Bom dia,
“Devagar com o santo porque o andor é de barro”, diz o velho adágio popular. “Prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”, diz outra pérola tirada da sabedoria popular. Ambos os ensinamentos querem se referir aos que rapidamente agem e tiram suas conclusões de aparências que muitas vezes não se sustentam ao passar do tempo ou a mudanças que muitas vezes surgem apesar de tudo. No campo de política esses ensinamentos são ainda mais úteis e não custa lembrar do velho político mineiro Magalhães Pinto que disse certa vez que “Política é como nuvem. Toda vez que você olha ela está de forma diferente”. Aqui em Roraima, acólitos atribuíram erroneamente essas expressões a Ottomar Pinto, que foi esperto, mas nunca sábio.
E por que estamos lembrando esses retalhos de sabedoria? É que tem muito admirador e torcedor do futuro governo de Jair Bolsonaro (PSL) dizendo arrogantemente que a esquerda no Brasil nunca mais volta ao poder. E que o novo poder que se instala a partir de 1º de janeiro de 2019, vai permanecer comandando o país por muitos e muitos anos, com capacidade para desaparelhar as estruturas do Estado, nos diversos poderes e órgãos, hoje flagrantemente dominadas pela esquerda, sob as mais variadas matizes, até mesmo pela chamada esquerda caviar, aquela que vive como elite, mas paga de socialista.
Claro, quem quer um Brasil mais forte economicamente e tem horror a este país de coitadinhos, onde o mérito é o que menos conta, torce para que as ideias mestras do liberalismo prometido pelo novo governo sejam bem-sucedidas, e que possamos criar uma pátria menos servil aos interesses internacionais, inclusive da banca financeira. Acontece que entre o discurso e a prática de governo há uma enorme diferença; também não custa ter a sabedoria para perceber que as forças que representam a vanguarda do atraso existem, e vão reaglutinar-se em torno de propostas alternativas, e às vezes encantadoramente enganadoras.
Na semana passada, morreu nos Estados Unidos da América (EUA) o 41º presidente estadunidense, George H. W. Bush, o pai, um presidente republicano/conservador, que ganhou a primeira guerra contra o Iraque, e alcançou inacreditáveis 90% de popularidade entre seus compatriotas. Dois anos depois, Bush Pai foi inapelavelmente vencido por Bill Clinton, do partido Democrata, uma espécie de PT norte-americano. E onde falhou Bush Pai? Embora tenha virado quase um herói nacional, ele foi malsucedido na esfera econômica, incapaz de fazer o emprego e a renda crescer numa América que já começava a dar sinais de recessão. Bush Pai continuou um político admirado até morrer, mas não logrou reeleger-se, o que é quase uma regra entre os norte-americanos.
E estamos escrevendo sobre essas coisas para lembrar que o novo governo ainda não começou e que vai enfrentar uma pedreira pela frente. A começar pela questão econômica que é marcada pela mais profunda recessão que se prolonga por mais de cinco anos, uma das mais longas do país. O Brasil tem de voltar a crescer, afinal, boa parte dos 57 milhões de brasileiros e brasileiras que votaram em Bolsonaro, com certeza, o fizeram na esperança de que ele faria a economia tupiniquim girar com mais robustez, e gerar os mais de 20 milhões de empregos capazes de dar alento aos mais de 25 milhões de desalentados ou subempregados existentes no país.
E essa tarefa não será fácil, mesmo que se tenha confiança na competência, e no conhecimento da equipe econômica chefiada pelo economista Paulo Guedes, que já começa acossado por acusações partidas do Ministério Público Federal. Profissional acreditado pelo mercado, especialmente o financeiro, o futuro czar da economia terá que enfrentar o confronto de interesse entre a ciranda financeira e o setor produtivo. E terá um trabalho gigantesco para reverter a tendência de desindustrialização da economia brasileira, que cresceu nos últimos anos com base no setor de serviço de má qualidade e baixa produtividade. Se não conseguir vencer essas batalhas o governo Bolsonaro começará a perder rapidamente capital político.
O trabalho na frente econômica do novo governo começará pela arrumação das contas públicas, outra tarefa hercúlea que fere interesses corporativos que se mostram fortíssimos, especialmente da elite dos servidores públicos. E o round inicial e definitivo do novo governo vai ser disputado ainda no primeiro semestre do próximo ano, com a votação da reforma da Previdência Social. A aprovação dela será o ponto de partida para que o novo governo possa encaminhar as demais propostas estruturantes que prometeu em campanha.
Vai ser a hora da verdade, inclusive, para mostrar que o novo governo conseguiu formar uma maioria congressual – sem adotar a prática do toma lá, dá cá –, capaz de aprovar as várias propostas, sem as quais não haverá possibilidade de cumprimento das maiores e melhores promessas de campanha. Tomara que consiga.