O Estado de Roraima era para ser exemplo para o país no que diz respeito ao combate à criminalidade. Mas os fatos demonstram que não existe vontade política para isso. O tema ressurge diante do lançamento, pelo Governo Federal, na segunda-feira, 02, do Programa Nacional de Enfrentamento a Organizações Criminosas que terá R$ 900 milhões para investimentos em segurança pública nos estados.
Umas das principais metas do programa a serem alcançadas, até 2026, são a redução no número de mortes violentas e o aumento na apreensão de armas e drogas. Para isso, o Governo Federal quer fortalecer a investigação criminal e as atividades de inteligência nos estados visando desarticular as organizações criminosas. É aqui onde Roraima entra no enredo como um Estado que, por anos, deixou de fazer a lição de casa, seja por incompetência mesmo, seja por falta de vontade política.
Não se trata apenas do atual governo, que entrou para o segundo mandato, mas de algo estrutural na política local que, por motivos muitas vezes nem tão ocultos assim, prefere que a situação fique como está por conveniências que não podem ser explicadas em um simples texto, pois há claros interesses escusos no meio de muita coisa implícita. Aos fatos.
Lançado há 15 anos, um importante projeto de videomonitoramento no combate à violência e à criminalidade nunca foi executado em sua plenitude, ficando inoperante. Trata-se do sistema Enafron (Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras), planejado por meio de convênio com a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp). O desenrolar dos fatos explica muito bem o desmantelo.
O lançamento do Enafron foi em 2008, no governo José de Anchieta Junior, mas só começou a ser executado em 2013, no governo Chico Rodrigues, e passando a ser implementado em 2015, no governo Suely Campos, mas até hoje, no segundo governo de Antonio Denarium, segue sem serventia para os planos traçados lá atrás, há uma década e meia. Passou de mão em mão sem que houvesse interesse político.
Enquanto os seguidos governos mostravam sem interesse e desorganizados, os criminosos já estavam se organizando, com fortalecimento das facções, as quais entraram em uma violenta disputa, quando as maiores organizações criminosas do país se estabeleceram por aqui: PCC (Primeiro Comando da Capital), CV (Comando Vermelho) e FDN (Família do Norte). Todos de olho na nova rota de tráfico internacional de armas e drogas.
Enquanto os políticos brigavam pelo poder, pela primeira vez na história das medições de homicídios no país um Estado do Norte apareceu na liderança no ranking de assassinatos no Brasil. Conforme o 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, Roraima terminou 2018 com 348 crimes violentos letais intencionais, ou 66,6 mortes para cada 100 mil habitantes, enquanto a média nacional foi de 27,5 por 100 mil.
De lá para cá, o crime organizado só se fortaleceu, se aproveitando da migração em massa desordenada de venezuelanos e do escancaramento do garimpo ilegal na Terra Yanomami, nos últimos quatro anos. E o governo local só patinando no dever de casa desde o fracasso do sistema Enafron, que foi empurrado pela barriga nos seguidos governos. O projeto previa interligação de câmeras de videomonitoramento em Boa Vista, Bonfim, Caracaraí, Pacaraima e Rorainópolis.
Não há dúvida de que este ano baterá um novo recorde de criminalidade. Já que propositalmente não há estatísticas locais sobre mortes violentas, então é só esperar os números do Anuário Brasileiro de Segurança Pública do próximo ano. Lá estarão as digitais dos seguidos governos que viram o crime se organizar, mas não agiram à altura para conter. É esperar para ver, infelizmente.
*Colunista