Cotidiano

Familiares são impedidos de entregar comida na PAMC

A denúncia foi feita nesse final de semana para a Folha. A Sejuc nega a informação e explicou que poderá liberar a entrada de alimentos de forma diária

Leo Daubermann

Editoria de Cidades

A crise no sistema prisional por conta da falta de alimentação continua preocupando os familiares dos presos nas unidades prisionais de Roraima. Nesse final de semana, eles denunciaram para a reportagem da Folha que estavam tendo dificuldades para entregar as refeições para os detentos da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc), maior unidade prisional de Roraima, situada na região do Monte Cristo, zona rural de Boa Vista.

Na manhã de sábado, 3, dezenas de familiares se aglomeravam em frente à unidade prisional, na tentativa de entregar as refeições já prontas, mas eram avisados de que, somente os presos da Ala 15 estavam liberados para receber a comida sendo que os demais presos só se alimentariam no domingo, 4. A última refeição dos presos, de acordo com as famílias, foi o café da manhã de sexta-feira, 2.

“Eles anunciaram que os familiares podiam levar os alimentos na visita deste sábado, mas fui surpreendida com a informação de que só o pessoal da Ala 15 é que receberia a comida e os demais não. Mesmo sendo marmita pronta, não autorizaram entrar”, relatou a mãe de um preso, que não quis se identificar.

A denunciante explicou ainda, que a informação dada pela direção da Pamc era de que iriam chegar fardos de alimentos para prepararem a própria comida, mas até o final da manhã de sábado não havia chegado nenhum carro com itens prometidos.

“O motorista que faz a entrega das refeições nos disse que a empresa não está mais autorizando os envios porque a governadora não pagou e que não tem como fazer a comida, pois nem matéria-prima tem. Sexta (2) os presos só receberam o café da manhã, o almoço e a janta eles não receberam. Provavelmente só vão comer domingo”, completou.

Os familiares estão preocupados com a reação dos detentos. “É muito homem junto, preso em cubículos, sem comer, vocês já imaginaram no que pode resultar isso? Estamos preocupados, a gente teme pela vida dos nossos irmãos, maridos, filhos. E se eles se revoltarem? Tá certo, eles estão presos, mas estão pagando pelo que fizeram, eles precisam comer. Essa comida aqui, que a gente trouxe vai estragar. A gente faz um esforço pra fazer, gasta, pra nada”, desabafou a irmã de um dos presos.

A esposa de outro, que também não quis se identificar, reforça a denúncia de que não houve liberação de refeições para outras alas e que não havia chegado nenhuma matéria-prima para os presos fazerem suas refeições, como prometido. “Mais de 1.500 presos lá de dentro, eles vão comer o quê? Disseram que iam liberar comida, não liberaram, que ia chegar fardo de arroz, feijão, macarrão para os presos fazerem a comida lá dentro, eu estou aqui desde cedo, e não vi chegar nada”, relatou.

A nossa equipe de reportagem constatou que, na Cadeia Pública Masculina de Boa Vista (CPMBV), a situação é diferente. Naquela unidade prisional, a direção estava permitindo a entrada de alimentos prontos, de forma ordenada. “Eles permitem a gente entrar, a comida já está pronta, não permitem levar muita coisa. A gente entra de dez em dez”, explicou a esposa de um preso, que não quis se identificar.

“Aqui eles se ajudam, quem recebe comida quando a gente traz, divide com quem não tem ninguém por eles, quem não têm família aqui em Boa Vista”, contou o irmão de outro preso, que também não quis se identificar. “A gente não sabe até quando essa situação vai continuar. Mas enquanto permitirem a gente vamos trazer comida aqui”, completou.

A Folha havia noticiado, na sexta-feira, 2, que a entrada de alimentos tinha sido autorizada pela Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc), em todas as unidades prisionais. A medida garantiria a alimentação dos detentos dessas unidades, com a suspensão de fornecimento das refeições.

QUALIGOURMET – Essa é a terceira vez que a alimentação é suspensa desde o mês de setembro. A empresa responsável pelas refeições nas unidades prisionais alega que a suspensão se deve à falta de pagamento pelo Governo do Estado. A dívida seria de R$ 5 milhões. Nossa equipe de reportagem tentou contatar o responsável pela Qualigourmet, por meio de telefone da empresa, mas não obtivemos sucesso.

Sejuc diz que poderá autorizar entrada de comida todos os dias

Em resposta a questionamentos feitos pela Folha, a Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejuc) informou que a informação sobre restrição da entrada de alimentos na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc) é inverídica e que os agentes penitenciários estão recebendo os sacolões dos familiares dos detentos de todas as alas da unidade.

“Ocorre que a Sejuc só autorizou a entrada dos itens que compõem a marmita. Essa regra contrariou algumas pessoas que levaram itens como goiabada, doce de leite e queijo, por exemplo, dos quais a entrada não foi autorizada”, ressaltou o órgão, em nota.

Ainda segundo a Sejuc, a entrega dos sacolões na unidade ocorre na quinta-feira e na sexta-feira. Nos fins de semana, os familiares são autorizados apenas a levar comida pronta nos horários de visitação.

“Persistindo a suspensão do serviço, a Sejuc deve permitir a entrada dos sacolões em outros dias da semana e a refeição pronta poderá ser entregue todos os dias”, complementou.

Sobre o problema com a empresa responsável pelo envio de refeições, a pasta relatou que o Estado cumpriu o acordo formalizado perante a Justiça, mas que o valor repassado para a empresa só deu para custear o fornecimento da alimentação destinada ao sistema prisional até o dia 1º de novembro.

“A empresa comunicou que não seria possível manter o serviço nos próximos dias, alegando que os provedores de matéria-prima suspenderam o fornecimento, inviabilizando a produção das refeições”, completou.

A Sejuc admitiu ainda a existência de faturas em atraso, mas ressaltou que o Estado, por meio da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz), está avaliando os recursos que não são objeto de bloqueios judiciais, com destinação definida para serviços essenciais, a fim de liberar quota para pagamento da empresa.

“De todo modo, a Sejuc esclarece que, permanecendo a suspensão do fornecimento de refeições, está autorizada a entrada de sacolões, que poderão ser entregues pelos familiares, com o objetivo de garantir a alimentação para as pessoas que se encontram privadas de liberdade nas unidades prisionais”, concluiu.