Cotidiano

Clínicas oferecem serviços pouco eficientes, critica especialista

Para médica do Trabalho, Marlene de Andrade, ter equipamentos caros não significa entregar um resultado fiel à condição do futuro empregado

Está cada vez mais comum ver clínicas em Boa Vista que prestam atendimentos na área de Medicina do Trabalho se equiparem com aparelhos como os de eletrocardiograma (ECG) e eletroencefalograma (EEG), com a argumentação de apresentar exames mais profundos em relação à saúde e disposição do trabalhador que está sendo contratado pela empresa.

De acordo com a médica especializada em Medicina do Trabalho, Marlene de Andrade, essas clínicas informam a seus clientes, no caso os empregadores, a necessidade de o futuro empregado ter que se submeter a esses exames, mas os proprietários dessas clínicas não informam que o ECG e o EEG serão laudados por médicos de outros estados como, por exemplo, São Paulo, o que pode gerar uma grande margem de erros.

Marlene contou que vem recebendo diagnósticos de uma rede de clínicas de São Paulo, para que uma confirmação seja feita. Segundo ela, os resultados apontados a deixam perplexa com o quanto são vagos ou inconsistentes. “Por exemplo, em alguns aparece como ‘risco ergonômico – postura laboral’. Mas a análise ergométrica é feita no ambiente de trabalho, e não na clínica. Outros aparecerem como ‘risco de acidente de trabalho’. Mas todo ambiente de trabalho apresenta riscos de acidentes. Esse diagnóstico é vago demais. Não possui precisão, e por isso é preocupante, pois cada trabalhador precisa ser analisado com cuidado.”, relatou.

Além de resultados vagos, Marlene também relatou já ter presenciado redes que falsificam resultados de exames. “Teve um laboratório de análises clínicas, do Rio de Janeiro, que comecei a desconfiar de que estava elaborando resultados de forma fraudulenta e resolvi enviar guaraná como se fosse urina para fazer esse referido exame. E qual não foi sua surpresa? O resultado veio como se fosse realmente de urina com o agravante de ter resultado normal”, contou.

A médica reforçou que as clínicas podem apresentar os melhores equipamentos possíveis, mas o exame clínico, ou seja, a entrevista, e o exame físico, são soberanos, pois são estes que vão determinar a necessidade de quais outros diagnósticos. 

“Com 80% da realização de um exame clínico, já é possível apontar o que o paciente possui. Não é necessária uma lista enorme de exames para fazer. Na verdade, é ideal começar pela análise clínica, olhando nos olhos, examinando com calma, que é possível apontar uma possível necessidade de outros exames. Fazer tanta análise em máquinas é caro e pouco eficiente”, frisou.

As consequências de exames feitos apenas por máquinas podem ser as mais diversas. Muitos pacientes podem tentar esconder ou simular sintomas nesses produtos. Além disso, a máquina só será capaz de analisar o paciente em um único momento, e de forma não aprofundada. “Conheci um médico que fez eletrocardiograma para entrar na Marinha e que os resultados foram satisfatórios. Mesmo assim, ele enfartou aos 25 anos, jogando bola, e isso por quê? O exame de ECG por si só é superficial, ele não realiza um estudo do cotidiano da pessoa para saber a real condição dela e isso é perigosíssimo”, explicou.

A sala de exames da Marlene é pequena. Um espaço que conta somente com a mesa para recepção de pacientes e um leito. Para ela, que trabalha há mais de 20 anos no local, é mais que o suficiente para realizar seu procedimento. “Eu acabei perdendo prestígio devido ao ambiente humilde que possuo. Ter clínicas cheias de aparelhos parece a nova moda. O que é péssimo, pois quando olham para a simplicidade da minha estrutura, já tratam o meu local como inferior. Sendo que, quando vejo a necessidade de outros exames, encaminho para profissionais que tenho como confiáveis e aí aviso o empregador”, explicou.

RECOMENDAÇÃO – A médica especializada em Medicina do Trabalho explicou que existe um jeito simples de prevenir erros na prática do diagnóstico trabalhista: perguntar pelo currículo dos profissionais. “O médico possui o Registro de Qualificação de Especialidade (RQE)? Ele pode até ter, mas adquiriu como? Fazendo a prova da Associação Nacional de Medicina do Trabalho? Ou foi com a aplicação de residência médica? Peça currículo. Analise e veja se aquele é mesmo o profissional que você quer que esteja analisando seus trabalhadores, sua mão de obra. Os problemas de um mau diagnóstico podem ser diversos, então não corra esse risco! Você pode poupar dinheiro, tempo e até mesmo vidas”, concluiu. (P.B)