Cotidiano

Índios mantêm 22 funcionários que atuam na Saúde Indígena reféns

Manifestação pede a saída da diretora do DSEI Yanomami, Maria de Jesus, e do gestor da Secretaria Especial de Saúde Indígena, Antônio Alves

Indígenas Yanomami da região de Surucucu, no Município de Alto Alegre, região centro-oeste de Roraima, estão mantendo reféns 22 funcionários que atuam na saúde indígena da região. A ação teve início na sexta-feira, 1º, quando quatro aeronaves aterrissaram no local para entregar mantimentos e levar assistência médica. A princípio, foram detidos 35 funcionários, mas 13 foram liberados e retornaram a Boa Vista na tarde de sábado, 3, em uma aeronave das Forças Armadas.
De acordo com informações colhidas pela Folha, o ato é um protesto dos indígenas que reivindicam a saída da gestora do Distrito Especial de Saúde Indígena Yanomami (DSEI-Y), Maria de Jesus, e do gestor da Secretaria Especial de Saúde Indígena, Antônio Alves. Para isso, o grupo apreendeu as aeronaves, que são usadas no deslocamento dos servidores e pacientes da região, no momento do pouso e informou que eles só seriam liberados quando as reivindicações fossem atendidas.
Por este motivo, durante as primeiras 24 horas, com os servidores apreendidos, os indígenas realizaram um protesto na pista de pouso segurando cartazes com os dizeres que pediam a exoneração da diretora e o retorno da saúde à comunidade. “Nós, Yanomami, exigimos ‘fora Maria de Jesus’. Queremos nossa saúde de volta”, dizia o cartaz.
Conforme os Yanomami, existe, por parte da diretoria, descaso e negligência em relação aos serviços de saúde prestados. Somente no ano passado, 117 indígenas morreram devido às condições de serviço da DSEI-Y e, neste ano, dez indígenas morreram, sendo dois adultos após serem picados por cobra e oito crianças, devido a diarreias e desidratação. Além disso, eles relataram falta de transporte, materiais insuficientes, más condições das instalações dos prédios e número insuficiente de funcionários.
EXÉRCITO – Em nota, a assessoria de comunicação da 1ª Brigada de Infantaria de Selva informou que a Brigada, por meio do 4º Pelotão Especial de Fronteira localizado naquela região, iniciou uma intermediação junto aos indígenas para que a manifestação seja pacífica e para que não haja conflito. Os não-indígenas que foram impedidos de sair foram abrigados no 4º Pelotão, onde receberam alimentação e água.
PF – A equipe de reportagem tentou entrar em contato, durante o final de semana, com a Polícia Federal, que recebeu o registro do caso. A intenção era obter mais informações sobre a situação do local e quais as medidas que serão tomadas pelo órgão. Mas, em nenhuma das ligações realizadas, obteve resposta.
OUTRO LADO – À Folha, a gestora do DSEI-Y, Maria de Jesus, disse que só irá se pronunciar sobre o caso “após o final das investigações do ocorrido”. “Não quero falar nada que possa prejudicar as investigações”, afirmou. Maria de Jesus pediu apoio do Ministério Público Federal (MPF) para que seja adotada alguma medida de reintegração de posse das aeronaves.
Mãe de enfermeiro feito refém relata situação no local
A mãe de um enfermeiro que estava presente em uma das aeronaves presas na sexta-feira, 1º, por indígenas Yanomami da região de Surucucu, que pediu para não ter identidade revelada, procurou a Folha para relatar a situação que os funcionários enfrentam no local.
Conforme ela, os indígenas retiram as aeronaves e recolheram os mantimentos e medicamentos levados até a região. A mãe do enfermeiro relatou que os funcionários se sentiram assustados durante a ação, mas que não sofreram nenhum tipo de agressão por parte dos Yanomami. “Meu filho nos disse que eles estão lá por que foi a forma encontrada para chamar a atenção das autoridades e conseguirem alguma solução para o problema deles. Porém, todos eles sabem que os indígenas têm armas de fogo escondidas no mato”, afirmou.
Segundo a denunciante, o único alimento que os funcionários têm para comer é arroz. “Os líderes do movimento são o indígena conhecido como Alberto, ex-enfermeiro da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai); e outros dois outros indígenas, que estão em Boa Vista, passando as instruções pelo rádio”, relatou.
A mãe fez um apelo à sociedade e aos responsáveis pela manifestação. “Meu filho foi um dos que foram liberados no sábado à tarde, mas eu entendo a situação de todos os que estão no local. Eles [indígenas] são gente como a gente, merecem o melhor tratamento possível. Se eles estão reclamando há tanto tempo é porque realmente existe alguma coisa errada. Pedimos para que as autoridades olhem para eles e ajudem a resolver essa situação. Não só porque muitos ainda estão como reféns lá, mas porque é direito de todos ter uma saúde boa e de qualidade”, afirmou. (J.L)