Cerca de 250 imigrantes estão morando em uma espécie de abrigo comunitário improvisado pelos próprios venezuelanos na antiga sede da Secretaria de Gestão Estratégica e Administração (Segad), localizada na rua Barão do Rio Branco, próximo à avenida Ene Garcez, no Centro.
No local, todos possuem funções, como de cozinheiro ou vigilante noturno, e cada membro da comunidade possui a obrigação de realizar a limpeza do ambiente diariamente. Também é obrigatório que todos os moradores estejam com as documentações necessárias em dia, como passaporte, Certificado de Pessoa Física (CPF), carteira de trabalho, certidão de nascimento e certidão de antecedentes criminais.
Além disso, drogas, bebidas alcoólicas e emissão de sons muito altos são proibidos. Essas medidas servem como uma forma de preservar a harmonia entre os imigrantes no ambiente de convivência coletiva.
A ideia de habitar o local começou entre os imigrantes Arjenis Marcano, de 38 anos, Richard Duarte, de 21 anos, e Odalys Suarez, de 39. Na Venezuela, Arjenis trabalhava como motorista, Richard era garçom e Odalys trabalhava em uma pizzaria. Os três moravam em praças diferentes da capital, mas acabaram se encontrando nas proximidades do prédio e idealizaram um abrigo onde não houvesse brigas, furtos ou violência. O projeto acabou ganhando forma no dia 6 de março, quando entraram no prédio, que estava vazio, e, a partir daí, começaram a praticar a limpeza do ambiente.
Na cozinha, o imigrante Morinson Farjardo é o responsável por fazer a comida para todos. Ele era cozinheiro em Anzoátegui, estado ao norte na Venezuela. “Eu cheguei aqui faz uns dois meses. Ainda tinham poucas pessoas. Tivemos diversas dificuldades para estabelecer uma ordem aqui, mas hoje temos regras e todo mundo é orientado de acordo com sua função”, relatou. Quanto à alimentação, Arjenis Marcano explicou que os mantimentos são fornecidos por instituições e igrejas, que além de cederem comida, também entregam produtos de higiene.
Apesar da organização, o abrigo comunitário ainda sofre com problemas estruturais, com paredes descascadas e goteiras em alguns cômodos durante chuvas. Mesmo que os moradores tenham acesso à água, o local não possui energia elétrica. Muitos acabam sendo obrigados a dormir em cima de papelões ou panos. Poucos possuem redes ou conseguiram encontrar alguma forma de sustento financeiro na cidade. Quase todos que vivem no local nunca foram realocados para abrigos da capital.
À Folha, os organizadores do abrigo improvisado afirmaram ter o desejo de fazer uma reforma mais completa, para dar mais conforto às famílias e crianças que dormem em um ambiente que ainda é escasso de recursos. “Nós gostaríamos apenas de instrumentos para que possamos reformar o local. Não precisamos de mão de obra. Nós temos pedreiros, eletricistas e até engenheiros conosco. Já teríamos reformado tudo por conta própria se tivéssemos os materiais necessários”, relatou o imigrante Pedro Perez, de 29 anos.
ACNUR – De acordo com o porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Luiz Fernando Godinho, a entidade não possui conhecimento oficial do caso, e, por isso, não possui planejamento de retirar tais pessoas do prédio. “Nós estamos trabalhando junto ao Ministério da Defesa para justamente dar locais que ofereçam segurança aos imigrantes. Nós priorizamos imigrantes que estão vivendo em locais públicos. Nesse caso mencionado, ainda não possuímos um planejamento para onde poderíamos mandar tais imigrantes, pois todos os abrigos estão lotados e não fomos informados da possibilidade de novos abrigos em curto prazo”, explicou.
GOVERNO – Em nota, a Defesa Civil do Corpo de Bombeiros Militar de Roraima informou que já tinha conhecimento do abrigo e oficializou, no dia 18 de abril, uma demanda de prioridade à Força-Tarefa de Logística Humanitária, coordenada pelo Exército, para a remoção de imigrantes do local, após novos abrigos ficarem disponíveis.
“A Defesa Civil esclarece ainda que informou, por meio de laudo técnico, sobre as condições estruturais do prédio, uma vez que o local não está adequado para a ocupação e pode oferecer risco. Após a remoção, o prédio será isolado, a fim de evitar futuras ocupações”, concluiu. (P.B)
Quase 4 mil imigrantes estão em abrigos no estado
De acordo com o balanço fornecido pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), atualmente 3.910 imigrantes venezuelanos estão vivendo em nove abrigos em Roraima, sendo 1.145 indígenas e 2.765 não indígenas.
Destes, oito estão localizados em Boa Vista e um em Pacaraima, chamado de Janokoida, que está com 510 pessoas e é exclusivo para indígenas. Na Capital, o abrigo do Pintolândia também acolhe apenas indígenas (635 pessoas).
Em Boa Vista, dois abrigos são considerados temporários: o Latife Salomão, que está com 390 imigrantes, e o de Santa Tereza, que conta com 486. Os outros abrigos da capital são: Senador Hélio Campos, com 278 imigrantes; Jardim Floresta, com 620; São Vicente, com 293; Tancredo Neves, com 313; e Nova Canaã, com 385. (P.B)