Sobre vida e morteMeu pai dizia que ele não tinha medo de morrer, e sim de ficar agonizando até a morte. Seus temores se concretizaram depois de um atropelamento no trânsito, seguido de uma cirurgia de próstata e, por último, o Alzheimer – talvez um antídoto para esquecer o momento de dor de seus últimos dias.
Comento a respeito da morte depois de ir ao velório de Dona Marlene Honorato, na Igreja Consolata, mãe de amigos de infância, Mário César, Nilton, Júlio, Márcia Saad e todos os demais parentes que viveram no bairro São Vicente por longos anos, quando ainda era uma periferia cercada por lavrados e um lago onde hoje é a Cadeia Pública de Boa Vista.
A morte assombra, sim, porque somos seres humanos inquietos sobre a eterna dúvida de onde viemos e para onde iremos quando o coração parar de bater e alma sacar desse corpo frágil. E por isso somos tão suscetíveis a todos os tipos de enganação, pois somos filhos da incerteza e, quem não se apega a Deus, perambula na inquietude de não saber de sua origem e de seu destino.
Diz a Bíblia: “Para tudo há o seu tempo. Há tempo para nascer e tempo para morrer”. E não resta outro final senão a morte. E queremos que ela não seja sofrida, mais do que a vida nos impõe de desafios e sofrimentos. Quem sabe morrer em casa, dormindo, sem dor, com o corpo no leito tranquilo rodeado da família, sem leito de UTI, sem tubos e sem corpo dilacerado.
O fato é que não queremos morrer. Não queremos deixar esse nascer do sol toda manhã, com cores quase laranja avermelhado, um quase rosa de um tela do Grande Arquiteto; ou não poder mais ver o pôr do sol com espetáculo de cores e sombras marcando o horizonte a cada fim do dia.
Mas não iremos ficar para sempre. Partiremos a qualquer momento, quando o chamado vier de forma fatal. E talvez nem tenhamos tempo para se arrepender, para se despedir, para dar aquele último abraço, dizer aquelas palavras que foram adiadas por anos ou apenas se divertir no final de semana com aqueles que amamos.
É por isso que devemos fazer a nossa vida valer a pena, independente de religião ou não, de fé ou não. Há um sentido que talvez não compreendamos e um propósito maior. Seria muito injusto e triste a gente vir para este mundo para, no final, desaparecermos para sempre, até das lembranças por parte daqueles que estimamos.
Apesar das dores, dos tombos, da cadeira de roda, da prótese, do carnê da prestação no final do mês, do aluguel, do preço caro para se viver em paz, não queremos partir. Nem os pregadores querem ir na frente experimentar o deleite do Paraíso. Queremos ficar. Nisso, estou com Rubem Alves, que já fez a grande viagem: “A vida é tão boa! Não quero ir embora…”. *[email protected]