Um grupo de indígenas Yanomami está acampado há duas semanas à margem da BR-174, no bairro 13 de Setembro, zona Sul. O local é conhecido como “buraco da cobra” e fica nas imediações do “Pau da Paciência”, um terminal de ônibus e táxis intermunicipais do outro lado da rodovia, no bairro Pricumã, zona Oeste. Eles sobrevivem do que catam em lixeiras e feiras livres.
A equipe de reportagem da Folha foi ontem pela manhã ao acampamento, que mais parece uma lixeira. Há até carcaças de animais no local. São seis famílias com 14 crianças, todas menores de oito anos, vivendo em condições insalubres. Os indígenas amarraram lonas nas árvores e ataram redes. O fogareiro é improvisado e eles comem sentados no chão. Os índios fazem suas necessidades lá mesmo. O forte odor causa náuseas.
O líder do grupo, Yxupi Yanomami, de 47 anos, disse que eles andaram dez dias até chegar a Boa Vista. Eles vieram da comunidade do Xenxen, no município de Caracaraí, a 155 quilômetros da Capital pela BR-174, região Centro Sul de Roraima. “Lá não tem nada, não tem saúde, não tem médico, não tem remédio”, reclamou o Yanomami.
No grupo, anteontem, dia 28, uma indígena deu à luz à margem da rodovia. Quem passava ajudou no parto. A índia foi levada ao Hospital Materno-Infantil Nossa Senhora de Nazareth, no bairro São Francisco, zona Leste, e permanece internada. Ela e filho passam bem, segundo informações da Secretaria de Estado de Saúde (Sesau).
Yxupi Yanomami disse à Folha que já foi à Fundação Nacional do Índio (Funai) e pediu ajuda, mas, segundo ele, até ontem ninguém havia aparecido por lá. O indígena relatou que o grupo já estava passando fome e que não sabia mais o que fazer. “Precisamos de comida e queremos voltar”, disse.
O grupo, ainda segundo o líder, deixou a comunidade do Xenxen porque não havia mais condições de se viver lá. “Não tem nada, nem comida e nem remédio. Aí, a gente veio para cá atrás de médico porque duas índias estavam gestantes. Uma deu à luz e a outra já vai dar”, ressaltou.
A esposa de Yxupi, Aka Yanomami, disse que muitas onças estavam rondando a comunidade do Xenxen e que, inclusive, os indígenas já haviam matado algumas. “Mas elas podem começar a nos comer, comer nossas crianças”, alertou a índia, temerosa.
Yxupi Yanomami estava preocupado. Ele disse que três mulheres do grupo haviam saído atrás de comida há dois dias, e que até ontem não haviam voltado. Elas se chamam Mara, Ryan e Uapoita Yanomami. “Se encontrar elas por aí, traz de volta”, pediu o líder do grupo à reportagem da Folha.
Ainda ontem pela manhã, a Folha percorreu algumas ruas do bairro Centenário, próximo ao acampamento, e encontrou as três mulheres embriagadas. Uma delas carregava uma garrafa de cachaça. As crianças acompanhavam as mães. A Folha registrou a cena. (AJ)
Funai aguarda pagamento de benefícios
O coordenador da Frente de Proteção Yanomami da Fundação Nacional do Índio (Funai), Anderson Vasconcelos, informou que já enviou uma equipe ao local, assim que recebeu a denúncia. “Mandamos a equipe para verificar as condições e ajudamos no atendimento à indígena grávida”, afirmou.
Segundo o coordenador, o grupo de indígenas veio do município de Caracaraí, na região Centro-Sul, para receber dinheiro de alguns benefícios que possuem. “Eles estão acampados ali, esperando receber o benefício, que deveria ter saído no dia 26 de janeiro. Estamos com nossa equipe aguardando para levá-los de volta à comunidade de origem deles”, frisou.
O coordenador disse ainda que os indígenas daquela região sofrem sérios problemas de alcoolismo por conta do recente contato com a população. “São índios que na abertura da Perimetral Norte foram impactados com o contato e têm dificuldade com alcoolismo e saúde mental”, observou.