Cotidiano

Hospital Geral não tem estrutura para atender doentes mentais

Estado não tem manicômio judiciário, ou local adequado, para atender pessoas com surtos psicóticos ou que tenham histórico de violência

A morte de uma mulher, na semana passada, vítima de acidente de trânsito, causado por um paciente psiquiátrico que fugiu do Hospital Geral de Roraima (HGR), trouxe à tona a discussão em torno da falta de um manicômio judiciário ou de um local adequado para atender pessoas que estão passando por um surto psicótico e que tenham histórico de violência e passagens pela polícia.
A tragédia aconteceu na quarta-feira, 29, e a vítima, que não resistiu, foi a doméstica Hedelini de Nazaré Torres, de 30 anos, conhecida como Belinha, que estava grávida. Por pouco, a situação não ceifou mais vidas, já que as vítimas foram várias.
O paciente Patrick de Oliveira Rizo, um jovem de 19 anos, que tem um histórico de passagem pela polícia, fugiu do bloco psiquiátrico do HGR, agrediu uma mulher no estacionamento da unidade de saúde e roubou a caminhoneta dela. Além de causar a morte da doméstica, colocar a vida de outras pessoas em risco, Patrick de Oliveira Rizo ainda causou danos materiais e emocionais ao dono da motocicleta e da família de Hedelini, e para todos os contribuintes de Roraima, já que bateu também na viatura do Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Na noite anterior, ele também havia fugido do hospital para causar transtornos à sociedade, mas foi contido por equipes da Guarda Civil Municipal (GCM). Por não ter um manicômio judiciário, foi novamente levado ao HGR, colocando em risco a vida dos médicos, paramédicos, funcionários, pacientes e de pessoas que transitam naquela unidade de saúde.
A Folha procurou o Conselho Regional de Medicina de Roraima (CRM-RR), para saber o que a entidade pensava sobre o episódio e quais medidas já tomou para que essa situação seja resolvida, já que os profissionais de saúde ficam em risco. Ouviu também o Governo do Estado, que enviou nota à redação.
O presidente da entidade, Alexandre Marques, disse que o conselho realizou, em 2014, diversas fiscalizações nos centros psicossociais e que constatou falhas. Ele assegurou que o HGR não é o local ideal para tratamento de doentes mentais e que, com o crescimento demográfico do Estado e o aumento de pessoas com problemas psíquicos, há necessidade urgente de aparelhamento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e da implantação de um manicômio judiciário.
“Nas fiscalizações constatamos que os CAPS carecem de estrutura mais adequada. O CAP AD (para pacientes vítimas do alcoolismo e da droga) estava funcionando em um prédio improvisado e sem segurança para atender os pacientes com histórico de alcoolismo e drogas, pois os órgãos tem o dever de resguardar a integridade do paciente e dos que lá trabalham. Se tivessem funcionado bem, não estaríamos nos deparando com uma tragédia dessas”, disse.
De acordo com o Governo do Estado, a lei estabelece que esses pacientes não sejam mais segregados da sociedade, e que os espaços de cuidado sejam coletivos. Sobre isso, Alexandre Marques foi enfático: “Não podemos segregar, pois são seres humanos, mas de maneira alguma o HGR é preparado para atender pacientes em crise de surto psicótico, principalmente com um grave histórico de violência e de passagens pela polícia. Não há preparo para oferecer segurança tanto ao paciente, quanto aos profissionais de saúde e às pessoas que por lá estão em tratamento e transitam pelo local”, afirmou.
E complementou: “Há necessidade de um manicômio judiciário, que é de responsabilidade do Estado, dentro da unidade prisional, com profissionais preparados e a estrutura para atender essas pessoas, que necessitam de tratamento diferenciado por terem surto psicótico, um quadro de esquizofrenia grave, por exemplo”. Frisou.
Conforme explicou, pacientes com surto, depois de atendidos no Pronto Socorro por um médico psiquiatra, podem passar apenas dois dias internado na unidade de saúde. “O correto é o paciente passar até 48 horas dentro do hospital. Depois, dependendo do caso, ser encaminhado para tratamento nos CAPS, tendo o acompanhamento de um clínico e de profissionais de retaguarda. Paciente que tem histórico associado com a justiça, tem que ser tratado em um manicômio com a estrutura adequada”, reforçou.
Neste caso específico, Patrick Rizo foi encaminhado para a Penitenciária Agrícola do Monte Cristo. O delegado Alberto Alencar, que lavrou o flagrante, encaminhou Patrick para unidade prisional porque inexiste laudo médico atestando o distúrbio mental, mesmo depois de várias internações no hospital. (M.F)
34 mil usuários foram atendidos em 2014
Na nota enviada pela Secretaria de Comunicação do Governo do Estado, o Departamento de Políticas de Saúde Mental informou que o Estado, desde 2012, implanta os serviços de atendimento a pacientes mentais, atendendo as normativas da Política Nacional de Saúde Mental.
Informou que no ano passado, implantou mais dois CAPS, que funcionam 24 horas, para tratar pacientes com transtornos mentais e com dependência química, os quais os acolhem durante todo o dia, recebendo todo o acompanhamento como tratamento ambulatorial, assistência social, enfermaria e psicológico.
Lá, participam de oficinas terapêuticas, as quais são estendidas aos familiares. Conforme a nota, até o mês de novembro, mais de 34 mil usuários, entre pacientes com transtornos mentais e dependentes químicos, foram atendidos.
NOVOS CAPS – O Governo do Estado disse ainda, que os serviços começaram a ser implantados nos municípios de Caracaraí, Pacaraima, Rorainópolis, Alto Alegre e Bonfim. Em 2015, conforme o cronograma serão implantados mais seis CAPS: Normandia, Iracema, São João da Baliza, Cantá, Mucajaí e Uiramutã. Há previsão ainda de se implantar em Boa Vista, uma unidade de acolhimento para atender usuários que atualmente possuem vínculos familiares rompidos. (M.F)