Cotidiano

Boa Vista registra aumento no número de moradores de rua

Entre os moradores de ruas estão migrantes que perderam o emprego e não conseguem mais colocação no mercado de trabalho

Boa Vista tem recebido muitos migrantes de cidades do interior e até de outros estados que vêm em busca de oportunidade de emprego e melhor qualidade de vida. Um efeito colateral desse deslocamento crescente é o aumento da população em situação de rua.

Dormir ao relento, em bancos de praça ou debaixo de pontes tem sido a rotina de dezenas de andarilhos na Capital. O número de moradores de ruas tem crescido nos últimos meses e já preocupa as autoridades. Ainda sem levantamento concreto para saber quantos moradores de rua existem na Capital, o problema vai se estendendo sem perspectiva de ser encontrada uma solução.

As ruas da cidade se tornaram a “casa” do gaúcho Gilberto Scarello, de 67 anos. Sem emprego e família, ele veio para o Estado em busca de oportunidades, mas acabou se desiludindo. “Vim para Boa Vista à procura de trabalho. Consegui trabalhar durante muito tempo na roça, mas acabei ficando sem emprego. Morei anos no interior e depois vim para Boa Vista e nem lembro mais há quanto tempo estou na rua”, disse.

Ele deixou para trás os dois filhos, que moram no Rio Grande do Sul, e perdeu contato com a família. “Na verdade, eles eram a minha única família, mas nunca mais tive contato. O que me faz seguir em frente são as pessoas boas que me ajudam e me dão comida. Eu durmo por tudo quanto é lugar, minha casa são as ruas”, relatou.

Situação parecida vive o aposentado Gercino Ventura, que há seis meses dorme em uma lanchonete abandonada ao lado do Instituto Médico Legal (IML) de Boa Vista. Ele veio de Minas Gerais, mas perdeu todos os documentos quando chegou a Boa Vista. “Não tenho documentos, não tenho nada. Eu tenho dinheiro para receber da minha aposentadoria, mas, sem minha identidade, não consigo”, afirmou.

Sem documentos e sem conseguir trabalho na Capital, o aposentado disse que não teve outra saída a não ser ficar na rua. “Tem seis meses que estou na rua. Já fiz de tudo e só estou nessa situação por causa da minha identidade. Não querem me dar porque não tenho registro de nascimento”, lamentou.

A amazonense Cleuza Guimarães trabalhava como cozinheira em uma casa de família, mas acabou sendo despejada e foi morar na rua com o companheiro. “É só por enquanto, porque perdemos o nosso trabalho. Estamos há quase uma semana assim. Meu esposo é de Minas e eu sou do Amazonas. A gente não quis pedir ajuda porque preferimos esperar para ver se conseguia emprego”, disse.

DROGAS – Enquanto alguns se viram sem condições de manter uma casa, outros acabam parando nas ruas por causa do vício nas drogas. Personagem que perambula há muito tempo pelas ruas da Capital e que virou figura conhecida da população, o usuário de drogas Danilo Vasconcelos dorme, todos os dias, no chão de uma praça no Centro. “É uma opção minha. Sou usuário há 30 anos e acredito que o que não tem solução, solucionado está”, disse.

Ele comemorava o fato de ter conseguido passar um dia longe do vício desde que começou a usar drogas. “Hoje eu estou limpo. Tinha muito tempo que não conseguia isso. Eu me sinto estranho sem usar drogas”, comentou.

Governo diz que presta assistência e Prefeitura afirma que tenta ajudar

Em nota, o Governo do Estado informou que recebeu, em 2015, aproximadamente duas mil pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas nos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas (Caps AD III) e Centro de Atenção Psicossocial (Caps III).

A atenção aos pacientes que possuem dependência química, segundo o governo, será reforçada até segundo semestre de 2016 com a inauguração da Unidade de Acolhimento Adulto (UAA), que auxiliará as ações da Rede de Atenção Psicossocial do Sistema Único de Saúde (SUS), funcionando como uma residência para tratamento prolongado de dependentes químicos. A Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) afirmou que pretende, com a implantação desse serviço, complementar o trabalho desenvolvido no Estado por meio do Caps AD, que será a porta de entrada para estes usuários e a unidade responsável por fazer o encaminhamento para a UAA.

Durante o período de tratamento, de até seis meses, o paciente terá acesso a um trabalho com foco no cuidado social e psicológico em parceira com o Caps AD.

Para proporcionar a busca ativa aos moradores de rua com transtornos mentais e/ou usuários de álcool, crack e outras drogas, o governo informou que foi pactuado no Plano Estadual da Raps a implantação de um Consultório na Rua pelo Município de Boa Vista, que será responsável por desempenhar atividades in loco de forma itinerante, desenvolvendo ações compartilhadas e integradas às Unidades Básicas de Saúde (UBS) e, quando necessário, também com as equipes dos Caps, dos serviços de Urgência e Emergência e de outros pontos de atenção, de acordo com a necessidade do usuário. Também foi pactuada a implantação, pelo município, da Unidade de Acolhimento Infantil, crianças e adolescentes com transtornos relacionados ao uso de álcool, crack e outras drogas.

PREFEITURA – Também em nota, a Prefeitura de Boa Vista esclareceu que a Secretaria Municipal de Gestão Social faz um trabalho de identificação para que estas pessoas possam ser colocadas em atividades dos programas sociais da prefeitura.

Sobre moradias, disse que aguarda liberação do programa “Minha Casa, Minha Vida”, administrado pelo Governo Federal, que, até o momento, não acenou prazo para que isso ocorra. “Equipes de agentes sociais percorrem as ruas da Capital na tentativa de identificar e ajudar, na medida do possível, pessoas que se encontrem em situação de risco e vulnerabilidade social”, frisou. (L.G.C)