Em crise. É assim que se define a situação econômica enfrentada pelo Governo do Estado nos últimos meses. Sem pagamento dos servidores públicos e a falta de recursos para compra de materiais básicos para prestação de serviços, os problemas desse cenário passam a atingir cada vez mais a população. O mais recente, no Instituto de Identificação Odílio Cruz (IIOC), que suspendeu a emissão de carteiras de identidade.
No início desta semana, a Folha publicou que o mesmo órgão deixou de emitir fisicamente certidões negativas por falta de papel.
A maior parte da arrecadação do Instituto vem por meio do pagamento da emissão de segunda via do Registro Geral (RG), com valor de R$ 36,47 por cada documento. Com os constantes bloqueios judiciais nas contas do Governo, o repasse desses valores passou a ficar comprometido e causou a falta de manutenção e continuação nos serviços do órgão.
Uma empresa especializada em biometria foi contratada com o investimento de R$ 6,5 milhões, com equipamentos modernos para dar celeridade ao trabalho, contudo, está sem receber o pagamento das parcelas desde o mês de junho. Além das máquinas, as emissões só podem ser feitas mediante o sistema utilizado no Instituto que abrange todos os inquéritos policiais do estado, mas não há internet no órgão para utilização do procedimento.
De janeiro até o começo de novembro foram feitas 20.946 emissões de carteiras de identidade no IIOC, o que resulta no montante de R$ 763.900,62 somente neste período. Para o diretor do Instituto, Amadeu Rocha Triani, esse recurso seria suficiente para resolver os problemas atuais no órgão, mas que por conta dos bloqueios judiciais, nenhum repasse foi feito desde junho.
“Entendo que esse recurso não pode ser bloqueado para outra finalidade, é um equívoco. Todo procedimento administrativo foi feito, foram emitidas as notas, passaram para a Delegacia-Geral, que fez todo procedimento e por fim vai para a Sefaz [Secretaria Estadual da Fazenda]; ocorre que essas notas não estão sendo liquidadas”, relatou.
O diretor pontuou que a falta de uso no sistema dificulta todo o trabalho civil e criminal da polícia, principalmente em relação à identificação de pessoas vítimas de acidentes e de homicídios que chegam até o Instituto Médico Legal (IML). As delegacias do interior do estado estão sem poder fazer a inserção de informações justamente pela falta de internet e plataforma oficial.
TRIBUNAL DE CONTAS – Em meio à falta de recursos, o diretor do IIOC encaminhou na manhã de ontem, 21, um ofício para o Tribunal de Contas do Estado (TCE) solicitando que seja feita uma fiscalização do valor arrecadado com os pagamentos da segunda via do RG, dessa forma, pedindo para que o montante pudesse ser aplicado de volta no IICO.
“Isso está atrapalhando toda a cadeia produtiva do Instituto de Identificação. É muito frustrante a pessoa que precisa viajar, precisa de tratamento de saúde e inúmeras necessidades que necessita da carteira de identidade. O Instituto está pedindo socorro e a população também”, lamentou.
No documento, é citado que há “um contra senso administrativo e consequentemente inviabiliza o atendimento ao cidadão, onde estão sendo prejudicados por um desvio de finalidade de um tributo pago”. Além de demonstrar que houve um equívoco nos bloqueios judiciais, o diretor pontua que a situação pode caracterizar uma possível improbidade administrativa nas contas do estado.
“Eu não tenho autonomia para fiscalizar essa parte da Sefaz no direcionamento desse recurso, então foi quando cheguei à conclusão que via Tribunal de Contas poderia tomar uma atitude de deixar esse dinheiro como se fosse da educação. Como é uma prestação de serviço específica, nada mais do que justo, não só manter as demandas do Instituto. A população pagou por um serviço que não está sendo atendido”, encerrou.
População é informada que não pode emitir RG
Nirléia Filgueiras já não sabe mais o que fazer para emitir a carteira de identidade do filho de 12 anos. Com viagem programada para dezembro, a criança iria realizar um procedimento cirúrgico no Rio de Janeiro, mas sem o documento, não há como embarcar.
A empresária procurou o Instituto de Identificação e descobriu que não havia material para confecção do documento oficial por conta da falta de recursos. Durante a visita, descobriu que não era a única a passar pelo mesmo problema e chegou a procurar a direção do órgão, mas foi informada que nada poderia ser feito.
“Eu implorei para o diretor porque meu filho precisa sair daqui, mas eles não têm previsão, talvez esse ano não tenha mais emissão”, criticou. A mãe está tomando medidas legais para conseguir retirar o filho de Roraima e fazer as consultas necessárias porque no Sistema Único de Saúde (SUS) não oferece o tratamento específico para a criança.
Para Nirléia, a situação encontrada no Instituto reflete a crise financeira atual e teme pela vida das pessoas que estão precisando da emissão de carteira de forma urgente e não conseguem. “Está um caos. Tinha uma senhora com câncer que teve a identidade danificada e não consegue ir fazer a cirurgia. As pessoas estão isoladas em Roraima”, finalizou. (A. P. L.)
Governo do Estado não dá esclarecimentos
A equipe de reportagem da Folha entrou em contato com o Governo do Estado solicitando um posicionamento oficial sobre os problemas encontrados no Instituto de Identificação Odílio Cruz (IICO). Questionou se haveria alguma previsão de solução para o problema e quando os serviços seriam regularizados, enfatizando as pessoas que necessitam de viagem por motivo de saúde.
Perguntou também sobre os recursos arrecadados pelo IICO e que não foram devolvidos para o órgão, resultando em um encaminhamento para o Tribunal de Contas do Estado (TCE), entretanto, não obteve resposta até o fechamento desta matéria. (A.P.L)