O Deus poeta – Walber Aguiar*Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou de antemão para que andássemos nelas. Efésios 2:8Era um dia como outro qualquer. Talvez nem fosse. Dia de entender por quem os sinos dobram. De tentar compreender por que um só Deus ao mesmo tempo é três. De dançar, conforme textos de Kivitz e Caio Fábio, com o Deus que está tanto na poesia quantos nos chinelos, tanto nas coisas loucas quanto nas disparatadas.
Assim, não dá pra encarar o divino no quadro estereotipado dos “artistas” do legalismo, dos “mestres” da religião farisaica, dos escritores da letra morta. Não dá pra conceber aquele Deus de queixo comprido, com cara de São Benedito, pois o rosto do Sagrado sempre tem que comportar o brilho das cores, a leveza do infinito, a efetividade da palavra poética.
Ora, ao elegermos um projeto de espiritualidade integral, ou holística, carregamos na bagagem cotidiana o louvor, o lazer, o trato com o dinheiro, a coisa pública, a indignação, a palavra profética contra os governantes corruptos e tudo aquilo que consiga comportar a vida.
Sem dúvida, a arte aparece como elementos redutivos do ser em conflito conseguem mesmo e com a complexidade existencial que o circunda.
Com isso, o Deus poeta se manifesta. Quando Paulo diz que somos feitura dele, quer dizer que somos poesia de Deus, verso do sagrado, estilização do autor de todas as palavras.
A arte de mexer com as letras e dar significado a tudo passa pela angústia de Drummond, quando o mesmo diz: Meu Deus / por que me abandonaste/se sabias que eu não era Deus/ se sabias que eu era fraco…
Também pela poética romântica de Vinicius de Moraes, pelo toque estilizado de Allinge Mafra Mcnight.
Deus se revela na face de Ferreira Gullar, com seu canto de protesto, sua rebeldia, seu desejo de entender a dualidade do universo no poema traduzir-se.
Também figura o divino na arte de Thiago de Mello, o poeta de Barreirinha, quando este traduz para vários idiomas sua declaração universal dos direitos do homem, onde menciona… Que a verdade será servida antes da sobremesa…
Ora, se Deus se reveste de simplicidade e calçam as sandálias do pescador, isso pode ser revestido de poesia. No entanto, não dá pra ficar contando estrelinhas e rimando o universo sem a gravidade da palavra profética. Deus consegue vaticinar com gravidade, ainda que carregue consigo um carrinho de mão cheio de flores que enfeitam e dão cheiro à podridão pela qual somos abrigados a passar.
Uma das letras mais fascinantes de Renato Russo diz: venha/ meu coração está com pressa/ e vem chegando a primavera/ nosso futuro recomeça/ venha que o que vem é perfeição… Faz lembrar Salomão, quando diz que “a esperança que se adia faz adoecer o coração”. Embora as cabeças roxas da religião distorçam as palavras e hipertrofie a graça do Deus poeta, este vai continuar redimindo através do belo e da sensibilidade das manifestações artísticas. Por isso, temos que captar cada detalhe que Deus deixa cair no caminho em forma de graça e ludicidade. O que passar disso pertence aos caretas, que não gostam de poesia nem tiram Deus pra dançar…
*Poeta, professor de filosofia, historiador e membro da Academia Roraimense de [email protected]
Falar e escrever bem o português é dever de todo brasileiro – Marlene de Andrade*Lembro-me que quando entrei na faculdade de Medicina da UFF ouvia alguns profissionais dessa área afirmar que médico não precisava saber português bem, e sim medicina. Que visão míope! Graças a Deus eu tive um professor de português excelente no curso ginasial e que sempre dizia que a língua portuguesa era uma matéria importantíssima para qualquer área profissional. E na hora de ensinar ele era fera, pois dava dicas e transmitia suas aulas com muita didática.
E tem mais: ele adorava dar regras como, por exemplo, toda palavra começada com en, ele nos ensinou que seguida do som cha, che, chi , cho e chu é sempre com x, com exceção de enchiqueirar, enchente e encharque, pois essas palavras no seu original já possuem ch. Entre outras dicas, ele nos passou também regras para usar o z, e não o s; e vice-versa. E, diga-se de passagem, que esse erro é muito comum até mesmo entre pessoas de 3º grau. E o melhor de tudo é que ele ensinava de um jeito tão especial que eu ficava cada vez mais interessada em aprender nosso idioma.
