“Eu sou uma mulher preta, quilombola, e eu posso fazer a diferença”. A fala de Rafaela André, Coordenadora Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Governo de Roraima, reflete a importância da representatividade e importância do protagonismo das pessoas negras na sociedade.
Mas, nem sempre foi assim. Nascida em Petrópolis, no Rio de Janeiro, Rafaela veio para Roraima para estudar. Em entrevista ao jornal FolhaBV, a coordenadora explica que sua atuação na área iniciou enquanto estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Roraima (UFRR). Foi nesse momento que ela começou a usar a sua voz para fazer a diferença na sociedade.
“No momento em que eu estava numa emissora, eu parei e pensei: beleza, eu estou aqui, eu sou uma mulher preta, quilombola, e eu posso fazer a diferença. E a partir daquele momento eu comecei a usar o espaço que eu ocupava para dar voz às outras pessoas e também ser uma representatividade negra para valorizar a importância do protagonismo das mulheres pretas, tanto na mídia como na sociedade como um todo”, conta Rafaela.
Pouco tempo depois, em 2018, foi eleita ‘Miss Beleza Negra de Roraima’, um papel importante para reforçar o empoderamento e também a importância da valorização da beleza negra, que, na avaliação de Rafaela, muitas vezes é preterida em relação ao padrão eurocêntrico. Enquanto isso, começou a desenvolver seu trabalho enquanto ativista na pauta há cerca de 10 anos, defendendo sua vivência enquanto mulher preta e quilombola.
“O Governo do Estado reconheceu o trabalho que eu desenvolvi aqui, enquanto sociedade civil, e me convidou para ocupar esse grande cargo, que é o cargo de Coordenadora Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que tem o objetivo gerenciar políticas públicas. Aí eu pensei, pronto, estou no meu local de fala e principalmente num papel muito importante para as minorias étnico-raciais”, pontuou.
O seu papel, enquanto coordenadora, trouxe à Rafaela um sentimento de “gratidão e de reparação histórica”. Na sua avaliação, é uma sensação de missão “quase cumprida”, pois compreende a importância da ocupação desses espaços tão relevantes, sem se deixar esquecer do passado.
“É a sensação de uma missão quase cumprida e por que quase cumprida? Porque nós temos um passado histórico que bate à nossa porta todos os dias. O racismo, o preconceito, as desigualdades sociais batem à nossa porta todos os dias, então quando a gente consegue um avanço, é como se nós retrocedêssemos 10 passos, por exemplo. Mas nós continuamos na luta porque como mulher negra, a gente resiste, a gente persiste e principalmente a gente mostra para a sociedade que nós existimos”, destacou.
Se pudesse dar um recado para ela própria no passado, para outras meninas negras ou pessoas que anseiam por também estar em um papel de liderança na sociedade e que esperam pela chance de fazer a diferença na sociedade, Rafaela diz que não se pode deixar de sonhar.
“O racismo estrutural, que é quando a sociedade, de todas as formas, tenta impor que você não pode ocupar determinado espaço, ele vai tentar fazer você acreditar que você não é digna, que você não é bonita, e que você não é capaz de ocupar aquele espaço.
Você pode sonhar em ser médica, você pode sonhar em ser jornalista, você pode sonhar em ser até uma astronauta, porque sonhar é de graça.
Nunca deixe que o racismo e o preconceito diga que você não pode ocupar os seus espaços. Eu sou um exemplo. Todos os espaços em que eu me propus a ocupar, eu ocupei. E fiz a diferença. Então, empodere-se a cada dia e ocupe seus espaços”, declarou.
Conheça o trabalho da Coordenação Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
Em Roraima, a população conta atualmente com a Coordenação Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, com dois “carros-chefes”. Um é o projeto “Roraima Sem Racismo”, que percorre todos os municípios do Estado, levando palestras e capacitação sobre a importância do enfrentamento ao racismo e o preconceito.
“Dentro do ‘Roraima Sem Racismo’, nós trabalhamos ações de promoção da igualdade racial, como, por exemplo, em escolas ou com associações, até para garantir um espaço para que essas minorias étnico-raciais tenham um diálogo diretamente com o Governo, porque nós somos os executores da política pública”, explica Rafaela.
Outro projeto é o “Colorindo a Equidade”, um trabalho voltado para a primeira infância. A coordenadora explica que a ideia foi pensada considerando que é nos primeiros anos de vida de uma criança, que ela começa a notar a sua vivência e a do coleguinha. “Aí cabe a um adulto ensinar de forma lúdica essa criança sobre a importância do respeito às diferenças”, completou.
Além disso, a Coordenação também criou o Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial e garantiu a participação no plano plurianual do Estado, ou seja, a aplicação de recursos estaduais específicos para a igualdade racial. Há também a campanha “Julho das Pretas”, voltada para as mulheres pretas, latino-americanas e caribenhas, que leva ações ao longo de todo o mês de julho, reforçando a importância do protagonismo, da ocupação de espaços dessas mulheres e também de políticas públicas específicas para elas.
“Recentemente nós fizemos a adesão ao sistema nacional de Promoção da Igualdade Racial, que garante a chegada de recursos federais para o estado de Roraima também para a pauta. Então o nosso papel fundamental. É a promoção e a elaboração de políticas públicas que incluam todas as minorias étnico-raciais”, acrescentou Rafaela.
Por fim, neste dia 20 de novembro, feriado nacional em alusão ao Dia da Consciência Negra, a Coordenação também realiza evento na Praça da Cultura, perto do mini-terminal. “Estaremos realizando uma grande roda de capoeira, também com uma palestra, falando sobre a importância do dia da Consciência Negra. Pouca gente sabe que essa data, esse ano, se tornou um feriado nacional e tem o objetivo de sensibilizar a sociedade sobre os dilemas que a população preta ainda vivencia nos dias atuais”, completou.