Vendilhões e a fé
Tenho evitado tratar de religião. Não por temer qualquer castigado vindo de algum raio que vá me partir ao meio, mas porque cansei de fanáticos religiosos que acham que têm o poder de mandar qualquer um para o inferno, como se fossem procuradores do próprio Deus Pai Todo Poderoso, ou que acham que todos, indistintamente, devem a adotar a Bíblica como uma lei que valesse com força jurídica em nome do Estado.
Porém, a última de Silas Malafaia não pode passar em branco nem ser tratado com desdém, pois este senhor enganou muita gente no início de seu trabalho, quando parecia que iria ser um religioso sério, diferenciado dos vendilhões do Templo que existem por aí. Ledo engano – e eu fui um dos que cheguei a escrever elogios a ele.
A decepção começou quando Malafaia veio a Roraima, disfarçado de pregador da Palavra, para pedir votos para o então governador Anchieta Junior (PSDB), aquele mesmo do “governo cupim”, responsável pela maior catástrofe administrativa que já tivemos na História desta terra forte e abençoada, que só ainda não faliu porque é realmente forte.
A gota d’água (os nordestinos poderiam chamar de “gota serena”) foi o vídeo que ele gravou conclamando os religiosos as desafiarem Deus para que Ele garanta a casa própria àqueles que vivem de aluguel, morando de favor na casa de parentes ou que pagam parcelas do financiamento habitacional.
No vídeo, não há desfaçatez ou qualquer pudor em escamotear algo. Malafaia conclama que seus seguidores paguem para a igreja um mês do valor do aluguel ou da mensalidade do financiamento, de forma parcelada, em envelopes devidamente identificados para que Deus não se engane que aquele valor é destinado ao desafio (ele chama de “plantar a semente” da casa própria).
Nem desempregado escapou: quem recebe ajuda ou favores financeiros também foi intimado a pagar 30% do valor (seja qualquer valor) que a pessoa recebe de ajuda a título de “desafio a Deus”. Não há dúvida: trata-se da essência da comercialização da fé e da exploração financeira de quem é levado a crer que Deus cobra dinheiro para distribuir milagres e bênçãos.
Malafaia é mais um farsante que explora o sofrimento e as necessidades das pessoas em nome do Divino. É mais um que se envolve na política para enriquecer a custa da alienação e dos incautos que acham que Deus é um atalho para se conseguir bens, bastando pagar dízimos ou fazer “desafios financeiros” que nada mais são do que um estelionato.
No Brasil, criou-se não apenas uma disputa por fiéis pagadores de dízimo e de ofertas em troca de bênçãos ou prosperidade financeira, mas uma sistemática alienação religiosa que visa tornar cidadãos em pessoas reacionárias, que não conseguem diferenciar o que é fé, cidadania e estelionato. A fé é um mercado que sustenta milionários vendilhões do Templo travestidos de pastor. *[email protected]