“A gente tem que parar de falar de política pública de controle de violência apenas com repressão e trabalhar com política pública de prevenção”. A afirmação é da juíza da Vara de Execução Penal, Graciete Sotto Mayor, que por 10 anos foi titular da Vara da Infância e Juventude em Roraima, ao tratar da redução da maioridade penal.
Ela complementa o entendimento, afirmando que a prevenção ocorre “só com Saúde e Educação de qualidade, para que os jovens possam se tornar verdadeiros cidadãos e não excluídos, o que vem acontecendo”, na opinião dela. Em entrevista exclusiva à Folha, Graciete Sotto Mayor combateu a campanha que vem sendo amplamente divulgada, principalmente nas redes sociais, em favor da redução da maioridade penal, que se tornou assunto polêmico com debates extremados, inclusive no Congresso Nacional.
“O Brasil é o quarto país em número de encarceramento e, apesar de muita reclamação com relação ao ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente], são poucos os estados que cumprem a determinação legal, que é a medida de internação como extrema de exceção. A partir do momento em que a gente possa realmente fazer um trabalho consistente, não será preciso encarcerar, muito pelo contrário, a gente precisa muito mais ressocializar”, argumentou.
Para a magistrada, falta informação às pessoas que defendem essa redução como fator de diminuição aos índices de criminalidade. “A maior parte das campanhas ocorre logo depois de algum fato mobilizador. Ocorre um fato cometido por um adolescente, com exposição midiática, faz-se uma campanha para saber quem é a favor ou quem é contra. Em compensação, você não vê o histórico daquele jovem que cometeu o delito”, pondera.
Graciete questiona ainda: “Será que se ele [o jovem infrator] tivesse todas as condições sociais favoráveis, chegaria à delinquência? O que tem levado esses jovens a cometer delito? Quando era juíza da Infância, as crianças começavam a usar drogas partir dos 12 anos, hoje começam aos oito. São algumas informações que é preciso ter”, destacou.
Ela ressaltou também que geralmente jovens infratores não chegam à delinquência sozinhos. “Eles são conduzidos por um adulto. E o que a gente está fazendo com esse adulto? Vamos reprimir apenas o jovem? Só o encarceramento no Brasil tem dado certo? Nosso sistema prisional funciona? Uma hora ele [infrator] vai ter que voltar para a sociedade, e o que estamos devolvendo à sociedade? Um jovem cidadão ou um novo criminoso?”, questionou.
Graciete conclui afirmando que a responsabilidade dessa situação pode ser atribuída ao sistema. “Se a gente for pensar Educação e Saúde de qualidade, como vive nosso jovem na periferia, qual o acesso a Cultura, a leitura. Há adolescente que não sabe ler e escrever, mas que está na 5ª, 6ª série. Isso é Educação de qualidade? Que futuro esse jovem vai ter? Então, é muito simplista achar que só repressão vai resolver o problema. Vamos ter que gastar dinheiro para construir grandes presídios e colocar essa população e não vai fazer outro tipo de investimento. O custo de uma escola é mais barato que o sistema prisional”, finalizou.
Cotidiano
Controle da violência não ocorre só com repressão, afirma juíza
A magistrada, que foi juíza da Infância e Juventude por 10 anos, questiona se com o aumento da maioridade as unidades prisionais estarão preparadas para devolver adultos ressocializados à sociedade