A polêmica decisão da Prefeitura de Boa Vista de retirar famílias de residências localizadas na área de interesse social Caetano Filho, popularmente conhecida como Beiral, para a construção de complexo turístico, parece estar bem longe de um entendimento definitivo. A ação, que engloba também casas da Avenida Sebastião Diniz, em uma área que compreende o Centro da capital e o bairro Calungá, é visto com desconfiança por muitos moradores.
Para tentar buscar explicações sobre a decisão e chegar a um entendimento, uma comissão formada por moradores das áreas incluídas no projeto da gestão municipal se reuniram na manhã de ontem com aassessoria jurídica do Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR), no prédio Espaço Cidadania, situado na Avenida Ville Roy, Centro.
“Aqui no MP, a nossa audiência foi para expor os fatos e eles [do MP] foram nos repassando até onde podem atuar nessa situação, como no bloqueio das ruas, no desligamento da energia elétrico, na questão desse projeto de revitalização que os moradores não tiveram acesso”, comentou o gerente comercial Leandro Berredo, 32 anos.
Também foi discutida a questão dos valores a serem pagos como indenização para as famílias que serão retiradas da localidade. Segundo os moradores, o montante oferecido pelo Município é inferior ao valor que foi investido ao longo de anos por muitas pessoas. “A base de cálculo utilizada pela Prefeitura é por metro quadrado da residência. No entanto, os valores de indenização são bem abaixo dos investimentos feitos por muitos moradores. Para casas que valem R$ 400 mil, a Prefeitura quer dar o valor simbólico de 100 mil. Tanto que muitos moradores estão solicitando laudos particulares para contestar essa avaliação. Nós conversamos sobre essa situação com o MP e eles foram categóricos em afirmar que apenas a Defensoria Pública do Estado (DPE) pode interceder nessa questão”, disse Leandro.
Morador da Avenida São Sebastião há 14 anos, o gerente comercial lembrou que desde que a Prefeitura de Boa Vista anunciou o projeto os moradores daquela região estão temerosos em relação a área que será destinada a eles como moradia. “É uma situação bastante complicada. Há pessoas ali que já estão familiarizadas com a região, que não costuma a alagar em todo o período de inverno, gente que conseguiu com muito esforço montar o seu pequeno comércio, crianças que já estudam há bastante tempo nas escolas próximas. Agora querem nos retirar de uma hora para outra, sem planejamento, sem informar onde vamos morar”, citou.
Segundo o trabalhador autônomo Francisco Narcélio, 37 anos, no ano passado, integrantes do programa Braços Abertos, da Prefeitura de Boa Vista, estiveram na região realizando um levantamento das áreas próximas do Caetano Filho, no entanto, ninguém justificou o motivo da pesquisa. “É bom que se deixe claro que não somos contra o projeto de revitalização, muito pelo contrário. Se é benéfico para a população, tem que ser realizado. Entretanto, não fomos comunicados que se tratava disso, ou seja, foram desleais conosco. Se é para fazer melhorias, porque não fazê-las sem a necessidade de desapropriar moradores? Se essa é a única solução, então que paguem como indenização aquilo que é de fato justo para quem passou anos investindo naquele espaço”, questionou.
OUTRO LADO – A Folha entrou em contato com a Prefeitura de Boa Vista, que informou que se pronunciará a respeito do projeto em coletiva de imprensa marcada para esta sexta-feira, 14. (M.L)
DPE vai intermediar acordo com a Prefeitura de BV
Ontem à tarde, 13, moradores do Beiral participaram de uma reunião com representantes da Prefeitura de Boa Vista, intermediada pela Defensoria Pública do Estado (DPE). Os defensores Natanael Ferreira, Frederico Leão Encarnação e Anna Elize Amaral ficarão a frente do acordo.
De acordo com o corregedor-geral da DPE, Natanael Ferreira, a primeira recomendação é que qualquer ação de demolição de residências seja suspensa. “Tem que se obedecer ao devido processo legal, pois existe todo um procedimento que tem que ser observado. Além disso, os moradores reclamam que não foram consultadas sobre o projeto e, sobretudo, encontram-se pressionados a assinar um contrato indenizatório que eles mesmos não concordam”, comentou.
Frederico Leão reforçou que a Defensoria Pública acompanhará as negociações a fim de garantir os interesses dos moradores. “Nossa intenção é a solução administrativa. A ação judicial será último recurso, mas essa possibilidade não está descartada. Não havendo acordo, o Executivo Municipal terá que obter uma decisão judicial para iniciar um processo de desapropriação. Sem isso, as famílias estão seguras”, garantiu.