Leo Daubermann
Editoria de Cidades
Ele se aventurou numa profissão cheia de rótulos e está apostando alto. Afinal, não é fácil entrar e se dar bem, num mundo considerado essencialmente feminino.
Há pouco mais de um ano, o roraimense Bertiely Oliveira Chaves, 29, que é ex-militar do Exército, lotado na 1ª Brigada de Infantaria de Selva em Roraima, por sugestão da esposa Rariana Castro, 25, resolveu apostar no ramo da beleza. Além de empreendedor, tornou-se maquiador profissional.
O setor da beleza é um dos que mais cresce. Enquanto a economia cresceu 59% nos últimos 15 anos, o setor de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos cresceu 341%, sem considerar a inflação do período. Não é à toa que as oportunidades para profissionais que atuam nesse segmento têm sido cada vez mais promissoras.
De acordo com informações da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), o segmento de beleza hoje é o que menos sofre impacto com as crises econômicas e está em franca expansão no Brasil para o público feminino e masculino. Existem 2.178 empresas no setor de cosméticos no país, e o crescimento da indústria no ano passado foi de 2,8%, acima do PIB (Produto Interno Bruto). O Brasil ocupa a quarta posição no ranking mundial de maiores consumidores de produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos.
Diante desse cenário tão promissor, o ex-militar Bertiely encontrou uma saída para o problema do desemprego. “Depois de 8 anos no quadro temporário do Exército, me vi obrigado a me inserir novamente no mercado de trabalho. Como não estava conseguindo encontrar um emprego, minha esposa sugeriu que revendêssemos maquiagens. Confesso que nunca havia pensado no assunto, mas resolvi aceitar. Para minha surpresa as vendas foram um sucesso, resolvemos então fazer um investimento maior e acabou rendendo frutos”, conta o maquiador.
O casal percebeu que o negócio poderia prosperar, e resolveu abrir um empreendimento, que mescla loja física com virtual, uma tendência, no mercado mundial, mas as novidades não pararam por aí. Bertiely viu a necessidade de especializarem-se na área, para conhecerem mais profundamente os produtos que estavam comercializando.
“Minha esposa procurou um instituto e nós dois nos inscrevemos para o curso profissionalizante de maquiador. Foi quase um ano de formação, entramos sem saber quase nada, e nos tornamos maquiadores profissionais. Rariana optou pela parte do atendimento, tomou à frente da loja e eu, por ter me encantado com essa parte da maquiagem, desse tato, que considero uma obra de arte, resolvi investir na profissão de maquiador”, explica.
Depois de um tempo colocando em prática o que aprendeu durante o curso, no estúdio montado anexo à sua loja Camarim RB, Bertiely resolveu fazer uma nova especialização. De uma turma de 17 alunos, no curso profissionalizante de maquiador oferecido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial em Roraima (Senac-RR), Bertiely é o único homem.
A instrutora do Senac, Thuany Fernandes, 29, é só elogios. Ela conta que foi uma surpresa quando soube que teria um homem como aluno, mas que surpreendeu-se com a técnica de Bertiely.
“Ele é um excelente aluno, já chegou sabendo maquiar, veio aqui só para polir seu conhecimento, para aprimorar ainda mais sua técnica, querendo ou não um certificado do Senac pesa muito para o profissional”, diz.
De acordo com a instrutora, que já têm seis anos de experiência ministrando aulas, quase 100% do seu público são mulheres, homens, são raros.
“Creio que o Bertiely é o meu primeiro aluno do sexo masculino, que não seja homossexual. Essa é uma profissão ainda muito estigmatizada, já pensou um hétero ter que ficar explicando que não é gay? Talvez seja por isso que você encontre mais maquiadores homossexuais do que heterossexuais”, destaca Thuany.
PRECONCEITO – De acordo com Bertiely, muitas pessoas estranharam a nova profissão, afinal ele saiu de um universo preenchido quase que totalmente por homens, para outro onde, até pouco tempo, era vivido quase que exclusivamente por mulheres ou então homossexuais.
“Não posso dizer que não sofri preconceito, mas quem me conhece sabe da minha opção sexual. Sou bem resolvido, bem casado, temos um casal de filhos, somos uma família feliz. Percebo que, quem não me conhece fica com um pé atrás, com aquela dúvida, será que é, será que não é? Mas pela minha postura, logo a dúvida acaba”, disse.
Para Bertiely a única pessoa que poderia fazer mudar de ideia com relação à profissão é seu pai. “Ele tem o maior orgulho do que eu faço, e olha que ele é das antigas, mas quando se refere a mim, enche a boca para dizer que sou empreendedor, maquiador, que sou o melhor”, diz orgulhoso.
“É uma profissão cheia de rótulos sim, talvez por exigir sensibilidade, suavidade, homens costumam ter vergonha de mostrar esse lado mais sensível. Mas me encontrei nessa profissão, vejo a realização das mulheres, muitas delas que nunca foram maquiadas, e que ao se verem no espelho, se transformam e agradecem pelo trabalho realizado. Esse reconhecimento é que me fortalece cada dia mais, e faz passar por cima de qualquer preconceito de que essa profissão não é para homem”, conclui o maquiador.