Trânsito e papelãoPor que têm ocorrido muitos acidentes com mortes violentas no trânsito a cada semana? Somos um Estado de condutores irresponsáveis? Ou de motoristas ruins e mal-formados? Ou somos reflexos de um Estado onde as autoridades de trânsito estão falhando?
Embora possa parecer difícil a resposta, ela não é complicada de ser respondida. Somos consequência de tudo isso e mais um pouco. Senão, vejamos, a começar pela formação de condutores. Não faz muito tempo, antes da mudança para o atual Código de Trânsito Brasileiro (CTB), éramos um Estado onde Carteira de Habilitação era distribuída como se doava buchada na fila do assistencialismo.
O governo local fazia campanha eleitoral distribuindo habilitação em grandes “mutirões” no interior do Estado. Os candidatos e políticos organizavam caravanas com churrasco, cachaça e forró nos municípios onde os “testes” iriam ser feitos.
Esses “testes” poderiam ser feitos assim, pois não haveria muita diferença: jogar a carteia para cima e quem pegasse e colasse a foto primeiro sairia habilitado. Sim, pois as provas teóricas e práticas eram apenas uma mera formalidade. E hoje esses condutores, acima dos 40 anos ou até um pouco menos, estão por aí, dirigindo sem nunca ter aprendido nada.
Quando acabou a “farra da habilitação”, surgiu uma nova forma de farrear: a abertura de autoescolas por políticos, que usavam esses centros de formação para fazer campanha eleitoral. Como as fiscalizações eram precárias e o órgão de trânsito sempre esteve nas mãos de político, dá para se imaginar como esse processo ocorreu.
Sendo assim, muitos condutores roraimenses foram “formados” para conduzir veículos em Roraima. E as blitze, não faz muito tempo, também funcionavam de acordo com ano eleitoral. Quando havia eleição, as fiscalizações desapareciam, assim como os rigores da lei serviam apenas para os adversários políticos.
Somando-se a este tenebroso quadro, existe ainda a desorganização histórica dos órgãos de trânsito, que não receberam os investimentos necessários ao longo desses anos e que, por consequência, não conseguem cumprir o papel de organizar essa balbúrdia toda, esse monstrengo que caminha de forma lenta, descompassado e na base do remendo.
A situação chegou a um certo nível que a Prefeitura de Boa Vista decidiu tornar literal o serviço do papelão. Sim, colocou agentes de trânsito feito de papelão para simular a presença de agentes de verdade, de carne e osso. Isso resume tudo: servidores em gabinetes que não saem do ar-refrigerado do cargo ou do prédio público para ocupar os cruzamentos, as ruas, as avenidas e locais de grande fluxo.
Além disso, a engenharia de trânsito não funciona, os projetos de mobilidade não aconteceram, redutores de velocidade inexistem e não há ninguém pensando para o futuro, em preparar a cidade e o transporte urbano para combater o caos de forma definitiva. O trânsito roraimense é reflexo do que fomos no passado e do que somos hoje.
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