Cotidiano

323 crianças e adolescentes vítimas de crimes em Roraima

Esses números não envolvem somente brasileiros, mas também crianças e adolescentes imigrantes

De todos os casos de violência sexual, psicológica, doméstica e abandono notificados em Roraima, o público preferencial dos criminosos continua sendo crianças e adolescentes. Para se ter uma ideia do cenário, somente de janeiro a agosto deste ano, há 323 registros deste tipo de crimes ocorridos na capital, a maioria envolvendo violência sexual e vítimas entre zero a 17 anos.

Um dos exemplos é o da autônoma N. que era apenas uma criança de 11 anos quando foi abusada sexualmente pelo cunhado de sua mãe. Em 2017, ela já adulta, viu a filha de 4 anos passar pela mesma situação. A criança foi vítima do mesmo homem. “Há anos estou lutando para que esse indivíduo pague pelo mal que causou a nossa família, mas ainda não consegui”, disse. 

O caso faz parte das estatísticas da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), quando o assunto é abuso e violência sexual contra esse público. 

Segundo as estatísticas, entre os variados tipos de crimes, em 2017 foram registrados 324 boletins de ocorrência na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), da Polícia Civil de Roraima, e no ano seguinte foram 386, um aumento de 62 casos. O ano de 2019 nem encerrou, mas de janeiro a agosto já são 323 vítimas, número que pode ser muito maior pelo fato de que muitas não denunciam. 

A delegada titular da DPCA, Jaira Farias, explica que muitas famílias deixam de denunciar porque a maioria dos infratores faz parte do seio familiar. “É o pai, o padrasto, um tio. A maioria dos crimes é de violência sexual, principalmente casos de estupro de vulneráveis que têm como vítima meninas menores de 14 anos”, afirmou. Sem revelar a quantidade de casos, a delegada informou que dentro desses números estão crianças e adolescentes imigrantes.

Muitas das denúncias que chegam à delegacia são anônimas e outras são feitas pelas instituições que compõem a Rede de Proteção à Criança e Adolescente. “Depois desse momento, registramos um boletim de ocorrência aqui na delegacia, onde o próximo passo é a instauração de um inquérito policial. Realizamos a oitiva do comunicante, que pode ser o pai ou responsável pela vítima, que é encaminhada para exame de conjunção carnal no Instituto Médico Legal. Se o infrator tiver cometido ato libidinoso, ou seja, qualquer tipo de carícia, de toque que tenha conotação sexual, não é necessário esse exame”, esclareceu Jaira.

A vítima também é encaminhada para o Centro de Referência Especializado de Assistência (Creas) para atendimento psicológico, que envia à delegacia um relatório informativo do que foi apurado pelos psicólogos. “Nesse documento constam os resultados da conversa que esses profissionais tiveram com as crianças e adolescentes vítimas de violência. É um diálogo de forma lúdica, tranquilo, para não forçar muito a criança no seu relato, para que não seja revitimizada quanto à questão da violência psicológica”, explicou a delegada.

Jaira comentou que a Polícia Civil tem um espaço no Hospital da Criança e na Maternidade Nossa Senhora de Nazaré para prestar atendimento, após profissionais dessas duas unidades de saúde detectarem qualquer situação que a criança ou adolescente esteja sofrendo, como violência ou abuso sexual ou qualquer outro tipo de crime. “Temos uma equipe de plantão que já colhe no local o depoimento, registra a ocorrência, evitando assim que a vítima não venha à delegacia”, ressaltou. Ela informou que entre tantos tipos de crimes está a exploração sexual. “É em número menor e envolve adolescentes que estejam tendo caso com algum adulto em troca de dinheiro ou de algum bem material. Não é tão comum, mas temos”.

DPCA pode pedir prisão preventiva ou temporária 

Jaira Farias: “Muitas famílias deixam de denunciar porque a maioria dos infratores faz parte da família” (Foto: Nilzete Sampaio / Folha BV)

A delegada titular da Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente, Jaira Farias, explicou que após o encerramento das diligências se observa se a situação cabe prisão preventiva, que fica a critério do Judiciário, ou a prisão temporária, que tem um lapso de tempo. 

“Analisamos os requisitos dessas duas prisões e, dependendo da gravidade do delito, é determinada a prisão. Finalizamos o procedimento e encaminhamos para o Ministério Público, quando o promotor é quem delibera o que será feito. Ou seja, se vai ou não oferecer a denúncia para formalizar o processo, e aí o juiz decide se acata ou não a denúncia”, disse Jaira.

“Se acharmos que seja caso de prisão preventiva a gente pede, caso contrário, interrogamos o acusado aqui mesmo na delegacia e ele responderá em liberdade. A prisão preventiva é uma medida de natureza cautelar decretada pela autoridade judiciária”, esclareceu a delegada. (E.R.)