Cotidiano

10% dos caminhoneiros que renovam CNH usam drogas, aponta pesquisa

De acordo com um estudo do SOS Estradas, dos 361 que solicitaram a renovação no Estado, ao menos 36 fazem uso de entorpecentes

Um estudo realizado pelo Programa de Segurança nas Estradas (SOS Estradas) apontou que 10% dos motoristas profissionais em Roraima que renovaram a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) nas categorias C, D e E fazem o uso regular de drogas. Conforme a pesquisa, dos 361 que solicitaram a renovação, ao menos 36 fazem uso de entorpecentes.

Desde o início de março deste ano, os motoristas portadores da CNH dessas categorias, que são necessárias para dirigir vans, ônibus e caminhões, são legalmente obrigados a fazer o exame toxicológico, popularmente chamado de “teste do cabelo”, que permite identificar o uso regular de drogas nos 90 dias que antecedem a coleta. A determinação está prevista na Lei 13.103/15, conhecida como Lei dos Caminhoneiros.

Apesar disso, a Justiça Federal em Roraima concedeu liminar, no início deste mês, ao Departamento Estadual de Trânsito (Detran) suspendendo a obrigatoriedade da realização do exame toxicológico para a renovação ou emissão de Carteira Nacional de Habilitação.

O coordenador do SOS Estradas e autor do estudo, Rodolfo Rizzotto, afirmou que é de conhecimento geral o grande volume de motoristas profissionais usuários de drogas. “Durante o estudo, verificamos que havia dezenas de pesquisas mostrando a gravidade do problema e nos trabalhos mínimos vimos que o índice de consumo de drogas era de 10%, principalmente entre os caminhoneiros, que são os que provocam os acidentes mais violentos”, disse.

Conforme ele, a pesquisa também comprovou que vários motoristas profissionais estão começando a se envolver com o mundo do crime. “Eles começam a lidar com traficantes e, em pouco tempo, se envolvem com o transporte de drogas para pagar a dívida com um traficante. Em outros casos, se envolvem com roubo de cargas, veículos e outros crimes, o que é absolutamente esperado porque quem usa droga se aproxima do mundo do crime”, afirmou.

O risco de acidentes e mortes nas estradas, segundo o coordenador, são as maiores consequências da não realização do exame toxicológico para renovação ou retirada de CNH. “Se são usuários regulares de drogas, muitos já provocaram acidentes que as autoridades sequer têm conhecimento. O fato é que estão recebendo uma licença para matar entregue pelos Detrans estaduais”, declarou.

Para Rizzotto, a alegação de que não há laboratórios suficientes para realizar os exames não é válida. “Em Boa Vista mesmo, eu sei que tem laboratório. Existem seis laboratórios credenciados que podem fazer exames no Brasil, alguns deles com parcerias com clínicas estrangeiras. O importante é ter rede de coleta, principalmente quando se trata de uma coleta tão simples como é o caso desse exame”, explicou.

O autor da pesquisa afirmou que o exame tem produzido resultados extraordinários “Nos Estados Unidos, as transportadoras reduziram a zero os acidentes com vítimas. Já existe uma legislação de exame toxicológico desde 1988, mas, no momento em que aparece com uma alternativa, vem o Detran e alega que não dá para aplicar”, frisou.

ESTUDO – No estudo foi estabelecido como percentual de possíveis usuários de drogas o índice de 10%, estimativa mínima encontrada entre os motoristas profissionais na média dos estudos já realizados nos meios acadêmicos e em ações do Ministério Público do Trabalho e da Polícia Rodoviária Federal. A maioria dos dados está disponível no estudo “As Drogas e os Motoristas Profissionais”, que pode ser acessado gratuitamente no www.estradas.com.br.

Detran explica pedido de liminar e diz que eficácia do exame é questionável

O Departamento Estadual de Trânsito (Detran) afirmou que, na data de entrada em vigor da cobrança do exame toxicológico, não havia em Roraima nenhum laboratório disponível para realizar a coleta ou análise das amostras, sendo esta a razão que motivou o pedido de liminar. “Todos os laboratórios que atualmente fazem parte da rede de coleta em Roraima foram disponibilizados após o protocolo da ação”, frisou.

O órgão afirmou que foram emitidas 296 CNHs para as categorias C, D e E isentas da realização do exame toxicológico em face da liminar concedida em abril de 2016. “Quanto ao quantitativo de motoristas usuários regulares de drogas que receberam CNH em Roraima, são números estimativos, destarte, não é razoável que este órgão comente os referidos dados, uma vez que desconhece a metodologia utilizada para obtenção da porcentagem adotada, principalmente, em virtude da gravidade da acusação”, desta a nota.

Alegou ainda precariedade do atendimento para a realização do exame, pois são apenas seis laboratórios credenciados junto ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) para realizar a análise das amostras de todos os condutores do país, nenhum deles na região Norte/Nordeste. “É válido salientar que este exame possui eficácia questionável, já que ao contrário do teste do etilômetro, o exame toxicológico tem período de detecção retrospectivo de 90 dias, com isso, eventualmente um condutor pode suspender o uso das drogas previstas na norma legal durante o respectivo período anterior a realização da coleta da amostra, garantindo assim o resultado ‘negativo’ de seu exame e, consequentemente, a renovação de sua CNH por cinco anos, podendo voltar a fazer uso de drogas logo após a coleta da amostra, ludibriando assim a fiscalização a qual se propõe a norma legal”.

Conforme o Detran, outro fator que seria relevante é a alegação já feita por outros órgãos executivos de trânsito quanto ao fato de que o exame não apresenta evidências científicas que comprovem sua eficácia para a segurança no trânsito e não encontra paralelo no mundo. “Nenhum dos 185 países signatários da Década de Ação para Segurança Viária, estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU), realiza o exame”, frisou. (L.G.C)