Cotidiano

Estatuto da Criança e do Adolescente completa 25 anos de criação sem festa

Para o promotor de justiça da Infância e Juventude, a maioria das pessoas é contra o ECA sem ao menos conhecê-lo

No começo da semana, o Estatuto da Criança e do Adolescente completou 25 anos de existência. Apesar das ações de assistência e proteção de direitos desse público serem desenvolvidas desde os tempos do Brasil colônia, a criação de um estatuto próprio é, até hoje, considerado um marco na democracia do País.

“É uma legislação que tem como fruto a Constituição de 1988, de quando a gente vem de um movimento de redemocratização do País. Essa Constituição é extremamente avançada e foi ela que trouxe as garantias de direito da criança e do adolescente, sendo assim um avanço em termos de legislação”, disse o promotor de justiça da Criança e Juventude, Márcio Rosa.

Aprovado no Congresso Nacional em 1990, o ECA foi publicado sob a lei federal nº 8069. Esse documentou reuniu as reivindicações de movimentos sociais que trabalhavam na defesa da ideia de que crianças e adolescentes eram merecedores de direitos à cidadania e proteção.

Esse foi o início de uma série de ações em prol dos direitos desse público, como a criação da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, em 1993; o Disque 100, um canal prático para a formalização de denúncias, em 1997; e a mais recente delas, a criação da lei Menino Bernardo, que condena a violência física e moral na educação.

Entretendo, para o promotor, a desinformação acabou comprometendo a real importância do Estatuto para a sociedade. “Um credo que existe entre a sociedade é de que o ECA tira a autoridade dos pais e dos professores; de que os pais não podem exigir o trabalho doméstico das crianças e que os adolescentes não são penalizados pelos crimes que cometem. Isso não é a realidade do Estatuto. No Brasil, só para se ter uma ideia, a responsabilidade para o menor que comete algum tipo de delito é a partir dos 12 anos. Quando isso ocorre, ou ele pega uma medida em meio aberto e presta serviço à comunidade, como os adultos; ou é internado no Centro Sócioeducativo, o CSE. Sem poder sair é prisão. Logicamente que é preciso ter uma diferenciação entre os regimes aplicados para um adulto e para uma criança ou adolescente, porque é muito mais certo trabalhar medidas educativas para reintegrar um jovem ao convívio da sociedade que um adulto”, comentou Rosa.

Outra questão destacada pelo promotor é a mania que a sociedade tem de usar o ECA como “bode expiatório” para justificar a omissão do poder público frente à falta de políticas sociais. “A educação é muito falha; a saúde, deficitária; e a profissionalização é inexistente. Isso acaba gerando o crescimento de famílias disfuncionais. Além disso, a omissão da sociedade também é outro problema para o cumprimento do ECA. A sociedade se omite a ponto de tornar-se cínica e hipócrita, achando melhor colocar todo mundo na penitenciária. É uma forma de lavar as mãos e dizer que a culpa não é de ninguém”, pontuou.

REFLEXÃO – Para o sociólogo Linoberg Almeida, a sociedade como um todo deve refletir sobre o verdadeiro significado da cidadania, não sendo essa uma tarefa apenas do poder público. “Não é a lei, o Estatuto, a regra, que muda uma sociedade. Os hábitos são aprendidos a partir do exercício efetivo da cidadania. Será que somos pais e mães de verdade? Sabemos o significado de cuidar, respeitar, educar nossos filhos antes de fazê-los marginais, infratores de nossas próprias mazelas? Antes de pôr todas as crianças na escola, precisamos levar seus pais juntos, seus legisladores, seus políticos, para que as professoras e professores que vivem o ECA na real possam mostrar o mundo a quem o vê de longe. Planejamento familiar, educação libertadora, lar, condições básicas de vida com qualidade são essenciais ao pensar-se em paternidade e maternidade”, frisou. (M.L)