaço dela chamado lote, terreno, casa, barraco…ela se compõe e se manifesta em seus habitantes – nos silênciosdas frases, das bocas caladas, do grito abafado por uma ameaça – todasua gente com tempo vai se brutalizando nos instantes, é uma metamorfose ao contrário: da liberdade ao casulo e, ao resignado silêncio.
*Escritor e Cronista
Tel: +55 (95) 99138.1484
CONTRABANDO DE GASOLINA – E O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – Dolane Patrícia* – Edgar Oliveira Campos**
A gasolina no Estado de Roraima está custando em média R$ 3,90 (três reais e noventa centavos). O Estado faz fronteira com a Venezuela, onde a gasolina é vendida por aproximadamente R$ 0,06 (seis centavos).
Essa disparidade de valores entre dois países vizinhos desperta a prática do contrabando de gasolina. Mas qual a relação do crime de contrabando de combustível, nos moldes atuais, no que tange à realidade do Estado de Roraima e o princípio da insignificância?
Insta salientar que, embora muitas vezes utilizado de forma sinonímica, as expressões “princípio da insignificância” e “crime de bagatela” não possuem o mesmo teor semântico. O princípio da insignificância é utilizado para se referir à norma aplicável na solução de casos concretos, no passo que o crime de bagatela se refere a condutas típicas de pouca lesão. Isto representa dizer que o princípio da insignificância é aplicável em crimes de bagatela, ou seja, são termos que possuem esferas de existências próprias.
Além do princípio da insignificância, importa ressaltar outros princípios que estão intimamente ligados: O princípio da proporcionalidade e o princípio da intervenção mínima.
O princípio da proporcionalidade trata-se do correto balanceamento entre a gravidade da lesão produzida ao bem jurídico e a pena aplicada ao agente que a praticou. Visa coibir intervenções estatais que sejam desnecessárias e incompatíveis com a justa punição pelo ato praticado.
É clara a ligação do princípio da proporcionalidade com o da insignificância, pois este clama pela aplicação daquele. Impossível e injusto seria mencionar uma aplicação de pena a fato considerado irrelevante em seu aspecto material.
Outro princípio é o da intervenção mínima, que parte do pressuposto que o Direito Penal, por entrar diretamente na esfera pessoal do agente, só pode ser utilizado como último mecanismo na imposição de sanções.
Hodiernamente, o princípio da insignificância não é aceito nos tribunais nacionais quando se ref
ere a crimes de contrabando. O principal argumento que fundamenta a inaplicabilidade do princípio é da natureza proibitiva.
No entanto, já se sabe que o princípio da insignificância é fruto de princípios, tais como o da proporcionalidade e da intervenção mínima. Neste contexto, resta-nos refletirmos sobre a real necessidade de reconhecimento da infração bagatelar.
As situações específicas podem facilmente serem adaptadas ao contexto social em que o estado de Roraima se encontra, onde se nota a difusão da desigualdade social entre seus habitantes, paralelos no contraste econômico de países vizinhos, principalmente a Venezuela. Salienta-se também que o estado roraimense é partícipe de uma realidade única dentro do contexto nacional.
Isto porque é o único que divide fronteiras diretas com a Venezuela, país que possui combustível ao preço de R$ 0,06, de acordo com levantamento da agência Global PetrolPrice.
Obviamente, a constatação de pobreza ou desigualdade social em números alarmantes não justifica a conduta criminosa e, inclusive, é o entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça.
No entanto, há que se falar que as constantes omissões por parte do poder público na melhoria da qualidade de vida do cidadão roraimense recaem na chamada teoria da coculpabilidade, compreendida como a situação onde o Estado compensa sua omissão no momento da aplicação da pena.
Nessa prática, duas frentes são adotadas pelos contrabandistas, sendo estes denominados por “caroteiros” ou “tanqueiros”. Caroteiros são os agentes que acondicionam o combustível em diversos galões de plástico, regionalmente denominados como “carotes”. Os tanqueiros, por sua vez, tratam-se dos agentes que cometem o delito por meio da utilização de veículos com tanques de combustível adulterado.
