A partir de 15 de fevereiro, usuários das áreas de estacionamento no Centro da cidade terão que pagar pelo serviço da Zona Azul, que está sendo implantada pela Prefeitura de Boa Vista. A medida está dividindo opiniões de quem trabalha no comércio, além de muitas dúvidas rondarem a cabeça de quem frequenta aquela área da capital.
De acordo com as placas que já estão instaladas no perímetro das principais vias do Centro, as zonas estão divididas em azul, amarela e verde. A zona azul é para estacionamentos mais próximos do núcleo do comércio, como a Avenida Jaime Brasil. A amarela será destinada apenas para motocicletas, também em locais de maior concentração comercial. Já a verde fica em ruas e avenidas nas imediações das ruas e avenidas que recebem maior número de clientes.
Para a zona azul, a permanência sem cobrança é de duas horas, mas o proprietário do veículo deverá pagar, a partir da terceira hora, R$ 2 pelo excedente. Os motociclistas que estacionarem na zona amarela têm somente uma hora e após o horário excedente deverão pagar R$ 1. Já o motorista que estacionou na zona verde, também vai pagar R$ 2 após a ativação do tempo máximo de permanência no estacionamento, que é de seis horas.
A prefeitura distribuiu panfletos para quem transita pelo Centro e para os comerciantes, em que destaca que os usuários do estacionamento podem baixar o aplicativo “Zona Azul Digital”, cadastrar número de telefone, inserir os dados da placa do veículo, obter créditos por meio de cartão e estacionar, ativando o tempo-limite.
A reportagem conversou com algumas pessoas sobre a taxa que será cobrada e há muitas dúvidas sobre o serviço.
“Eu não sei quem vai cobrar, quem vai fiscalizar, se meu carro vai ser guinchado se eu não conseguir pagar o estacionamento, se vou ter que pagar multa. Nada disso ficou claro. Só vai estacionar quem tiver o aplicativo? E quem vai se responsabilizar se meu carro for furtado ou danificado? A prefeitura está entregando o panfleto, mas não é explicativo”, disse o eletricista Francisco Inácio Monteiro.
José Tabosa, comerciante que trabalha no Caxambu, acredita que o fato de o cliente saber que terá estacionamento disponível vai aproximá-lo do comércio.
“Tem gente que não vem para o Centro porque não tem onde estacionar. Isso vai ajudar bastante os comerciantes porque, sabendo que tem vaga, as pessoas vão se sentir atraídas. Eu gostei do que a prefeitura fez, vai organizar o estacionamento. Tem funcionário de loja e lojista que deixam seus veículos o dia inteiro estacionados, ocupando uma vaga que poderia ser do cliente. Assim é complicado”, declarou.
Ao saber que teria que pagar pelas horas excedentes, o autônomo Cláudio Machado Pessoa afirmou que vai deixar seu carro em local mais afastado ou vai negociar com os donos de estacionamentos privativos para pagar mensalmente.
“Quem não quer pagar, pode fazer isso. Talvez seja muito mais barato. Eu só quero que as coisas melhorem para todo mundo”, reforçou.
Por outro lado, o funcionário público Marcelo Pontes disse que vê a cobrança da taxa como abusiva, considerando que a rua é um espaço de uso coletivo comum.
“Se é de uso coletivo, não pode existir nenhuma cobrança pelo uso. Se a prefeitura for reverter todo o valor arrecadado em melhorias do próprio estacionamento, seria interessante, mas cobrar por cobrar, entendo que foge da legalidade. Mas para isso tinha que existir um projeto que estimasse um valor para a arrecadação que não fosse superior ao que precisa ser usado para manutenção do estacionamento. Se sobrasse dinheiro para os cofres do município, caracterizaria outra coisa. Aparentemente, tudo é bonito, mas tem coisa errada nessa história”, retrucou.
Advogado afirma que há respaldo legal para zona azul
Para sanar algumas dúvidas sobre a legalidade da implantação da zona azul, a Folha conversou com o advogado especialista em Direito Civil e Processual Civil Ronnie Brito. Segundo ele, há previsão de normativa para regulamentação da cobrança de taxa do estacionamento.
“Visa dar rotatividade ao comércio, podendo fomentar o fluxo na área central da cidade, haja vista a dificuldade em ter estacionamento. Quanto à legalidade, há possibilidade, desde que a prefeitura normatize e discipline, legalmente, como se dará o funcionamento da zona”, informou.
Em relação aos furtos, danos ou avarias nos veículos estacionados, o advogado destacou que há divergência nos tribunais, mas acaba prevalecendo que o agente público, no caso, a prefeitura, é responsável por qualquer tipo de dano ou sinistro.
Apesar de ruas e praças serem bens comuns de uso coletivo e ser restrito qualquer atividade pecuniária, Brito destacou que só seria possível se a intenção da prefeitura for compensar o valor ganho em melhorias no trânsito e nos serviços urbanísticos.
“A prefeitura pode se utilizar do interesse público. Foi o que aconteceu na região da orla, na zona baixa. Ela fez a apropriação com base em interesse público. Apesar de ser algo regulamentado pelo Poder Público, às vezes, o ente público pode fazer uma cobrança visando o interesse público”, explicou.
Em relação às multas e sobre veículos que excederam a hora e o motorista não efetuou o pagamento serem guinchados, o advogado explicou que é necessário observar o que discorre a legislação específica da zona azul.
“O que eu sei, da legislação anterior, é que o usuário tinha que realizar o pagamento antecipado e tinha um agente da prefeitura para fazer a fiscalização para ver se a pessoa pagou pela zona azul. Não sei como está regulamentada hoje essa zona azul, principalmente quanto ao ato fiscalizatório da prefeitura no que se refere ao pagamento da taxa. Anteriormente, o condutor poderia ser multado e o veículo, guinchado”, declarou.
Sobre reclamações futuras de usuários do estacionamento, em órgãos como Defensoria Pública e em escritórios de advocacia, Ronnie Brito salientou que falta à população buscar informações sobre a legalidade, a forma que está sendo fiscalizado e como está proposta a lei. “Querendo ou não, os comerciantes e proprietários de lojas pediam muito a zona azul porque visavam ao número maior de consumidores”, frisou.
Como ainda não fez uma análise de constitucionalidade da norma que regulamentou a zona azul, Brito esclareceu que não poderia confirmar se uma ação civil pública poderia derrubar o novo projeto do município.
“Caso houvesse algum vício na norma criada pela prefeitura, a ação civil pública seria uma das formas de questionar a legalidade da zona azul.”
DEFENSORIA – A reportagem entrou em contato com a Defensoria Pública do Estado (DPE) para saber se houve reclamações antecipadas a respeito da zona azul, mas fomos informados pela assessoria de comunicação que uma série de questionamentos foi enviada para a prefeitura e que, a partir das respostas, a DPE iria se manifestar.
PREFEITURA – A Folha também procurou a prefeitura para que as principais dúvidas, apresentadas pelos entrevistados, fossem esclarecidas, mas não houve qualquer resposta. (J.B)