Cotidiano

Família indígena é expulsa de abrigo

Os indígenas warao, Frank e Yajaira, foram expulsos do local na tarde de terça-feira, 26, junto do filho mais novo, de dois anos, por supostamente terem se envolvido em casos de agressão verbal e física

Uma família de indígenas warao foi expulsa na tarde de terça-feira, 26, do Centro de Referência ao Imigrante (CRI) do Pintolândia, na zona Oeste da Capital. O casal Franklin Centeno e Yajaira Roja teria supostamente agredido verbal e fisicamente outro abrigado e a coordenadora do local, porém, os venezuelanos negam as acusações e contam com testemunhas que afirmam não ter acontecido qualquer tipo de violência.

Em entrevista à Folha na manhã de ontem, 27, os venezuelanos relataram a sua versão na companhia de outras pessoas que presenciaram a expulsão, momentos após terem denunciado a situação à Defensoria Pública da União (DPU).

A briga teria acontecido no dia 25. Conforme o casal, um dos abrigados, nomeado como um dos caciques pela própria coordenação do local, teria começado a discutir com uma mulher por conta de um problema com a alimentação. Em seguida, Yajaira teria se aproximado da situação, sem saber do problema, em busca do marido Franklin, quando o cacique a respondeu já com voz alterada.

“Eu disse que só estava atrás do meu marido e ele começou a gritar comigo e disse que eu era muito teimosa. O meu marido não gostou e interrompeu. Disse que ele não poderia falar daquele jeito, que ele não era meu pai ou minha mãe e que era para ter mais respeito comigo”, informou Yajaira. A mulher disse ainda que durante a confusão o cacique teria a agredido fisicamente, a empurrando durante a discussão.

Em sequência, o cacique teria então recorrido à coordenação do abrigo e a servidores da Secretaria Estadual do Trabalho e Bem Estar Social (Setrabes) para informar que Franklin o teria ameaçado de agressões e morte. No dia seguinte, dia 26, a coordenação do abrigo teria convocado Franklin e dito que o mesmo estava expulso do local por conta das ameaças.

Yajaira disse que foi tentar reclamar com a coordenadora e o antropólogo, ambos servidores da Setrabes, sobre o motivo da expulsão do marido. Ela reclamou que não foi chamada para dar seu testemunho sendo que a discussão a envolveu.

Yajaira e Franklin disseram que, no momento da expulsão, chegaram militares do Exército e da Polícia Militar. “A comunidade warao, tendo em vista o que estava acontecendo, se levantou em defesa de Franklin”, afirmam os outros indígenas.

O casal comentou que a coordenadora pediu aos militares que levassem Franklin o mais rápido possível, momento que Yajaira teria pedido aos gritos à comunidade que a ajudassem e que não levassem seu esposo embora. A mulher acha que a sua conduta desagradou a coordenação, que pediu que se calasse e não se intrometesse. “Depois, a coordenadora disse que nesse momento eu a bati com um soco na boca, sendo que isso nunca aconteceu. Todo mundo estava lá e viu. Depois ela chamou meu marido e disse que eu a tinha agredido e que por isso, também estava expulsa”, afirmou. A família disse ainda que os policiais acionados a apressou para retirar seus pertences.

Os dois filhos mais velhos do casal, de 9 e 11 anos, permanecem no abrigo junto da avó e de outros parentes, que também teriam sido ameaçados de expulsão. Yajaira, Franklin e o filho de dois anos passaram a noite de terça para quarta em frente ao abrigo.

Ontem, os indígenas foram ouvidos pela Defensoria Pública da União. Os relatos serão investigados junto com outras denúncias da qualidade de atendimento nos abrigos em Roraima. “Nos despejaram como animais, não nos tratam como seres humanos. Não sei o que fazer aqui fora, com um menino, sem ter o que comer. Ao menos no abrigo tínhamos comida e agora nem mais isso, não quiseram nos ouvir. Fomos tratados pior que um cachorro”, disse Franklin.

Setrabes alega que família é reincidente em confusões

A secretaria-adjunta do Trabalho e Bem-Estar Social, Edilânia de Almeida, informou à Folha que o abrigo possui uma organização compartilhada com a Fraternidade Federação Humanitária e a equipe técnica da Setrabes, que é capacitada no atendimento humanitário. Em caso de expulsão de abrigos, a pessoa é primeiro advertida e, no caso de uma reincidência em mais de três vezes, expulsa. Conforme Edilânia, esse foi o caso da família indígena warao.

“A gente sabe que não são todos, mas tem alguns que são extremamente violentos e tem dificuldades em seguir regras. E foi isso o que aconteceu. Eles geraram um conflito que envolveu outras pessoas e essa família foi extremamente agressiva. O papel da coordenação, junto com o Exército e a Fraternidade, é diminuir essas questões”, frisou.

Edilânia explicou que existe uma equipe que analisa todas as condutas do abrigado, que é chamado para conversar e é advertido. Dependendo da gravidade, segue o regimento do ambiente, que é a expulsão. “Isso acontece somente em último caso, só quando aquelas pessoas põem em risco os demais usuários e foi isso o que aconteceu”, disse a adjunta.

A secretaria-adjunta afirmou que o problema já estava resolvido e que a família já havia sido advertida, quando a esposa desferiu um soco no rosto da coordenadora do abrigo, causando inclusive uma lesão corporal grave, com sangramento.

“Ela infringiu a legislação brasileira e junto com a conduta dessa família, com as demais que são casos de violência com os demais usuários, a equipe decidiu de forma coletiva seguir o regimento pela expulsão. Após isso, a indígena inflamou os demais para gerar um conflito coletivo e foi difícil para o próprio Exército controlar”, declarou.

“Tem muitas famílias indígenas que têm condutas inadequadas no ambiente coletivo e têm dificuldades de conviver com seus próprios parentes naquele ambiente. O papel da coordenação é diminuir essas animosidades e fazer essa conciliação, para que as pessoas convivam ali”, completou. (P.C.)