A prática de contrabando não se mostra como uma atividade lucrativa individualmente. O perfil social dos agentes é concentrado em pessoas geralmente desempregadas, com baixa escolaridade e que iniciam tais práticas por circunstâncias de desemprego. Seria interessante que o Poder Judiciário roraimense inovasse no reconhecimento do princípio da insignificância, em crimes de contrabando de combustível, em casos de pequena quantidade, seguindo assim o posicionamento excepcional do STF e TRF da 1º Região, no que tange a práticas de delitos semelhantes.
Seria também de grande relevância a ação de políticas públicas que corrigissem a desproporção do preço do combustível no Estado de Roraima, visando diminuir o estímulo dessa prática, pois, como ensinava Michel Foucault: “Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou a refletir.”
*Advogada, Juíza Arbitral, mestre em desenvolvimento Regional da Amazônia.Pós-graduada em Direito Processual Civil
** Advogado, pós graduando em Direito Trabalho e processo do trabalho.
Como ajudar – Afonso Rodrigues de Oliveira*
“Não se pode ajudar os pobres arruinando os ricos.” (Abraham Lincoln)
A desinformação ainda é o maior problema no desenvolvimento da humanidade, no âmbito do ser humano. Como ainda não sabemos quem nem o que somos, somos vítimas do nosso desconhecimento.
Continuamos gritando quando deveríamos trabalhar em silêncio, mas com eficiência. Continuamos nos comportando como verdadeiros trogloditas. Quando queremos protestar contra alguma coisa, a primeira coisa que fazemos é começar a destruir. O que ratifica o pensamento da Cultura Racional: “O ser humano é o único animal que tem que destruir para poder construir.” E isso quando construímos depois de destruir. O que não fazemos, na maioria dos protestos de rua.
Nosso despreparo social ainda faz com que vejamos os ricos como nossos inimigos; os patrões como nossos rivais, e por aí afora. Ainda não entendemos que são os patrões que mantêm as famílias dos empregados. É a mesma coisa quando destruímos um prédio público para acordar o governo. E não entendemos que o custo da nova construção é pago pelos que derrubaram o prédio antigo. Não é o governo que paga. Ele apenas faz o pagamento com o nosso dinheiro. Quando paramos o movimento da fábrica, estamos dando prejuízo a quem necessita do dinheiro para nos manter. Simples pra dedéu.
Nós não precisamos de ajuda. Precisamos isso sim, de condições de vida. E nossas vidas são responsabilidade de cada um de nós. E não conseguiremos viver com dignidade enquanto não agirmos dignamente. Então vamos fazer nossa parte no desenvolvimento. E só conseguiremos isso quando soubermos escolher administradores públicos capazes. E só quando os tivermos, poderemos nos orgulhar de nós mesmos. No que fizemos, e fazemos pelo engrandecimento da humanidade. E não se trata de engrandecimento populacional, mas de avanço na construção de uma humanidade racional. Onde cada um de nós se reconheça como responsável pelo seu desenvolvimento. E só conseguiremos isso com respeito, amor e dedicação.
Pare de reclamar. Você nunca vai conseguir o que realmente quer esperando que os outros façam por você o que você mesmo, ou mesma, deve fazer. Então faça. Todos nós precisamos de administradores públicos que nos honrem, nos respeitando. Mas somos nós que devemos mostrar para eles o quanto somos respeitáveis. Porque só assim seremos respeitados. Comece fazendo isso nas próximas eleições. Mostre o quanto você merece para merecer ser considerado um cidadão, ou cidadã. Eduquemo-nos para merecer o voto facultativo. Sem ele não seremos cidadãos. Mas temos que merecê-lo, com educação política. Pense nisso.
*Articulista
99121-1460