Cotidiano

CRM afirma que caos na saúde reflete no atendimento médico

Problemas estruturais, falta de equipamentos e leitos são realidade nos municípios do Estado

A constante falta de equipamentos e de leitos, bem como a estrutura física dos hospitais e postos de saúde em todos os municípios prejudicam cada vez mais a população e causam desgastes a médicos e enfermeiros ao prestarem atendimento nas conjunturas que se estendem há mais de um ano.

Foi esta realidade apontada, ainda no ano passado, durante a fiscalização anual aos hospitais e unidades de saúde de Boa Vista e demais municípios realizada pelo Conselho Regional de Medicina (CRM). A entidade encontrou unidades sem a menor condição de funcionamento. A grande maioria não foi interditada para que não houvesse um prejuízo ainda maior à população, uma vez que o interesse do órgão não é fechar esses prédios, mas garantir atendimento de qualidade.

De acordo com a vice-presidente e coordenadora da comissão de fiscalização do CRM, pediatra Rosa Leal, o Município de Rorainópolis, Sul do Estado, é o único que possui condições para realizar atendimentos emergenciais. Em uma cidade do interior, foi encontrada uma farmácia em um posto de saúde que entregava medicamentos controlados sem ter um farmacêutico responsável.

“Essa foi a panorâmica do que vimos no interior do Estado. A maioria das unidades está na mesma condição e consegue lidar com febre porque tem dipirona. Se alguém chegar cortado, não há o que fazer. Há profissionais de saúde, mas os mesmos não têm como prestar o devido atendimento porque faltam material, equipamento e medicamento”, relatou.

Em Boa Vista, além de profissionais em menor quantidade em relação à grande demanda, o principal problema analisado foi em relação à estrutura física. Não há leitos suficientes para a população. Conforme relato da vice-presidente do CRM, as circunstâncias dificultam ao médico, que sofre as pressões da população, que, por sua vez, não entende que a culpa não é do profissional, mas de todo um sistema que não está adaptado ao atendimento.

“As unidades do município são outro problema. O Programa Saúde da Família, que geralmente só apresenta profissionais do Mais Médicos, não está perto da população pela dificuldade da língua. As crianças não conseguem ser atendidas porque a maioria dos médicos é acostumada a atender adultos. Não há referência e nem um pediatra nos postos, só médico geral. O Conselho recebeu fortes reclamações a respeito do Mais Médicos”, destacou.

No Pronto Socorro, é excessivo o número de pessoas para uma estrutura física inadequada, além do fornecimento de poucos leitos que não comportam o número devido ao crescimento da população. De acordo com Rosa Leal, os três únicos hospitais do Estado foram construídos em uma época em que o número de habitantes era menor. Ao longo dos anos, apesar do desenvolvimento populacional, o número de hospitais é o mesmo.

“A maternidade tem, em média, nove mil nascidos por ano. Hoje temos apenas oito leitos de UTI neonatal registrados. Normalmente, temos de doze a quinze crianças entubadas em leitos improvisados. Os leitos também não comportam o número de partos, então ficam inúmeras cadeiras nos corredores para que se possa comportar e dar ao paciente um atendimento melhor. É pouco leito para muita demanda”, frisou.

Em uma das ações do CRM, foi providenciado o fechamento do centro cirúrgico do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth para cirurgias eletivas, deixando apenas as de emergências. Segundo Rosa Leal, a medida começou a gerar desconforto à população que já estava com cirurgia marcada. “A gestão então colocou o que estava faltando no momento em que fiscalizamos, disponibilizando um número impreciso.

Nós resolvemos o problema de imediato, o setor foi liberado e volta tudo outra vez”, relatou.

A fiscalização no único Instituto Médico Legal (IML) da cidade também gerou pedido de interdição. Segundo a vice-presidente, até hoje a entidade está aguardando o relatório, além de ter sido prometido um prédio novo, uma vez que a função do CRM é mostrar os erros, apresentar soluções e solicitar que o problema seja resolvido.

Foram fiscalizadas, no total, 86% das unidades de saúde do Estado. Segundo a vice-presidente, o relatório foi encaminhado ao governo no final do ano passado solicitando a presença da governadora Suely Campos (PP) para que o CRM pudesse expor a situação, mas ela não compareceu à sede da entidade.

Durante a fiscalização, foi constatado que 80% das unidades de saúde de Roraima não são registradas no CRM. “Oficialmente, nem existem para nós. Os prédios são construídos e não são registrados. Como podemos fechar um hospital ou unidade dessas? Não podemos porque a população vai sofrer. O Conselho fica de mãos atadas. Não tomamos atitudes drásticas para o benefício da população”, frisou Rosa Leal.

