O fazendeiro Frederico Augusto Ceccato Kaefer e produtores ligados à Associação do Polo Agrícola Tucano (Apat) travam um impasse em torno de uma terra de 1.570,15972 hectares denominada fazenda Sumba, localizada na região do Tucano, no município de Bonfim, na fronteira do Brasil com a Guiana. A área equivale a quase 1,6 mil campos de futebol.
Presidente da Apat, entidade criada em 2021, Antonio José Bezerra dos Santos disse que centenas de famílias de agricultores familiares foram colocadas na área, pelo Governo do Estado, no final de 2017, para assentamento. Ele acusa o fazendeiro de mandar funcionários para destruir plantações e barracos na localidade, ações que acontecem desde setembro passado.
“O nosso adversário lá na área insiste em derrubar barracos, em arar, cercar, degradar as plantações dos pequenos produtores, que já somam muitos prejuízos”, disse o presidente da Apat, Antonio José Bezerra dos Santos, alegando que as ações ocorrem sem ordem judicial.
Antonio José mostrou à Folha boletins de ocorrência feitos por moradores, que denunciaram as ações à Polícia Civil, mas as denúncias não teriam surtido efeito, conforme ele. Procurada, a corporação não comentou o assunto até a publicação da reportagem.
Em setembro do ano passado, a associação pediu na Justiça de Roraima a manutenção de posse da área. O fazendeiro foi intimado a comparecer a uma audiência de justificação prévia, marcada para 19 de maio.
O presidente da Apat mostrou à reportagem um requerimento de juntada do processo judicial, datado de 16 de agosto de 2021, com documentos de 2018 referentes a processo de regularização feito por uma antiga associação de agricultores da área, para defender que a terra pertence aos produtores da região. “Foi comprovado pela cartografia que lá não havia ninguém”, defendeu.
Defesa diz que área pertence a fazendeiro, derrubadas são legais e produtores são ‘invasores’
Frederico Augusto respondeu à reportagem por meio de sua defesa, que afirmou que a terra pertence ao fazendeiro, ao apresentar à Folha a certidão de posse da área, emitida pelo Iteraima (Instituto de Terras e Colonização de Roraima) em 20 de março de 2012, inclusa em seu processo de regularização. Disse que o processo citado pelo presidente da Apat foi arquivado pelo órgão.
Ademais, argumentou que a ordem para derrubar barracos e outras madeiras montadas na tentativa de demarcar lotes dentro da área é feita dentro da legalidade, exceto quando há casas de alvenaria construídas pelos produtores.
Além disso, a defesa do fazendeiro disse que não há decreto estadual que estabelece que o polo do Tucano é produtivo e mostrou fotos para defender que não há plantações nem casas construídas na área, mas barracos, o que daria legitimidade para máquinas do fazendeiro derrubar madeiras, por seu cliente ser o dono da propriedade.
A defesa de Frederico Augusto acusou ainda os produtores de serem invasores da área e citou um episódio ocorrido em 25 de setembro de 2021, narrado em um boletim de ocorrência registrado 12 dias depois, no qual um homem foi ameaçado de morte por um grupo de 20 invasores e quatro guardas municipais de Bonfim, fardados, ainda não identificados, e que na ocasião, os acusados ameaçaram e agrediram o caseiro da fazenda Sumba, colocando uma arma de fogo em sua cabeça. Procurada, a Guarda Municipal não comentou o assunto até a publicação do texto.
Por fim, Frederico Augusto disse que propõe à associação a concessão de 277 dos 1.570 hectares da fazenda, para resolver o conflito.
Extensão do Luz para Todos foi interrompido na área
Em meio à disputa, a Roraima Energia interrompeu, na região do Tucano, as obras do Luz para Todos, programa de atendimento às famílias que ainda não possuem fornecimento regular de energia elétrica.
Em nota, a companhia explicou que foi informada do litígio e que interrompeu os trabalhos na área em discussão, realizando as ligações somente para as áreas não abarcadas pelo problema. A empresa disse ter sido informada, em março, pelo Iteraima, que o pedido de regularização do polo foi cancelado. “Deste modo, esta Distribuidora fica impedida de atendimento, a menos que haja efetivo acordo entre as partes envolvidas sobre a posse da terra e o reconhecimento do ITERAIMA”.
Iteraima não intervirá no caso até decisão judicial
Questionado sobre a situação atual da área, o Iteraima limitou-se a dizer, em nota, que não pode intervir em áreas judicializadas até a decisão judicial. “O Instituto de Terras e Colonização de Roraima informa que, conforme prevê o Art. 20 da Lei n° 976/14, não serão objeto de regularização as ocupações que incidam sobre áreas em litígio administrativo ou judicial”, explicou.
“O Iteraima reafirma seu compromisso com a governança responsável da terra por meio da regularização fundiária, utilizando de todos os meios para garantir segurança jurídica e transparência nos seus atos”, completa a nota.