O juiz federal Maurício Mendonça extinguiu, nessa terça-feira (24), os dois processos que pediam o fim do controle da passagem de veículos e pedestres no período noturno, feito por meio de uma corrente instalada na rodovia federal BR-174, na divisa entre os Estados de Roraima e Amazonas. A restrição fica dentro da Terra Indígena Waimiri-Atroari.
“As restrições impostas significam não só um mecanismo de defesa da população indígena afetada, mas um meio de afirmar e preservar a sua própria identidade”, destacou, na sentença, o magistrado, contextualizando, por exemplo, que entre 1946 e 1985, 2.650 waimiri-atroari morreram durante a construção da BR-174, o que ensejou, inclusive, uma ação do Ministério Público Federal (MPF) que pede indenização de R$ 50 milhões e um pedido de desculpas do País ao povo kinja.
Para Maurício Mendonça, a cancela “é muito mais do que um obstáculo ao tráfego de veículos e pessoas”, é o “símbolo de resistência, coragem e conquista” do povo Waimiri-Atroari e importante para a preservação do meio ambiente.
Na sentença, o juiz também lembrou do episódio noticiado nacionalmente em 28 de fevereiro de 2020, no qual o então deputado estadual Jeferson Alves destruiu, com um motosserra, a corrente do local, ao alegar que as correntes isolavam Roraima. Para Mendonça, “não há qualquer fato concreto que comprove que a aludida restrição de tráfego estaria impedindo o desenvolvimento do Estado”.
Uma das ações tramitava há 20 anos
Uma das ações foi apresentada em 2004 pelo então senador pelo Estado, Augusto Botelho, contra a União e a Funai. A outra foi protocolada em 2008 pelo Governo de Roraima, então gerido por Anchieta Júnior, e mencionava, além das instituições federais, o Estado do Amazonas. Com exceção do ex-senador, o juiz condenou, nessa terça, os autores dos processos ao pagamento de R$ 10 mil e honorários periciais. Ainda cabe recurso aos autores em até 30 dias.
Nos autos, o povo Waimiri-Atroari, que governa o território indígena por onde passa a rodovia, alega, por exemplo, que não há bloqueio na via, mas apenas uma restrição seletiva entre 18h30 e 5h30 do dia seguinte para evitar acidentes envolvendo indígenas, não-indígenas e animais. Explicou, ainda, que a passagem de veículos com carga perecível, ônibus de transporte interestaduais e veículos com emergência, é permitida.
União e Funai sustentaram a legalidade da corrente e a compatibilidade dos direitos constitucionais dos indígenas. Por sua vez, o Amazonas se defendeu ao dizer que o temor dos Waimiri-Atroari é
plenamente justificável e que a liberação da via, de forma indiscriminada, poderia lhes causar intranquilidade. O Ministério Público Federal (MPF) alegou desinteresse nas ações e pediu a improcedência delas.
Em setembro de 2023, todos os citados participaram de uma audiência de conciliação que terminou sem acordo e as ações seguiram para decisão do magistrado.