De acordo com o CRM, no final de 2015 o relatório de fiscalização foi enviado ao Governo de Roraima para que a situação dos prédios de saúde fosse de conhecimento da governadora, que foi solicitada a comparecer ao conselho, mas nenhum retorno ocorreu.

Sesau diz que conseguiu avanços e culpa a administração anterior

Por meio de nota, a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) afirmou que em apenas 18 meses a atual gestão tem conseguido avanços significativos frente à situação precária encontrada no início de 2015, “fruto do descaso em anos anteriores”. Frisou que, nos próximos meses, será solucionado um problema que se arrasta há décadas, a superlotação no Hospital Geral de Roraima (HGR), com a inauguração do Hospital das Clínicas, cuja obra foi encontrada parada no início do ano passado.

“A obra vinha se arrastando desde 2011 e agora está na fase final. A unidade vai disponibilizar 118 novos leitos hospitalares, servindo como uma unidade de retaguarda, deixando ao Pronto Socorro e Pronto Atendimento o atendimento a casos de urgência e emergência. Além disso, a ampliação do HGR, encontrada apenas na fase de fundação (4%) está a pleno vapor”, frisou.

Conforme a Sesau, uma obra que estava parada, mas que teve prosseguimento com a atual gestão, foi a Casa da Gestante, anexa ao Hospital Materno Infantil, que dispõe de 20 leitos para receber gestantes que estejam em trabalho de parto, ou mães que já tiveram bebê, mas que, por algum motivo, precisam permanecer no hospital com a criança. Isso ajudou a amenizar a falta de leitos devido ao alto fluxo de pacientes na maternidade.

“Outra obra que também será inaugurada nos próximos meses é a nova sede do Centro de Referência de Saúde da Mulher (CSM), que há 11 anos funciona anexo à maternidade, mas agora será transferido para a antiga Residência Médica, prédio que até então estava abandonado e está sendo adaptado para atender à saúde da mulher. Com isso, a maternidade ganhará 37 novos leitos”, complementou.

Afirmou ainda que mais uma estrutura inaugurada neste ano foi a Unidade de Acolhimento, com capacidade para 15 pessoas, para atender a pessoas com dependência de crack, álcool e outras drogas. “Além disso, a Sesau está investindo na reestruturação e ampliação de unidades já existentes, como o Hospital Coronel Mota, onde foi totalmente reestruturado o SAE (Serviço de Atendimento Especializado), para pessoas portadores de DSTs e Aids; o bloco C, que estava desativado há décadas, está sendo reformado para ser colocado novamente à serviço da população. Nos próximos meses, a unidade receberá uma reforma geral”.

“O interior do Estado também tem recebido investimentos em manutenção predial e reformas. Os hospitais de Rorainópolis (que embora seja uma unidade nova, já precisava de reparos) e Normandia já foram reestruturados e estão atendendo à população. Além disso, o Hospital de Caracaraí está com obras em fase de conclusão, a unidade de Caroebe deve iniciar a reforma nos próximos dias; o hospital do município de Alto Alegre também será reformado; a obra está em fase de licitação e em seguida será reformado o Hospital de Santa Maria do Boiaçu”, complementa a nota.

A Sesau informou ainda que, neste ano, já foram entregues centenas de equipamentos médico-hospitalares, como monitores e equipamentos para salas de parto. “Esta é uma das prioridades da Sesau, considerando que muitos dos equipamentos das unidades estavam obsoletos e agora, tendo em vista as condições financeiras do Estado, vêm sendo atualizados gradativamente. Também estão sendo viabilizados equipamentos para as unidades do Interior, pelo Ministério da Saúde, por meio de emendas parlamentares”, relatou.

A Sesau reforçou que é adepta ao sistema de gestão participativa na qual qualquer agente interessado pode contribuir no processo da tomada de decisão sobre investimentos e outras formas de intervenção no Sistema Único de Saúde. “A secretaria está de portas abertas, tanto para o Conselho Regional de Medicina (CRM) quanto para qualquer outra instituição ou conselho de classe, a fim de, democraticamente, construir uma Saúde cada vez melhor”, destacou.

PREFEITURA DE BOA VISTA

No âmbito municipal, a Prefeitura de Boa Vista esclarece que não há falta de leitos, nem no Hospital da Criança Santo Antônio, a única unidade de referência para atendimento infantil no estado, e nem nas unidades básicas de saúde, que no caso, não possuem a internação como atribuição.

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