Jessé Souza

Projeto de poder passou pelo destrocamento da saude indigena e a legalizacao do garimpo 15249

Projeto de poder passou pelo destroçamento da saúde indígena e a legalização do garimpo

Jessé Souza*

O que o presidente Lula e sua comitiva viram em Roraima, em relação à grave situação da saúde das crianças e idosos Yanomami, é uma faceta do que foi o governo Bolsonaro, ao ter colocado em prática não um projeto político, mas um projeto de poder tirânico, que tinha na legalização do garimpo em terras indígenas um de seus grandes tentáculos, ao lado da liberação de armas.

Bolsonaro nunca escondeu quando falava que o Estado de Roraima era “a menina de seus olhos”, o que pode ser traduzido como o local ideal para colocar em prática seus projetos mais urgentes, como a negação e a redução dos direitos dos povos indígenas; e o avanço do garimpo como um grande negócio a ser explorado e, de quebra, o golpe final contra a sobrevivência dos povos indígenas, como pôde ser visto na Terra Yanomami.

Roraima também se tornou um exemplo concreto da retórica ideológica sobre uma suposta venezuelização do país no caso de a esquerda voltasse ao poder.   Esse discurso escondia em seu seio o fato de as Organizações Não Governamentais (ONGs), colocadas como demônios a serem combatidos, se tornarem as principais responsáveis por dar todo apoio aos venezuelanos que chegam ao país com fome, sem moradia e sem emprego.

Filho de garimpeiro que viveu em Serra Pelada, para onde foram mais de 100 mil garimpeiros em buscava da riqueza fácil na floresta do Pará nos anos 1980, Bolsonaro fez de tudo em seu governo para acabar com as restrições ao garimpo ilegal e liberar esta atividade nas terras indígenas. Um deles foi a criação de um programa de apoio ao garimpo artesanal, cujo decreto já foi revogado.

O general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência,          se tornou a peça fundamental para o avanço de projetos de exploração de ouro na Amazônia em torno das terras indígenas e nas áreas fronteiriças. Ele era o secretário-executivo do Conselho de Defesa responsável por dar aval a projetos de mineração em regiões de fronteira.

Mais de uma centena de autorizações de mineração foram concedidas na Amazônia pelo general, incluindo permissões de pesquisas e de lavra de minérios. A mais recente decisão foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) do dia 15 de dezembro passado, em que o general Heleno concedeu autorização para uma mulher condenada por tráfico de drogas para exploração de ouro em uma área de 9,8 mil hectares vizinha à Terra Indígena Yanomami.

Legalizar o garimpo em torno de terra indígena era a tática para que essas áreas sirvam de porta de entrada e ponto de apoio a garimpeiros ilegais, como é feito atualmente, em que fazendas nessas áreas são alugadas por empresários de garimpo, os quais contam inclusive com as mesmas aeronaves que recebem recursos federais para atender a saúde indígena, conforme foi relatado por esta Coluna no artigo do dia 16, intitulado “O grande desafio da política indigenista que passa pelo comando da Sesai”.

Pela entrevista que a ministra da Saúde, Nísia Trindade, concedeu no sábado, 21, quando esteve em Boa Vista com a comitiva presidencial, ela afirmou que a solução dos graves problemas de saúde dos Yanomami passa pelo combate ao garimpo ilegal, conforme esta Coluna vem afirmando reiteradas vezes. E não será fácil operar este combate, pois o esquema que tomou conta do setor é poderosíssimo e conta com apoio de políticos, que já estão se movimentando.

Mas o passo principal já foi dado, que é recuperar a saúde indígena destroçada pelo governo anterior, cuja tática começou a ser colocada em prática a partir da saída de médicos estrangeiros do programa Mais Médicos, seguido do corte de verbas da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), quando começou o caos na assistência nas terras indígenas de todo o país. A situação dos Yanomami é consequência disso.

Agora, resta acompanhar o desenrolar dos fatos…

*Colunista