A decisão da Receita Federal de anunciar que a instrução normativa que modificava as regras de monitoramento do pix foi revogada representa uma derrota e uma vitória ao mesmo tempo. Derrota do governo Lula, que sangrava politicamente com os duros ataques da oposição. Vitória das fake news nas redes sociais e aplicativo de mensagens instantâneas.
A questão mexe diretamente com outro tema, a regulamentação das redes sociais no momento em que a Meta quer finalizar seu programa de verificação de fatos nas plataformas Instagram, Facebook e WhatsApp. A Meta não quer mais manter uma empresa de verificação, adotando “notas de comunidade” em que os próprios usuários farão as correções, algo parecido com o que é utilizado pelo X (ex-Twitter).
O recuo do governo Lula não diz respeito apenas às questões das fake news, pois, de fato, havia muitas dúvidas reais da população quanto a garantia de que autônomos e outros profissionais não pudessem ser taxados futuramente, em especial aqueles que têm movimentações acima de R$5 mil por mês. As fake news somente complicaram ainda mais o que estava meio obscuro.
Em um país escaldado por um passado de confisco da poupança, não bastou o governo divulgar que o alvo das mudanças eram os traficantes de drogas que movimentam altas somas de dinheiro ilegal e golpistas de toda ordem que roubam dinheiro pela internet. Com as mentiras funcionando como um forte poder paralelo, a tática de pegar grandes sonegadores acabou assustando a população em geral, que tem no pix uma transação financeira rápida, segura e sem imposto.
Mais que nunca, esse episódio que impôs uma humilhação histórica ao governo Lula precisa servir de exemplo para que o país não baixe a guarda sobre o combate às fake news e que continue mostrando às grandes big techs que o Brasil tem leis e que a internet não é um território de vale-tudo. Aqui temos o Marco Civil da Internet, estabelecido pela Lei 12.965/2014, que impõe responsabilidades e limites.
A decisão da Meta de acabar com o instituto da verificação em suas plataformas ocorre em um momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) está julgando recursos extraordinários que tratam da responsabilidade civil das plataformas da internet por conteúdos de terceiros e a possibilidade de remoção de material ofensivo, a pedido dos ofendidos, sem a necessidade de ordem judicial.
O que o STF está julgando é se o artigo 19 da lei é constitucional ou não, pois os provedores de internet entendem que não são responsáveis por conteúdos de terceiros, bastando remover os conteúdos para se livrarem de ações judiciais movidas por pessoas que se sentirem atingidas por mentiras e outros tipos de ataques sórdidos na internet.
O Marco Civil precisa ser esse instrumento de defesa da liberdade de expressão dos usuários, entendendo que essa liberdade tem limites e responsabilidades, especialmente pelas grandes empresas que não querem ter mais nenhuma responsabilidade para combater a desinformação e, desta forma, abrir caminho para a política extremista que se fortalecerá com a realidade dos Estados Unidos com Donald Trump de volta à presidência.
Logo, a reviravolta do pix é apenas mais um exemplo do que a mentira é capaz. Já tivemos o episódio de extremismo incentivado pelas redes sociais com a invasão do Congresso Nacional, em 8 de janeiro do ano passado, e o caso do homem que se explodiu em frente ao prédio do STF. Além de vários outros casos em que pessoas foram trucidadas por causa de mentiras na internet. Os fatos estão bem vivos.
*Colunista