De uma coisa eu sei: aquele monte de regras que esse professor nos dava era maravilhoso porque a gente tinha vontade, pelo menos eu tinha, de assistir a aula dele com um enorme interesse, pois, para mim, português passava ser menos complicado. Pena que ainda não domino nossa língua como gostaria, mas quem sabe ainda consiga aprender cada vez mais esse nosso lindo idioma mesmo sendo na qualidade de autodidata.
Segundo Dicionário Aurélio Eletrônico, a comunicação é o ato ou efeito de comunicar (-se), ou seja, emitir, transmitir e receber mensagens. Esse mesmo dicionário ainda explica que comunicar é a capacidade de trocar ou discutir ideias, dialogar, conversar, com vista ao bom entendimento entre pessoas. Sendo assim, quando alguém afirma que saber português não é muito importante está totalmente equivocado. Já pensou, por exemplo, um advogado que não sabe escrever bem o português? Que desastre! E esse problema deve ser vencido, por qualquer profissional, principalmente aqueles que lidam muito com a escrita e com a comunicação falada.
Eu já vi até doutores confundir o estar quando deveria usar o está. Fui assistente técnica de uma empresa cuja perita nomeada pelo juízo usou estar no lugar de está várias vezes. E esse foi só um dos erros que percebi no laudo dela. Sei que nossa língua não é fácil, mas essa barreira tem que ser vencida e nós devemos nos comunicar verbalmente e/ou através da escrita de forma correta, pois isso é até uma obrigação.
*Médica Especialista em Medicina do Trabalho/ANAMT
Por que o clássico? – Afonso Rodrigues de Oliveira*“Por que atribular-se com o dia a dia? A sabedoria do cosmo te inspira. É só ligar o canal”. Ligar o canal é estar livre mentalmente. Você não imagina o bem que faria a seu filhinho, nos primeiros dias e anos da idade dele, se fizesse esse exercício: ligar uma música clássica em som bem baixinho, enquanto você o faz dormir; uma canção de niná, por exemplo, bastaria. E isso não tem nada a ver com sua condição social. Nem quer dizer que seu filho venha a ser um apaixonado, ou coisa assim, pela música clássica. Mas ele sempre a terá como um alimento saudável para o espírito. Com certeza.
Sou filho de pais humildes, de pouca instrução. No entanto vivi uma infância feliz. E a música clássica sempre esteve em meus ambientes. E Sempre da maneira mais inusitada. Eu ainda era criança e morávamos em Parnamirim – RN. Em frente à nossa casa tinha um desses aparelhos se som, usados antigamente, nos postes das ruas, para transmissão das estações de rádio. Todas as manhãs eu acordava ao som de “Clair de Lune”, do Claude Debussy. Não sei se meus pais e irmãos prestavam atenção à música que nos acordava todo os dias, às seis da manhã. Mas eu me sentia bem.
Já falei, aqui, do dia, recentemente, em que fui assistir, no Teatro Municipal de São Paulo, a um espetáculo musical para crianças, à noite. A apresentação foi da música “Pedro e o Lobo”. Apaixonei-me pelo espetáculo, pelo fato de ele ter sido dedicado a crianças dos subúrbios. No intervalo da peça, o maestro veio à ribalta e explicou para as crianças, o que representava cada instrumento, apresentando um animal da história.
O assunto aqui está parecendo confuso. Mas é que não tenho tanto espaço para falar mais claramente. Mas o que mais me chamou a atenção foi a importância que aquela apresentação teve para cada uma daquelas crianças suburbanos que lotaram o Teatro. Muito provavelmente, a maioria daquelas crianças não volte ao teatro, mas, com certeza, nenhuma delas jamais esquecerá aquele momento. Faça isso com seu filho.
Lembrei-me disso, ontem quando voltava para casa.
Sempre que passo por ali, na Rua Lobo D´almada, há alguém ensaiando ao piano. Ontem, mas à frente, tive que parar, porque havia na outra esquina, outra pessoa ensaiando, também ao piano. Lembrei-me da minha infância, mas com outro assunto que falarei depois. Era quando eu voltava da escola e passava pela casa daquele músico da Orquestra Sinfônica, e ele estava sempre ensaiando ao trombone. Era legal pra dedéu. Eu sempre ficava parado na outra calçada vendo-o caminhando pela sala e tocando o instrumento, no ensaio. Pense nisso.