Após receber denúncias referentes à Casa de Acolhimento Infantil (antigo Abrigo Infantil Viva Criança, localizado na Rua Monte Roraima, bairro São Vicente), o juiz de direito Marcelo Lima de Oliveira, titular da 2ª Vara da Infância e da Juventude, fez uma inspeção judicial a essa unidade no último dia 17. A ida ao local, que teve como finalidade verificar a situação do ambiente onde vivem crianças de até 12 anos, resultou na instauração de um procedimento contra as secretarias estaduais do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) e de Saúde (Sesau).
Segundo ele, na visita se identificou algumas irregularidades graves que ainda precisam ser verificadas. “Denúncias dão conta de que faltam profissionais qualificados, especialmente enfermeiros, auxiliares de enfermagem e médicos para dar suporte às crianças acolhidas, o que inclusive causou internação hospitalar de um adolescente; de profissionais de serviços gerais para manter a limpeza da unidade de acolhimento; e sobre a existência de funcionários em cargos em comissão e funções de confiança, vinculados à casa de acolhimento infantil que, embora providos, não exercem o serviço na unidade”, afirmou Oliveira.
“Por conta dessas possíveis irregularidades, instaurei um procedimento de ofício para saber se a Setrabes está cumprindo com seu dever na casa de acolhimento e verificar da Sesau quais os motivos de não encaminhar os profissionais para o abrigo. Esse procedimento consiste em medida de proteção e apuração de irregularidade na entidade de atendimento, com a finalidade de aplicar medidas protetivas necessárias às crianças e adolescentes acolhidos. Vamos averiguar se essas duas secretarias estão descumprindo a obrigação legal de proverem adequadamente a estrutura funcional do abrigo infantil”, afirmou o juiz.
Oliveira esclareceu que as irregularidades sendo comprovadas, serão adotadas situações emergências. “Se for constatado, de fato, que há servidores nomeados que não trabalham, vamos comunicar ao Ministério Público de Roraima para que adote representação por improbidade administrativa. Se averiguarmos que a Sesau não está cumprindo com seu dever de fornecer saúde a essas crianças, então, como é uma questão de emergência, é expedir uma ordem judicial para que disponibilize os profissionais que são necessários”, garantiu o juiz da Infância e da Juventude. (E.R.)
Setrabes diz que desconhece irregularidades
Secretaria informou que o atendimento está dentro das normas do acolhimento institucional de crianças (Foto: Nilzete Franco / Folha BV)
A Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) esclareceu, por meio de nota, que não tem conhecimento de servidores que estariam nomeados sem trabalhar no abrigo infantil ou em qualquer outro abrigo do Estado. E que a Secretaria tem todo interesse nesse tipo de investigação, o que é feito permanentemente.
Esclareceu que o Poder Judiciário, bem como os demais órgãos do Sistema de Justiça, são essenciais à qualidade dos serviços de acolhimento, fazendo valer de fato o que preconizam os artigos 4 do ECA e 227 da Constituição.
“Esse procedimento é um dever institucional do Poder Judiciário e a Setrabes vai responder a qualquer questionamento formulado pelo órgão”, afirmou na nota.
Informou ainda que o abrigo infantil tem atualmente 18 crianças. O atendimento está em conformidade com as normas do acolhimento institucional de crianças, do Ministério da Cidadania.
SESAU – A Secretaria de Saúde esclareceu que tem servidores na Casa de Acolhimento Infantil e que a equipe de profissionais é composta por auxiliar de enfermagem, enfermeiro, fisioterapeuta, assistente social, médico pediatra, fonoaudiólogo, farmacêutico e psicólogo.
Disse que esses profissionais são enviados para a Setrabes e lá a secretaria faz a distribuição de acordo a necessidade. Disse ainda que a administração da Casa de Acolhimento é de responsabilidade da Setrabes.
Juiz contesta Setrabes e diz que quantitativo de crianças em abrigos deve ser informado à sociedade
“Não existe lei alguma que proíba a divulgação do quantitativo de crianças existentes nos abrigos administrados pelo Estado. Não que eu tenha conhecimento. Os abrigos são entidades públicas, então repassar números de quantas crianças estão abrigadas, quantas são do sexo masculino e feminino, quantas venezuelanas e brasileiras, não tem problema algum, porque são informações que não afetam nenhum direito da criança. Pelo contrário, fazendo a divulgação torna a sociedade informada do problema social grave que existe em nosso Estado”, explicou o juiz de direito Marcelo Lima de Oliveira, titular da 2ª Vara da Infância e da Juventude.
Esse esclarecimento do juiz contesta a resposta dada pela Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) à reportagem da Folha, publicada na matéria ‘Funcionário denuncia condições de abrigo de menores’, divulgada na edição dessa terça-feira (23). Por meio de nota, a Setrabes disse que não poderia informar o número de abrigados nas unidades mantidas pela secretaria, ‘pois essa seria uma informação restrita, conforme orientação judicial’.
O juiz Marcelo Oliveira explicou ainda que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é claro quando diz que é proibido fazer imagens, divulgar nomes ou as iniciais dos nomes de adolescentes que cometem atos infracionais. “O mesmo é válido para as crianças que não têm um lar e são acolhidas em abrigos, porque também afeta a dignidade delas, e quem der publicidade sofrerá um processo por danos morais. Mas quanto à questão de números, tem que ser passado, pois essa informação é pública”, esclareceu.
O juiz titular da 2ª Vara da Infância e da Juventude disse que existem vários procedimentos abertos para verificar diversas situações que descumprem os direitos de crianças e de adolescentes. “Fazemos o acompanhamento das entidades de atendimentos que são públicas ou privadas, que recebem crianças que não têm um lar ou adolescentes que cometeram atos infracionais graves. Em Roraima temos cinco entidades: o Centro Sócio Educativo [uma unidade no bairro Calungá e outra no Bom Intento]; abrigo infantil, abrigo para adolescentes masculinos e abrigo para adolescentes femininas do Estado, além do municipal, mas todos são vinculados à Vara da Infância”, ressaltou Oliveira.
Ele explicou que não teria os números de crianças nos abrigos porque houve uma divisão administrativa na Vara da Infância e da Juventude e a fiscalização desses locais está sob a responsabilidade do juiz Parima Veras. “Eu estou responsável pela fiscalização das duas unidades do Centro Sócio Educativo”, esclareceu o juiz.